domingo, 21 de março de 2010

MOZART NA ANTESSALA DO DENTISTA


Samuel Marinho *

Esse mês tirei enfim meu aparelho ortodôntico.

Agora estou com uma contenção que me atrapalha duas coisas: a fala e a mania de assoviar músicas sozinho.

O que mais vou sentir falta na minha ida mensal para manutenção ao ortodontista são as regalias que eu tinha na sala de espera.

Café, biscoitos variados, revistas diversas, televisão de alta definição e muzak, muito muzak.

Aquela música, dizem, que está ali simplesmente por estar.

Na sala de estar, na sala de jantar, na sala de espera, no elevador, no escritório.

Não quer te fazer refletir, nem pensar.

Parece ao mesmo tempo inebriar-te e inanizar-te.

Faço uso dos versos de Ferreira Gullar: Será arte?

Pois assim eu escutava as mais celébres sinfonias de Beethoven, “As quatro estações” de Vivaldi, Sebastian Bach (não é a banda de rock!), e Mozart, muito Mozart. O be-a-bá da música clássica.

Corria pra casa para tentar ouvir qualquer execução que soasse mais original.

Nada.

Estava inebriado pela associação “Mozart e Sala de Espera”.

Fiquei extremamente perturbado.

Contei tudo para meu analista de linha comportamental.

Afinal Mozart não era um dos grandes gênios daquele tipo de música que classificam como “clássica”?

Como eu poderia reduzi-lo agora a esse conceito muzak?

Sem êxito.

Praticamente um bate-estaca e qualquer das sinfonias que eu ouvisse a partir de então parecia o mesmo muzak daquela sala de espera.

Tudo sintetizado, pasteurizado, tirado a essência para completar o ambiente de revistas, cadeiras e pessoas à espera de apertar os aparelhos que prometiam fazer dentes rebeldes um dia voltarem para algum lugar.

Vou sentir mesmo muita saudade da antessala da minha ortodontista.

De todas essas reflexões absurdas que o muzak, uma música que não quer fazer refletir sobre nada, conseguiu me impor; e, sobretudo, saudades daquele universo de pequenas coisas a serem vividas em pouco menos de vinte minutos, por quem na grande parte do tempo não percebe a vida passar.


Samuel Marinho é colaborador deste blogue, contador e servidor público federal.

18 comentários:

  1. samuel nao sei mas quem vc eh...rsrsrs nem como se chama... É Samuel mesmo??? Afinal de contas és o filosofo do pop ou o pensador da música clássica???
    (Prometo não polemizar muito dessa vez....)
    rsrs
    gde bjo

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  2. sam
    duas coisas que eu naum sabia: que vc usava aparelho e que fazia analise... esse eh o motivo das suas loucuras??? é??? ashuashuashuash
    mas olha jah saquei esse lance do muzak vc tirou daquela musica de Zeca Baleiro e tal... isso realmente da uma boa discussão... De novo Zeca Baleiro hein??? vc gosta mesmo do cara (olha o veneno aí...) rsrsrsrs
    bjooos sam

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  3. Achei perfeita essa arte genial de publicizar as diversidades da vida;

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  4. samuka,
    muzak seria uma mistura de música clássica com prozac? algo assim que nos deixa zen por uma alquimia sonora?
    ed wilson

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  5. Imagina se vc tivesse no no proctologista escutando Los Hermanos !!!???

    Isso sim seria castigo grande...

    Essa do Mozart com ortodontista é fichinha...

    Aparelho ortodontico... Prozac... Isso é coisa de 'espírito adolescente' mesmo...

    O Observador.

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  6. ola andrea segundo o observador eu sou um adolescente
    não vejo mal nenhum nisso
    rsrsrs
    qualquer hora dessas assumo minha porção emo...
    "todo adulto tem inveja dos mais jovens"
    observador no meu texto tem algo sobre prozac????
    outra coisa aparelho ortodôntico há tempos jah deixou de ser acessorios de adolescente... e acho, senão me falha a memória, que vc precisaria usar um...
    los hermanos no proctologista vc falou com tanta propriedade que jah deve ter passado por isso...

    observador vc poderia contribuir com a discussão no lugar de fazer observações inócuas ?

    O assunto aqui é MUZAK...

