segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O MARANHÃO COM TODO GÁS: PARA QUEM?

O documentário “Maranhão 66”, produzido pelo cineasta Glauber Rocha na posse do então governador José Sarney, é uma importante peça histórica para a análise do cenário presente.

No seu discurso inaugural, Sarney apresentava-se como a catapulta do progresso, prometendo tirar o povo do atraso e da miséria marcantes na era vitorinista.

Empossado governador, Sarney criou a Lei de Terras, favorecendo o latifúndio e a violência no campo, ao desagregar centenas de trabalhadores rurais e expulsá-los de suas terras pelos novos proprietários

e grileiros do Maranhão.

Nos anos 1980 começou a implantação dos projetos mínero-metalúrgicos. Vieram a Alumar e a Vale (ex-Rio Doce), junto com muita propaganda e promessas de milhares de empregos para desenvolver o estado. Iniciou-se o ciclo dos enclaves econômicos com fortes impactos no meio ambiente.


Agora, anuncia-se descoberta de uma gigantesca reserva de gás natural em Capinzal do Norte. “É meia Bolívia”, proclamou o milionário Eike Batista, ao anunciar o novo milagre maranhense. Vez por outra criam-se mirabolantes pirotecnias em promessa de grandes investimentos aqui.


Nos primeiros mandatos de Roseana Sarney (PFL) no governo, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) veio ao Maranhão inaugurar o famigerado Pólo de Confecções de Rosário, que deixou um rastro de destruição na vida de centenas de pequenos trabalhadores na região do Munim.

Ora é uma fábrica de roupas, ora um projeto de irrigação, ora uma refinaria de petróleo e agora “meia Bolívia” de gás natural.


Dos anos 1980 para cá, o Maranhão sempre ocupou as manchetes nacionais com os piores indicadores econômicos e sociais do Brasil. As promessas de desenvolvimento do nosso estado descarrilaram nos trilhos da Vale ou derreteram nas caldeiras da Alumar.


Passados 40 e tantos anos, a cena maranhense não muda. Viajando por qualquer trecho desta terra fantasiosa observa-se o retrato de uma existência ainda primitiva das casas de palha e taipa na beira da estrada, espremidas entre as cercas dos latifúndios e o asfalto.


O Maranhão que produz alumínio e exporta minério de ferro, o Maranhão que tem um dos melhores portos do mundo (o Itaqui), o Maranhão que tem um centro de lançamento de foguetes em Alcântara, o Maranhão que está prestes a refinar petróleo, o Maranhão que tem “meia Bolívia” de gás natural ainda não conseguiu sequer acabar com as casas de palha e taipa.


Nem o barro abundante nas nossas terras foi transformado em tijolos e telhas, uma tecnologia simplória se comparada ao refino de petróleo, transporte de minério e produção de gás.


Grande parte dos maranhenses não domina a tecnologia básica da sobrevivência – manejar um talher ou uma colher. Imagine um mause de computador.

Vive-se aqui um atraso tecnológico primário, fruto de um retrocesso político e econômico programado para dar certo para uns poucos e tudo errado para a maioria.

Ninguém imagina Eike Batista, um capitalista visceral, vindo ao desconhecido Capinzal do Norte gerar desenvolvimento e distribuição de renda aos maranhenses.

O gás vai turbinar a riqueza de meia dúzia de empreiteiros e negociantes acostumados às mamatas do Palácio dos Leões. Nada mais a esperar.

9 comentários:

  1. Ed Wilson,
    Acho seu post extremamente preocupante. Aponta que o ferro da Vale e o alumínio da Alumar não tornaram o Maranhão rico. Acha que o estado estaria melhor sem elas?
    Concordo plenamente que o Maranhão é pobre, tem muitas deficiências.
    Nosso dever é procurar as saídas para esses desafios, o gás de Capinzal do Norte será uma grande arma. Os impostos gerados, o excesso de energia na região, e os investimentos necessários para o pleno desenvolvimento do gás vão gerar dividendos para a população do estado.
    Serão muitos empregos e muito dinheiro vindo para o estado. E a energia barata atrairá ainda mais empregos e dinheiro para o estado.
    Nossa discussão tem que ser de como manter a maior parte desses benefícios para a população, não ficar simplesmente dizendo que de nada servirá o gás.

    Outro fator preocupante é permitir que Roseana monopolize o discurso do desenvolvimento do Maranhão. É necessário industrializar esse estado e isso tem que estar na consciência de todos os militantes de esquerda.

    Francisco Carvalho Venancio
    Estudante

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  2. Ed Wilson seu texto está ótimo,essa sua análise é mais profunda que já vi ou li até o momento sobre o assunto.

