O blogue publica o artigo do professor Flavio Reis sobre
dois fatos polêmicos na UFMA: a criação do PROIFES e a eleição no DCE. Na
próxima postagem, divulgaremos a nota da APRUMA sobre a criação de uma entidade
sindical paralela.
Professor Flávio Reis
Departamento de Sociologia e Antropologia
A marca de centralismo e autoritarismo que caracteriza
a administração do reitor Natalino Salgado ganha mais um capítulo tenebroso.
Preocupado em submeter tudo e todos à sua vontade, sem conseguir sequer
conviver com críticas e posicionamentos contrários, volta suas baterias
novamente em duas frentes. A primeira é a tentativa de controlar o
Diretório Central dos Estudantes. Através de uma manobra, a comissão eleitoral
impugnou a chapa da diretoria Ninguém Pode nos Calar, que resgatou o DCE da
posição vergonhosa de ter se tornado uma representação chapa branca no período
2010/2011, alheio às lutas históricas por uma universidade plural e
participativa, servindo de mero apêndice da reitoria e agência de festas.
Circulou largamente através do YouTube o áudio de uma conversa em que o
presidente da comissão eleitoral se colocava abertamente como interessado em
articular uma chapa com um canal com a reitoria (disponível em http://www.youtube.com/watch?v=F6bO_cTd1bQ).
Apesar da eleição não contar com o quórum mínimo necessário, mostrando o
repúdio dos estudantes à manobra, a direção da universidade quer reconhecer o
resultado, um escândalo que deve parar na justiça. A segunda é a tentativa
de criar outro sindicato de professores, um sindicato chapa branca, vinculado
ao PROIFES, depois de ter perdido eleições para a diretoria da Apruma em duas
oportunidades e não ter conseguido sequer organizar uma chapa para concorrer às
eleições realizadas em dezembro do ano passado.
Na democracia professada pelo reitor Natalino Salgado,
manifestações contrárias são sempre tratadas com intolerância, problemas de
funcionamento não devem vir à luz do dia, reivindicações são apenas fruto de
descontentes que “não vestem a camisa da UFMA” (leia-se, não dizem amém a todas
as resoluções monocráticas vindas da reitoria), pois a instituição vive
simplesmente dias gloriosos. Os que estão no cotidiano das salas de
aula sabem que as coisas não são bem assim. Apesar do grande aumento no número
de matriculados, numa operação cujos resultados desastrosos começam a aparecer
nos inúmeros gargalos criados pela falta de professores, o que percebemos no
dia a dia é um contínuo esvaziamento do campus, uma irritação e um desestímulo crescentes.
Não se trata apenas de um período de transição, no qual o
próprio ensino ainda patina para encontrar novos rumos. O chão do processo é a
defasagem da estrutura administrativa da universidade, pesadona e controladora,
quando os tempos pressupõem exatamente o contrário. A própria forma como são
propostas modificações em atividades fundamentais, como as recentes normas
sobre o ensino de graduação, são pensadas de cima para baixo, com apenas um
arremedo de discussão proposto em cima de um texto base que, no caso, uma
observação feita pela comissão organizada pela Apruma mostrou ser cópia quase
literal de uma resolução da UFPI. Mais do que crescer, a UFMA vive um processo
de inchaço de uma estrutura arcaica e as iniciativas de modificação sempre insistem
em afirmar a centralização de decisões nas pró-reitorias. No fundo, quase não
há vida nas unidades, apesar da propaganda feita nas placas espalhadas pelo
campus e no site da instituição insistir em mostrar um mundo dourado “como
nunca se viu antes”, para lembrar um bordão que fez escola. Tanto aqui quanto
nos campi do interior do estado, entretanto, existem muitos problemas, mas,
segundo a ótica reinante, eles não devem ser debatidos e sequer publicizados.
Todas as vezes que aparecem, geram logo profundo mal-estar entre o Magnífico e
seus áulicos, como se fossem deturpações rasteiras de elevadas intenções.
Chegando ao ano final de seus dois mandatos à frente
da reitoria, antecedidos de dez anos no comando do Hospital Universitário,
Natalino Salgado tenta fechar o seu ciclo calando os únicos espaços
institucionais que não controla, com o golpe perpetrado no DCE e a tentativa de
organizar um sindicato paralelo de professores. Neste último caso, uma
articulação puxada pelos áulicos de sempre, pró-reitores e assessores, para a
formação do chamado Sind-UFMA, um sindicato atrelado ao PROIFES.
Por princípio, acho que a organização de interesses deve ser
livre e ampla. O problema é quando esta se dá a partir de cima, quebrando na
origem qualquer possibilidade de real independência. Se organizar chapas a
partir da reitoria já era algo escandaloso, tentar organizar outro sindicato
utilizando-se desses meios chega ser uma excrescência, sem mais nem menos.
Talvez o problema mais importante e decisivo nesta universidade seja o fosso
que historicamente foi estabelecido entre a administração superior e a
comunidade acadêmica. Essa questão chegou ao ápice na atual gestão, onde a
aproximação só se efetua através da cooptação. No momento em que entidades
importantes, como a ADUFC, se desvinculam do PROIFES, frisando entre os motivos
a “notória subordinação ao governo federal”, o “alheamento em relação ao
movimento docente nacional, promovendo o isolamento e a desmobilização dos
professores das universidades federais cearenses” e a “participação ativa na
implementação de medidas e normas que precarizam o trabalho docente”, é
exatamente este o modelo que o círculo próximo à reitoria quer criar aqui e
ficar ainda mais à vontade para impor procedimentos, como é do seu estilo,
contornando a resistência que a Apruma desempenhou, principalmente nos dois
últimos anos.
A universidade brasileira, de modo geral, guarda esse traço
centralizador que manteve dos tempos da ditadura, mas tem seus contornos
acentuados quando tratamos de sociedades em vários aspectos ainda largamente
oligarquizadas, como é o nosso caso. A luta de professores, alunos e
técnicos administrativos deve buscar a ampliação e a efetividade dos espaços de
participação na universidade, abrir as decisões, garantir maior autonomia para
as unidades num quadro de efetiva colaboração interdisciplinar. O processo em
curso tem seguido o caminho contrário, sempre falando em futuro, democracia,
inclusão, diversidade, mas agindo efetivamente para garantir a continuidade do passado,
com os velhos procedimentos de tomada de decisões em circuito fechado e as
mesmas figuras de sempre, pessoas que atravessam décadas nos círculos da
administração superior da universidade. A articulação do Sind-UFMA é uma
associação pensada para atrelar a representação sindical à reitoria, nada a ver
com as lutas dos docentes e a necessidade de democratização da
universidade.
Todos se lembram do papel importante que o DCE e a Apruma
exerceram no apoio aos estudantes em luta pela moradia no Campus diante da
intransigência de Natalino Salgado, vergada apenas após uma greve de fome
levada a efeito por discentes que dependem da moradia, prolongando-se por uma
semana, com mobilização que envolveu outros setores da sociedade em
solidariedade. São justamente estes espaços de resistência que a sanha
autoritária da reitoria tenta a todo custo anular.
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