quinta-feira, 14 de março de 2013

ALUIZIO AZEVEDO E A SÃO LUÍS FAST FOOD

Já se passaram 132 anos da publicação do livro “O Mulato” (1881), de Aluízio Azevedo , obra-referência do Naturalismo na Literatura.

A cena inicial é marcante. Descreve a banca de uma vendedora de vísceras na praça da Alegria, no centro de São Luís.

Assim contava Aluízio Azevedo:

“A Praça da Alegria apresentava um ar fúnebre. De um casebre miserável, de porta e janela, ouviam-se gemer os armadores enferrujados de uma rede e uma voz tísica e aflautada, de mulher, cantar em falsete a gentil Carolina era bela; do outro lado da praça, uma preta velha, vergada por imenso tabuleiro de madeira, sujo, seboso, cheio de sangue e coberto por uma nuvem de moscas, apregoava em tom muito arrastado e melancólico: fígado, rins e coração! Era uma vendedeira de fatos de boi."

E prossegue:

“As crianças nuas, com as perninhas tortas pelo costume de cavalgar as ilhargas maternas, as cabeças avermelhadas pelo sol... corriam e guinchavam, empinando papagaios de papel.”

“O Mulato” é uma preciosidade literária do fim do século XIX, na qual Aluízio Azevedo desnuda o preconceito racial e os abusos da Igreja na provinciana São Luís.
Praça da Alegria, tomada por camelôs, inspirou Aluízio Azevedo há 132 anos. Foto: Flora Dolores
Mais de cem anos depois, tem-se a impressão que São Luís piorou na conservação dos logradouros públicos.

Não só a praça da Alegria, mas quase todas as praças de São Luís estão tomadas por vendedores ambulantes, transformando os espaços em um amontoado de barracas improvisadas com suas características lonas vermelhas, pretas e azuis.
As calçadas e canteiros da praça da Alegria tomados por vendedores de comida
As lonas estendidas por todas as praças já se tornaram marca na cidade. Não há uma calçada livre das armações de ferro com os plásticos por cima.

Em quase todas elas vende-se, principalmente, comida! O improviso na hora do rush é à base de alimentação ligeira, churrasquinhos, hamburguers de todos os tipos, gordura trans, sódio, triglicerídios, colesterol, coca-cola, cachorro quente, maionese e ket chup.

Tal qual a vendedora de fatos da praça da Alegria, nossas praças foram transformadas em imensos acampamentos, verdadeiros mercados improvisados de comida.
Na ausência de banheiros públicos, o xixi é feito na calçada. Foto: Biaman Prado
Na praça Deodoro, a principal da cidade, os bustos do Pantehon Maranhense foram arrancados e as bases de concreto que sustentavam as estátuas dos escritores servem de suporte para as tendas das barracas de comida.

Nos logradouros de São Luís não só se prepara e vende comida. A população faz também as necessidades biológicas. Sem banheiros públicos, os transeuntes urinam e defecam em qualquer canto.

Basta ver de novo a foto de Biaman Prado, flagrando uma mulher urinando ao lado do caixa eletrônico na calçada do Banco do Brasil, na praça Deodoro.

A biblioteca Benedito Leite, no coração da cidade, tem dois banheiros improvisados nas laterais da escadaria, onde o odor de urina mistura-se ao cheiro de óleo saturado pela fritura de batatas e carnes de hamburguer.
Esquina da praça Deodoro. tomada por vendedores ambulantes, limita os espaços do pedrestre
A vendedora de fatos descrita na cena inicial de “O Mulato” multiplicou-se em centenas de bancas pela cidade inteira.

Nossos logradouros são a radicalização do Naturalismo de Aluízio Azevedo.

LEIA MAIS SOBRE A PRAÇA DEODORO AQUI

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