terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

34 ANOS: O PT NOS TEMPOS DO CÓLERA

No Maranhão, aliança com Sarney vai repercutir na eleição de Dilma em 2014.
Para fazer uma análise equilibrada sobre o PT, sem paixões lulistas nem o radicalismo à la Olavo de Carvalho, é preciso recuar às suas origens, analisar o processo de ascensão ao poder e observar o cenário contemporâneo.

AS ORIGENS

O PT surgiu de três matrizes: o movimento sindical, os setores progressistas da Igreja Católica e parte do corpo docente universitário, somado ao movimento estudantil.

Certo viés sindicalista, mais orgânico, foi incorporado ao governo e formou uma casta entranhada nas empresas estatais, nos fundos de pensão ou nas corporações privadas controladas pelo governo.

Outro segmento sindical ficou no controle da máquina partidária, os chamados operadores do PT, como Rochinha (assessor emérito de Lula) e Delúbio Soares.

A ala progressista católica foi fundamental para disseminar as células do partido nos movimentos associativos comunitários urbanos e rurais, sob a influência da Teologia da Libertação – uma leitura “marxista” da bíblia.

Da Universidade saíram as mobilizações que levaram o PT a conquistar uma parte da classe média, os artistas, intelectuais etc, cujo momento mais belo foi a campanha presidencial de 1989, com o famoso jingle “Lula lá”.

Em todo seu processo de formação, o PT fez um intenso trabalho de formação de quadros no Instituto Cajamar, disseminou suas publicações através da Fundação Perseu Abramo e atuou nas bases sociais para disputar o comando das organizações sindicais, estudantis e associativas de bairros.

MODO PETISTA DE GOVERNAR

E assim a legenda foi crescendo, elegeu os primeiros vereadores, deputados, prefeitos e governadores, sob a insígnia do chamado “modo petista de governar”, que pressupunha governo participativo, transparência nos gastos públicos e honestidade.

Ser PT era sinônimo de orgulho, encravado no peito com a estrela em botton, as bandeiras vermelhas nas ruas e sem medo de ser feliz.

O partido cumpriu todas as lições sobre disputa de hegemonia, conforme os ensinamentos de Antonio Gramsci, até vencer a eleição presidencial, em 2002.

A vitória de Lula significou a primeira inclinação do PT aos setores conservadores. Na época, Lula precisava sinalizar aos banqueiros e multinacionais, tranquilizar o mercado e acalmar a burguesia. A aliança foi com o PL (Partido Liberal).

À proporção que cedia nas questões programáticas e avançava no pragmatismo, a palavra socialismo ia paulatinamente desaparecendo dos volumosos livros com as resoluções dos encontros e congressos do PT.

O PT NO PODER

Quando chegou à presidência, Lula e o PT já estavam todos prosa e familiarizados com o pragmatismo do Palácio do Planalto.

A segunda vitória de Lula, em 2006, selou a longa aliança com o PMDB, o inquilino mais representativo do clientelismo característico do modo de operar o poder em Brasília.

Paralelamente às alianças pragmáticas, o governo petista implantava em ritmo acelerado as políticas sociais, especialmente o maior programa de distribuição de renda – o Bolsa Família, sobre o qual tratamos em outro texto.

Além disso, não há como negar que, nos governos Lula e Dilma, houve o ingresso dos despossuídos no mercado e uma explosão de consumo.

Os pobres tiveram mais oportunidades, passaram a comer carne, tomar leite, viajar, frequentar e comprar em shoppings, participando efetivamente do capitalismo.

Na esteira das oportunidades, o governo ampliou o ensino superior e tecnológico, espalhando campi de universidades e institutos federais nos grotões do país.

Filhos de lavradores, beneficiários do Bolsa Família na infância, terão oportunidade de estudar em escolas federais daqui a um tempo. Isso é mudança, em que pesem as críticas aos projetos de expansão do ensino superior e tecnológico.

No governo do PT, a pobreza melhorou de vida, mas os ricos também. E muito!

Com os movimentos sociais, a relação do PT é dúbia: uma parte foi cooptada e a outra enganada. Em que pese Lula/Dilma ter realizado infinitas conferências para ouvir as militâncias de tantas organizações, quase nada foi implantado.

Destaque especial, nesse caso, para a 1ª Conferência Nacional de Comunicação, que resultou em quase 600 propostas sem qualquer resultado prático.

A velha bandeira da democratização da mídia, tão agitada pelo PT quando era oposição, sucumbiu nos acordos e benesses para os barões da mídia.

