Carlos Agostinho Couto
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Todo período eleitoral
é rico por nos proporcionar – além do ufanista discurso de defesa da democracia
nacional – a oportunidade de observarmos comportamentos. Dos candidatos, dos
eleitores, da mídia, dos analistas, até dos “experts em marketing eleitoral”,
surgidos às dezenas nesse período, podemos extrair coisas pela observação.
Chama a
atenção nas eleições para prefeito e vereadores de São Luís em 2012 a subversão
de certos comportamentos éticos e estéticos em relação a eleições anteriores,
principalmente em relação às primeiras experiências eleitorais pós-1988.
As campanhas
de há alguns anos traziam fortemente marcados comportamentos diferentes dos
atuais. Do lado ético: quem era de partidos emergentes, com vínculo com os
movimentos sociais e vistos como mais à esquerda se orgulhava por defender
causas como as dos trabalhadores, dos desassistidos, dos sem-terra, das
minorias (muitas vezes majoritárias) como as mulheres, negros, homossexuais
etc. Para isso, utilizavam-se discursos inflamados e tinham-se como referência
de campanha as reuniões de base, o apoio de sindicalistas combativos, as
organizações autônomas da sociedade.
Alinhar-se ao
discurso dos poderosos então, nem pensar. Fazia-se exatamente o contrário. Tudo
isso redundando em caminhadas, passeatas, comícios e, entre outras coisas,
atividades para arrecadação de fundos de campanha como festas, almoços, livro
de contribuição, rifas, sorteios e a tradicional caixinha entre amigos e
simpatizantes.
Preponderava
no discurso os posicionamentos contra a ditadura, seus efeitos e herdeiros,
quase de maneira redundante. Neste ano vê-se que alguns daqueles partidos já
não se utilizam desses expedientes. Campanhas ricas, assessorias caríssimas,
discurso de moderado a conservador, fugindo de temas hoje considerados espinhosos,
como a defesa do trabalho e o combate ao conservadorismo político, e muito,
muito dinheiro que não sabemos bem de onde vem para aparecer bonito na TV,
elegante, com ar de burguês e para ostentar poder.
Ter sido
aliado da ditadura em tempos outros não parece ser tão ruim assim hoje em dia
para esses partidos. Não parece uma subversão ética? No mínimo, submissão.
Do ponto de
vista estético, as mudanças são agressivas.
Via-se naqueles partidos chamados então de progressistas campanhas quase
amadoras, mas marcadas pela participação de pessoas fiéis a causas e ideias.
Fusquinhas, brasílias, bicicletas, carros-de-som que quebravam no caminho,
faixas pintadas à mão, panfletos (o que hoje chamamos de “flyers”)
mimeografados ou feitos em gráficas com menor recurso técnico e com menor preço.
Juntavam-se a isso muitos sonhos, muita animação e militância. Nos retornos e
esquinas candidatos, amigos, partidários e simpatizantes se desdobravam para
conquistar o voto, geralmente denunciando as mazelas da política tradicional.
Mais um dado:
quem recebia uma bandeira para agitar nas concentrações tinha que devolver ou
comprometer-se a trazê-la na próxima manifestação.
Os candidatos
que tinham carro próprio geralmente os viam reduzidos a peças de pouco valor no
final da campanha, de tão desgastados. Sim, pois os carros dos candidatos também
participavam da campanha. Os programas de TV e rádio eram feitos geralmente por
algum militante ou simpatizante que trabalhava na área e carecia de recursos
técnicos.
Hoje assistimos
a um desfile de profissionalismo nas campanhas. Vídeos caríssimos e bem
produzidos, com pessoas famosas contratadas a peso de ouro. Centenas de
carros-de-som novos e com estrutura nunca antes imaginada para um partido tido
como popular.
Farto e
sofisticado material de campanha, inclusive com a projeção gráfica dos sonhos,
às vezes mirabolantes e planejados apenas para causar impacto, supostos pela
sociedade ou inventados por “marqueteiros”. A militância virou “militância”,
entre aspas, pois foi substituída por pessoas pagas para distribuir papéis e
agitar bandeiras. Percebe-se ali a cara da necessidade e não de uma opção
política.
Contratam-se desempregados
como apoiadores para lotar os retornos com as cores dos partidos e candidatos e
ganham-se uns votos a mais, por razões óbvias. Ah, o material de campanha nunca
será insuficiente, sempre tem mais.
Para ser
candidato por um partido com perfil combativo era necessário ser militante.
Líderes comunitários, sindicalistas vistos como honestos, pessoas ligadas às
lutas sociais compunham o grupo autorizado a se candidatar. Todos eram
conhecidos pela coerência e participação.
Os candidatos
de hoje não se sabe bem quem são, claro que com exceções, bravas exceções.
Basta um chefão mandar os partidos aceitarem uma filiação e o antes inadmissível
acontece. Alguém se candidata pelo desejo pessoal ou do seu grupo, não mais
pela coerência política.
Os veículos
envolvidos nas campanhas são também sintomáticos da mudança. Além da farta
disponibilidade de carros contratados (som, apoio etc...) percebe-se uma enorme
quantidade de carrões importados, e sempre com o ar-condicionado ligado,
enfeitados com a campanha de candidatos que antes diziam defender, por exemplo,
os trabalhadores.
Chega a ser
contraditório um candidato ter à sua disposição uma frota de veículos dos mais
caros vendidos no país e dizer-se representante verdadeiramente popular. Que se
saiba, os trabalhadores não ficaram tão ricos assim e os poderosos não viraram
socialistas de uma hora para a outra.
Não se trata
de nostalgia ou romantismo, as coisas mudaram, a tecnologia ficou mais barata e
próxima de todos. O país cresceu e alguns tiveram melhorada a sua qualidade de
vida do ponto de vista material. Isso tudo teria que, de maneira quase
obrigatória, refletir-se nas campanhas eleitorais. Mas as posturas ética e
estética mudaram a olhos vistos.
Uma observação
da campanha.
* Carlos Agostinho Couto é Doutor em
Políticas Públicas e professor do Dep. de Comunicação Social da UFMA
Um comentário:
Bem legal teu blog.. Explica as coisas com claridade. Aproveito e deixo este link desta revista que tb fala bastante coisa sobre o assunto: http://www.facebook.com/MODAeLOOK
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