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  7. prezada marta
    obrigado pela observação com status de "arte".... a arte tvz esteja na descontrução dos conceitos e preconceitos, todos eles... um grande abço apareça sempre

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  8. eD
    Seu trocadilho eh genial, perfeito.. ainda naum tinha pensado nisso...rs.. tvz a melhor definição pra muzak que eu ja vi...abçossss

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  9. Legal o formato do texto Samuel... É o que estamos denominando agora de postcrônica... Alia o tom confessional típico do blogue, de escancarar o cotidiano de uma forma simples, a um encadeamento lógico de acontecimentos que vão se entrelaçando e causando no fim uma catarse de profunda reflexão, típica do texto crônico.
    Parabéns.
    Você poderia escrever tranquilamente se quisesse pra qualquer jornal daqui de São Paulo.
    Nunca pensou em publicar nada?

    (E mais uma vez uma leve e oculta referência a Zeca Baleiro... como disse a amiga Andreia soh pra te provocar rs)

    Um grande abraço a todos

    Ivana Soares
    Estudante de Letras
    USP

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  10. Ivana e Andrea,
    Eu já falei para o Samuel que os textos dele têm qualidade para romper o Estreito dos Mosquitos - a linha imaginária que separa a ilha de São Luís do continente.
    Como agora ele está morando em Belém, digo que o barco dele tem velocidade para sair da baía do Guamá - o aguaceiro lindo que circunda a capital marajoara.
    Samuel é contador.... de histórias.
    Não precisa de diploma de jornalista, assim como Baleiro referiu-se àquela mulher que não precisa de salão de beleza.
    Abraços,
    Ed Wilson

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  11. Prezada Ivana e Ed
    A escrita pra mim sempre ocorreu de forma natural, desde muito cedo.
    Já cursei Letras na UFMA, passei lá um período, o suficiente pra eu dissociar a necessidade de ter um diploma do gosto e paixão incondicionais de debruçar os olhos sobre o mundo e viver de êxtases e insônias...
    Muito grato, de coração... pelas considerações
    Qto a ser publicado, não tenho esse desejo. Tenho medo de que vire ofício e eu perca o prazer. Estou formatando um livro de poemas que será jogado na internet e pronto, sem reserva de direito autoral... No máximo o que terá é um site para quem quiser acessar... Acho que sou assim impublicável...rs
    Valeuuuu

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  12. eh sam
    pelo visto daqui a pouco a tese será sobre vc
    rsrs
    bjoooosssssssss

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  13. http://divinainvencao.blogspot.com28 de março de 2010 às 16:40

    Nossa Ed, essa sua análise do neologismo "muzak" é belíssima, como diria Jósé Dias: genialíssima! Beijos!

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  14. http://divinainvencao.blogspot.com29 de março de 2010 às 12:10

    Eu fiquei tão impressionada com esse texto e em especial com a palavra "muzak", que coincidentemente encontrei o seu significado na versão john lennon. Ele se referiu a Paul em 1970 no álbum "imagine", com a música "How do you sleep?", acusando-o de fazer canções que são tocadas em elevadores, "muzak". Que intrigante!

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  15. O muzak além de ser a mistura de música com prozac é assim uma divina invenção...! Por isso a intriga...rs

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  16. (risos). Realmente, você é um contador, de histórias né.rsrsr

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  17. O que é a música "clássica" a qual se classifica estar mozart, beethoven, entre tantos outros compositores?

    Na verdade, mesmo com o maior progresso da tecnologia, do "tecno", a música que sempre ficará para os nossos netos será aquela guardada em um fundo de baú, por amantes dela, seja em uma resma de partituras,para ser executadas no futuro por aqueles que conhecem a leitura musical, ou serem apreciadas em vinil, k7, CD, DVD, ou qualquer outra mídia, que estiverem bem conservadas, pois aquela música que serviu apenas para pegar "a que tá solteira hoje", foi só fundo musical do ontem. Já passou, já virou produto descartável, como um copo plástico, ou melhor, um copo de papel, pois ao primeiro sinal da nossa bela chuva paraense, escorrerá pelo ralo, para nunca mais se voltar a ouvir.

    Quem faz a música ser clássica é a sociedade, que a guarda, como algo sacro, sagrado, que coleciona-a, que cuida, pois sonha que um dia as futuras gerações a conheçam.

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  18. Eh verdade André
    Como diz a Muzak de Zeca Baleiro "Minha alma dorme num velho porão..."
    Grato pelas observações e Volte sempre!

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