O cinema
é a realidade desejada. O mundo vivido é a crueldade naturalizada.
Assistindo
ao documentário “Trabalho interno” você vai ver “O lobo de Wall Street” em 3D:
a tese, a antítese e a síntese do capitalismo contemporâneo.
O
primeiro, explica; o segundo, distrai. Aquele, aprofunda; este, exacerba os
paraísos artificiais da fórmula: dinheiro + poder = sexo + drogas.
Com a
lente de “Trabalho interno” pode-se compreender o que há de comum entre a
Islândia, a Grécia e a Argentina, sabendo porque a ilha nórdica da prosperidade,
o berço da Filosofia e a terra do tango afundaram com a crise econômica
internacional de 2007/2008, cujos desdobramentos estão assustando o mundo até hoje.
“Trabalho
interno”, dirigido por Charles Ferguson, também detalha como ocorreram as transações fraudulentas que fizeram
explodir a bolha imobiliária nos Estados Unidos.
Qualquer
semelhança com “O lobo de Wall Street” é mera coincidência.
Leonardo
DiCaprio encarna a figura do anti-herói num filme carregado de ufanismo sobre o
sonho de ficar rico na “América”.
O
protagonista Jordan Belfort é
um aspirante a milionário. Em ascensão meteórica, vira alto executivo de Wall
Street, mas a bolsa quebra e ele volta à vida normal.
Procurando
emprego, chega a uma corretora de fundo de quintal, onde não havia painéis
eletrônicos nem computadores, mas a chance de burlar transações financeiras era
grande.
Na
selvageria do capitalismo, Belfort enriquece vendendo ações fraudulentas para
trabalhadores assalariados dos EUA. Ele tem prazer nisso. É a crueldade naturalizada.
A cada
golpe, a sequência uísque, cocaína e fornicadas ia aumentando. Rapidamente ele
transforma a corretora chula em um negócio lucrativo e monta a própria empresa,
operando no mercado paralelo a Wall Street.
Famoso
pelas habilidades com vendas, vira celebridade fazendo negócio sujo, sob a
vigilância silenciosa de um investigador do FBI.
O diretor
Martin Scorsese mostrou sangue em “Gangs de Nova York”, genialidade em “O
aviador” e um delicioso passeio pelo submundo mafioso em “Os bons companheiros”.
Com “O
lobo de Wall Street”, transformou DiCaprio no cão chupando manga, expressão
dúbia para caracterizar alguém bom e/ou ruim: o cachorro doido da meca
financeira ou a besta-fera da malandragem sofisticada.
O galã é
sádico, ninfomaníaco e apocalíptico. Como um pastor da Igreja Universal do
Reino de Deus, vende a promessa de salvação com o primeiro milhão.
Para
cada operação fraudulenta bem sucedida, a quadrilha de Belfort fazia uma orgia
regada a cocaína, pílulas da felicidade e prostitutas, elevando à máxima
potência a regra do sexo sem limites: onde tem mucosa, se goza.
Na selva
financeira de Wall Street, o lobo é o rei. Corrupção, lavagem de dinheiro,
glamour, poder e decadência oscilam no filme.
Por fim,
o anti-herói encara a desgraça, quando o FBI sai no encalço da quadrilha e
coloca Belfort na cadeia. Eis a realidade desejada. Com direito a pena leve pela delação premiada dos seus parceiros no crime, fazendo jus ao
que ele próprio dizia: “ninguém tem amigos em Wall Street”.
Se você
saiu do cinema e não gostou do filme, refugie-se na poesia. Uma boa tradução de
Wall Street é do poeta Sousândrade:
“- Tendo nós cofres públicos,
Livre-se a escravidão!
Comam ratos aos gatos!
Pilatus
Disse, lavando a mão.”
Qualquer
semelhança entre Nova Iorque, o Brasil e o Maranhão é mera coincidência.
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