Nunca antes na História do Brasil um governo deu tanto dinheiro às Organizações Globo quanto Lula. E para as rádios comunitárias, nada!

Os governos do PT ajudaram os pobres e empanturraram os ricos. As empreiteiras que o digam. Falando nelas, é assunto de copa.

TEMPOS DO CÓLERA

Quando Lula articulou o Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014, não imaginou que estaria atraindo uma agenda negativa para o governo da sua sucessora.

Dos três segmentos formadores do PT – sindical, ala progressista católica e Universidade – apenas a CUT segue fiel ao petismo.

Os católicos que fizeram o trabalho de formiguinha, quando o partido era pequeno, foram alijados. E os movimentos estudantil e docente da Universidade estão sob o controle do PSOL e do PSTU, na oposição ao PT.

Lula virou amigo de José Sarney, Eike Batista, Paulo Maluf e outras espécies apodrecidas da política, atraindo a ira dos setores críticos que davam sustentação ao PT nas bases dos movimentos sociais.

Depois dos protestos de junho 2013, houve uma tentativa do governo petista de se recompor com os movimentos sociais, mas agora parece tarde.

O movimento sindical da base governista está desconectado das ruas. A CUT é analógica. A massa é digital.

Nem mesmo os movimentos controlados pelos partidos radicais conseguem liderar os protestos. A massa não quer líderes à moda dos anos 1980... A organização é desorganizada, sem cúpula e os partidos tradicionais do campo da esquerda perderam o controle.

A ira do povo contra as obras da Copa e o padrão Fifa ampliaram-se para o combate à corrupção generalizada.

Os protestos são contra o governo de plantão, mas sobretudo contra o Estado carcomido, a política convencional e a ação do governo, no momento gerida pelo PT.

MENSALÃO

A casta sindical que se empoderou na estrutura do Estado para “operar” o partido resultou nas ações desastradas que evidenciaram no PT uma prática antiga e comum na República – a distribuição de dinheiro para comprar parlamentares.

O mensalão do PT ganhou um forte agendamento midiático pela combinação de vários fatores, principalmente porque ocorreu justamente no partido cujas marcas eram a ética, a democracia, a justiça, a transparência etc.

Ao longo de sua trajetória, o PT associou-se ao conceito de correção, combate à corrupção, igualdade, solidariedade etc.

Quando as marcas e os conceitos foram desfeitos, pelo critério da inversão, obviamente o petismo entrou para o agendamento midiático com muito mais força que uma legenda como o DEM, por exemplo, onde seria comum haver distorções.

Outros interesses da extrema direita conservadora também concorreram para transformar o PT no maior caso de corrupção do Brasil, como se a República fosse uma virgem nunca antes tocada pelos pornógrafos da política.

Enfim, o petismo consegue ser tão contraditório que, mergulhado no escândalo das prisões dos mensaleiros, mantém a presidente navegando tranquila na liderança das pesquisas para a reeleição.

Quanto mais o partido é achincalhado como uma organização criminosa, mais perto Dilma fica da reeleição.

Para o povo interessa o cartão de crédito e as facilidades para comprar, estabilidade econômica e oportunidades, pouco importando a questão ética.

O segredo é a economia. No resto, o eleitor compara o PT a qualquer outro partido, com a diferença que a sigla da estrela rouba mas faz, inspirado num suposto bordão informal atribuído a Paulo Maluf.

NOVO TESTE PARA DILMA

Porém, a presença de aliados inconvenientes no palanque de Dilma está sendo analisada pelos marqueteiros. Eles temem o impacto negativo de José Sarney, por exemplo, e de outras figuras estigmatizadas nos alvos dos protestos.

Nesse contexto, a aliança com o PMDB, estratégica no projeto de reeleição e na governabilidade, tornou-se um problema.

Dilma não sabe o que fazer com os aliados incômodos.

Liderando as pesquisas com folga, a presidente vai ter cautela e esperar a poeira dos protestos sentar. Ninguém sabe o que virá das ruas em março.

Em 2013, após a queda vertiginosa nas pesquisas, Dilma recuperou-se rápido em setembro.

No ano da Copa os protestos serão intensificados. Por isso o núcleo duro do PT tem receio de expor na campanha da reeleição figuras como Sarney.

Em 34 anos de vida, o PT fez muita coisa boa. E ruim também.


O partido será julgado nas ruas e nas urnas. Que a justiça seja feita!

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