Museu do Amanhã embeleza a praça Mauá, na região portuária do Rio de Janeiro |
Igreja de São Bento, no centro do Rio, onde os monges celebram ao som de canto gregoriano |
Os trovões rasgaram o firmamento a madrugada inteira. Às
cinco horas da manhã, na praça Mauá, ouvia os sinos do mosteiro de São Bento
anunciando as vigílias. Simultaneamente, aviões pousavam e decolavam no
aeroporto Santos Dumont.
As turbinas dos boeings atravessavam os sons dos sinos.
Dizem que o tempo não cessa. Mas, aquele instante congelou para escutar o
passado e o futuro.
Há séculos os sinos cantam a Deus. Outros deuses – os
astronautas – criaram máquinas supersônicas para explorar o céu.
As badaladas do campanário e as turbinas dos aviões
congelaram o presente. Naquele momento, eu me sentia na máquina do tempo,
escutando simultaneamente os sinos e os zumbidos, os pregões do cosmos.
Isso é ubiquidade.
Somos grávidos do tempo – a caixa acústica do universo.
Os sinos bailam e cantam. São as trombetas de Deus.
As turbinas rompem a velocidade do som....
Quando a cidade amanhece, vários ruídos juntam-se à paisagem
sonora do caos urbano: os apitos dos guardas de trânsito, as buzinas dos carros,
as britadeiras dos operários, os pregões dos vendedores ambulantes.
Bum! Tudo começou com a grande explosão – o Big Bang, dizem
os cientistas.
Na gestação do mundo, no princípio era o verbo, diz a Bíblia.
As mulheres grávidas cantam aos seus fetos. Quando nascem,
as crianças choram. O som é a primeira manifestação da vida.
E da morte também. Choramos e rezamos sobre as perdas dos
entes queridos.
O Grito da Independência, que nunca ouvimos, nos parece
familiar.
Ainda hoje guardo no imaginário sonoro da minha infância os
pregoeiros da rua Sousândrade, no Apeadouro: “Carvoeiro, carvão de varinha!” “Carvoeiro,
carvão de varinha!”
Em São Luís, quando eu era criança e trovoava, diziam que
Deus estava “ralhando” com a gente, por causa dos nossos pecados.
Na praça Mauá estão construindo o Museu do Amanhã.
Espero que guardem lá os sons dos sinos e das turbinas, das
britadeiras e das serras elétricas.
São os registros acústicos da criação destrutiva e da destruição
criativa.
A sinfonia do mundo ergue as coisas belas. A composição
sonora do universo ajuda a entender a vida. O mundo encanta não apenas pelo que
a gente vê. Mas, sobretudo, pelo que ouvimos.
Há séculos, os cantos gregorianos encharcam o espaço com a
energia vibrante dos seus acordes, antes e depois dos sinos.
Embalado nas badaladas do tempo, ouço os sinos na praça Mauá
atravessados pelas turbinas no aeroporto Santos Dumont.
A fé e a ciência no mesmo instante.
São os pregoeiros do universo anunciando, simultaneamente, o
fim e o começo, o passado e o futuro.
Assim seja!
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