sábado, 22 de março de 2014

AU AU NO CINEMA: O CÃO CHUPANDO MANGA EM “O LOBO DE WALL STREET”

O cinema é a realidade desejada. O mundo vivido é a crueldade naturalizada.

Assistindo ao documentário “Trabalho interno” você vai ver “O lobo de Wall Street” em 3D: a tese, a antítese e a síntese do capitalismo contemporâneo.

O primeiro, explica; o segundo, distrai. Aquele, aprofunda; este, exacerba os paraísos artificiais da fórmula: dinheiro + poder = sexo + drogas.

Com a lente de “Trabalho interno” pode-se compreender o que há de comum entre a Islândia, a Grécia e a Argentina, sabendo porque a ilha nórdica da prosperidade, o berço da Filosofia e a terra do tango afundaram com a crise econômica internacional de 2007/2008, cujos desdobramentos estão assustando o mundo até hoje.

“Trabalho interno”, dirigido por Charles Ferguson, também detalha como ocorreram as transações fraudulentas que fizeram explodir a bolha imobiliária nos Estados Unidos.

Qualquer semelhança com “O lobo de Wall Street” é mera coincidência.

Leonardo DiCaprio encarna a figura do anti-herói num filme carregado de ufanismo sobre o sonho de ficar rico na “América”.

O protagonista Jordan Belfort é um aspirante a milionário. Em ascensão meteórica, vira alto executivo de Wall Street, mas a bolsa quebra e ele volta à vida normal.

Procurando emprego, chega a uma corretora de fundo de quintal, onde não havia painéis eletrônicos nem computadores, mas a chance de burlar transações financeiras era grande.

Na selvageria do capitalismo, Belfort enriquece vendendo ações fraudulentas para trabalhadores assalariados dos EUA. Ele tem prazer nisso. É a crueldade naturalizada.

A cada golpe, a sequência uísque, cocaína e fornicadas ia aumentando. Rapidamente ele transforma a corretora chula em um negócio lucrativo e monta a própria empresa, operando no mercado paralelo a Wall Street.

Famoso pelas habilidades com vendas, vira celebridade fazendo negócio sujo, sob a vigilância silenciosa de um investigador do FBI.

O diretor Martin Scorsese mostrou sangue em “Gangs de Nova York”, genialidade em “O aviador” e um delicioso passeio pelo submundo mafioso em “Os bons companheiros”.

Com “O lobo de Wall Street”, transformou DiCaprio no cão chupando manga, expressão dúbia para caracterizar alguém bom e/ou ruim: o cachorro doido da meca financeira ou a besta-fera da malandragem sofisticada.

O galã é sádico, ninfomaníaco e apocalíptico. Como um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, vende a promessa de salvação com o primeiro milhão.

Para cada operação fraudulenta bem sucedida, a quadrilha de Belfort fazia uma orgia regada a cocaína, pílulas da felicidade e prostitutas, elevando à máxima potência a regra do sexo sem limites: onde tem mucosa, se goza.

Na selva financeira de Wall Street, o lobo é o rei. Corrupção, lavagem de dinheiro, glamour, poder e decadência oscilam no filme.

Por fim, o anti-herói encara a desgraça, quando o FBI sai no encalço da quadrilha e coloca Belfort na cadeia. Eis a realidade desejadaCom direito a pena leve pela delação premiada dos seus parceiros no crime, fazendo jus ao que ele próprio dizia: “ninguém tem amigos em Wall Street”.

Se você saiu do cinema e não gostou do filme, refugie-se na poesia. Uma boa tradução de Wall Street é do poeta Sousândrade:

“- Tendo nós cofres públicos,

Livre-se a escravidão!

Comam ratos aos gatos!

Pilatus

Disse, lavando a mão.”

Qualquer semelhança entre Nova Iorque, o Brasil e o Maranhão é mera coincidência.

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