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  3. Francisco Venâncio,
    Não sou contra investimentos no Maranhão. Ocorre é que esses investimentos, sob a ótica de modernizar o Maranhão, não conseguem desenvolver o Estado. Há um contraditório entre progresso e desenvolvimento.
    O desenvolvimento é algo mais profundo, que implica em projetos que gerem mais empregos e distribuam renda.
    O que precisamos é modernizar a agricultura do Maranhão, dando condições para os pequenos e médios produtores produzirem inclusive para exportação. Veja o caso do Ceará, que produz frutas para exportação, e lá não tem água. Aqui nós temos água para todo lado e compramos tudo de fora.
    Precisamos planejar a economia do Maranhão com foco nos nossos potenciais econômicos, do artesanato, passando pelo turismo, indústria e grandes projetos. O que ocorre, porém, é a prioridade para os grandes projetos. Agora fiquei sabendo que o sul e sudoeste do Maranhão vão ser invadidos pelo eucalipto da Suzano. Que tipo de benefícios concretos, para a maioria da população, o eucalipto pode trazer?
    Ed Wilson

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  4. Salomão,
    Grato pela participação. Vamos em frente.
    Ed Wilson

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  5. Ed Wilson,
    Está exatamente ai o X da questão. Progresso, como chamou, e desenvolvimento não são a mesma coisa. Esses investimentos não tem trazido benefícios para a população maranhense(ou benefícios insuficientes). Temos que discutir como que esses investimentos podem trazer esses benefícios.
    Para começar o debate eu sugiro que se exija contrapartidas sociais das empresas que se instalam aqui, talvez com incentivos fiscais.
    No caso específico do eucalipto, pode-se exigir e incentivar a Suzano a treinar pessoal do Maranhão em troca da construção de um trecho de ferrovia até seu centro de corte. Ou quem sabe cobrar que a própria Suzano construa algum tipo de infra-estrutura.
    Concordo que a agricultura tem que ser incentivada, mas a indústria tem a capacidade de ser um grande motor de desenvolvimento.

    Apesar de o "progresso" não ser igual ao desenvolvimento aquele carrega em si uma semente para este. Semente que pode ser morta, como costuma acontecer no Maranhão. Mas também pode germinar de forma triunfante e gerar muitos frutos, se cuidada da maneira correta.
    Temos que discutir qual a melhor maneira de cuidar dessas sementes. O que devemos fazer com esse gás? Como devemos treinar a população para melhor se aproveitar dessa chance? Como trazer esses benefícios para o entorno das jazidas?
    Quem conhece o litoral norte fluminense sabe que riquezas minerais como a descoberta em Capinzal trazem um volume de recursos gigantesco para seu entorno. Rio das Ostras e Campos dos Goytacazes são cidades que tem grandes obras. Mas enquanto Campos(dominada pelo casal garotinho) tem péssimos indicadores educacionais, Rio das Ostras apresenta um ótimo índice de educação. Temos que buscar como aplicar o dinheiro como em Rio das Ostras, e como impedir que ele seja jogado no ralo como em Campos.

    Entendo perfeitamente sua indignação, mas acho pouco produtivo simplesmente fazer esse diagnóstico e não discutir como mudá-lo. Parece que tanto faz ter ou não gás. Ter ou não investimentos, indústrias. E se tanto faz, e ainda "vai turbinar a riqueza de meia dúzia de empreiteiros e negociantes acostumados às mamatas do Palácio dos Leões". Melhor que nem tenha. Essa lógica esta errada, profundamente errada.

    E ainda há a repercussão político-eleitoral de se fazer esse discurso. Permitir que Roseana monopolize o discurso da industrialização é equivalente a transformar ela na única esperança de muita gente desempregada desse estado. Além de abrir um grande flanco para seu ataque.

    Francisco Carvalho Venancio
    ps: deu erros aqui na hora de enviar, se esse for uma duplicata sinta-se livre para não republicá-la.

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  6. Prezado Francisco,
    Não há como tirar esse discurso da modernização conservadora do grupo Sarney. Eles governaram esse tempo todo. É uma questão cronológica, associada a uma forma muito primitiva de fazer política.
    Passei a minha vida toda no PT escrevendo e debatendo a construção de um projeto de desenvolvimento para o Maranhão. Tenho 43 anos. Passei minha juventude toda dedicada a isso. E agora o PT está vendido para Sarney.
    Vi esse tempo todo muita propaganda sobre esses milagres no Maranhão. Faz pouco tempo inventaram um megaprojeto de irrigação - o Salangô - que iria revolucionar a produção agrícola no Maranhão.
    Não produziu um quilo de arroz sequer.
    Então agora vem o gás. Vamos ver...
    De todos esses o que acho produtivo na geração de empregos é a refinaria de petróleo, porque trata-se de um projeto nacional concebido pela Petrobras, que tem sensibilidade para as compensações ambientais e para os impactos sócio-econômicos. Agora com Eike Batista e a Suzano, sinceramente, pela natureza capitalista selvagem deles, não vejo muito futuro.
    Espero que vc tenha razão.
    Abraço,
    Ed Wilson

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  7. Caro Ed Wilson, sua análise cronológica sobre os "grandes" projetos no maranhão é excelente. Concordo que a exploração do gás trará benefícios somente a um pequeno grupo, como quase tudo nesse estado.

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  8. Caro Ed, não conhecia esse filme do Glauber Rocha, extraordinário.
    Para os que querem ver, o link no YouTube é o seguinte:http://www.youtube.com/watch?v=t0JJPFruhAA

    Um grande abraço

    Christian Delon

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  9. Christian,
    Muito grato pela colaboração.
    Ed Wilson

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