Salvador Fernandes
Economista, servidor público federal, ex-presidente estadual do PT/MA (1996-2000)
Com o vice Carlos Brandão (PSBD), governador Flávio Dino (PCdoB) compôs aliança ampla para governar o MA |
A histórica e acachapante vitória político-eleitoral, no
primeiro turno das eleições majoritárias de outubro de 2014, imposta pela
coalizão liderada pelo Governador eleito Flávio Dino (PCdoB) à oligarquia
Sarney, sinalizou, no imaginário da maioria dos maranhenses, perspectivas de
profundas mudanças na gestão governamental do Estado. Incluem-se, nesse
sentimento coletivo, esperanças de que esse triunfo eleitoral pudesse redundar na
inauguração de relações transparentes e republicanas entre governo e os grupos
e lideranças políticas estaduais.
Após seis meses de administração - tempo escasso para uma
avaliação balizada do Governo de Flávio Dino, porém, suficiente para se delinear
uma tendência a partir dos atos já executados pelo governador -, indaga-se
sobre as possibilidades de efetivação das transformações propostas. Isso em
razão da superficialidade da ampla composição partidária, exemplificada nos
recentes e direcionados tensionamentos políticos publicizados pelo Senador
Roberto Rocha e pelo Deputado Federal José Reinaldo Tavares - lideranças de
proa da coalização - e do aprofundamento da crise política nacional, fortemente
condimentada pela recessão econômica e pelo retorno do espectro inflacionário.
Sabe-se que a conquista político-eleitoral foi resultante de
uma coalização majoritariamente integrada por forças políticas não pertencentes
ao denominado campo democrático-popular. A simbologia desse arranjo político
expressa-se na vice-governadoria cedida ao PSDB, agremiação que, no terreno
nacional, constitui-se no principal polo aglutinador da oposição às sucessivas
administrações petistas. Foi uma
excêntrica combinação política, pois o Partido do Governador - aliado do PT em
todas as disputas presidenciais posteriores à ditadura militar - sempre prestou
um expressivo apoio político aos Presidentes Lula e Dilma.
Essa dilatada coalizão refletiu-se na seleção dos novos
gestores estaduais. No caso do primeiro escalão, os nomes escolhidos ficaram,
na sua maioria, aquém das expectativas de muitos segmentos sociais. Nos demais
cargos comissionados, em pouco se alterou o padrão de nomeação a partir da
indicação dos chefes políticos regionais aliados do governo.
Situação análoga ocorreu na formação da base política no
legislativo estadual. A troca de lado da quase totalidade dos Deputados
Estaduais foi automática, inclusive dos representantes do sarnopetismo. A
revoada parlamentar culminou com a esdrúxula indicação, para a liderança do governo
na Assembleia Legislativa, de um ex-aliado de longas datas da oligarquia. Aqui,
verifica-se que a manifesta condescendência dinista com os governistas de ocasião,
independente da coloração partidária, não se diferencia da malograda experiência
de governabilidade do saudoso Governador Jackson Lago (PDT). Esse, à época, entrelaçado
à teia política conservadora, fragilizou-se e perdeu o necessário pulso
político-administrativo para enfrentar as corporações de interesses
fisiológicos, muitas delas encasteladas há décadas em setores estratégicos da máquina
pública estadual.
No plano administrativo, as medidas impactantes dos primeiros
meses de governo propiciaram uma ambiência de mudanças, cujos reflexos repercutem
positivamente nos percentuais de aprovação do governo, registrados nas primeiras
pesquisas de opinião.
O reconhecimento popular do Governo de Flávio Dino ocorre a
despeito da contundente reação do conglomerado midiático da oligarquia. Apagado
do jogo político nacional e acuado pela polícia federal, na esteira da Operação
Lava-Jato, José Sarney assumiu posição de vanguarda na tarefa de tentar
desconstituir a gestão dinista. Utiliza-se de repetidos artigos, cuja ladainha
é sempre o “desgoverno” que teria se apossado do Estado e da Capital. Traceja
sistematicamente uma situação de terra arrasada - mantra reproduzido, em cadeia
estadual, nos noticiários do Sistema Mirante de Comunicação e nos discursos dos
minguados remanescentes de seu grupo no parlamento estadual.
Trata os problemas
estruturais do Estado como se fossem exclusivamente de natureza corrente. O
Governador Flávio Dino passou a ser depositário de todos os atuais males da
política maranhense, independentemente de quando esses tenham sido gestados, ou
seja, esquece-se de que boa parte desse quadro, que beira a tragédia social e
ambiental, é produto de cinquenta anos de domínio oligárquico.
E não só isso, contra os desejos de mudanças na
administração pública estadual estão as confrarias dos contratos terceirizados
que encarecem os precários serviços oferecidos à população, executam obras de
construção civil de baixa qualidade, fraudam licitações e impermeabilizam a profissionalização
do serviço público. Demonstração específica e cristalina do direcionamento
dessas avenças são os acordos políticos de criação das Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs) e Organizações Sociais (OSs)
destinadas a operarem no Sistema Único de Saúde (SUS).
Ademais, com a aproximação das eleições de 2016, a demanda
por convênios eleitoreiros e outras mecanismos escusos de financiamento de
campanhas eleitorais, entre eles o comprometimento antecipado das receitas das prefeituras,
entram na agenda de muitos grupos políticos municipais e de seus representantes
estaduais. É bom que não se olvide de
que nesse quadrante, o tradicional movimento migratório dos grupos políticos conservadores
proporcionou ao PDT do Governador Jackson Lago, no pleito municipal de 2008, a
eleição de aproximadamente uma centena de Prefeitos. Contudo, no processo de
cassação, quase todos os trabalhistas de momento retornaram ao seu leito
político natural.
Além de que, perante a complexa demanda reprimida por
serviços públicos, tem-se na reduzida capacidade de investimento do Estado um importante
travo orçamentário. Boa parte dos projetos estruturantes públicos do Maranhão é
executada com o aporte de recursos federais. É sintomático que o nosso estado
figure entre as unidades da federação mais dependentes das transferências
voluntárias do Governo Federal.
Deste modo, ainda que o PCdoB seja um recorrente aliado
nacional dos governos petistas, o prolongamento das crises política e econômica
restringirá a busca das fontes federais de recursos públicos. Certamente, diante
desse nebuloso cenário político e econômico nacional, muitos dos projetos que
exigem grande monta de recursos financeiros terão de ser postergados. Tais
fatos implicam numa adicional dificuldade no implemento dos compromissos de
governo assumidos previamente.
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