sábado, 21 de abril de 2012

A ORIGEM DA TRAGÉDIA

Filme “Incêndios” tem como pano de  fundo uma guerra civil no Oriente Médio

por Eduardo Júlio *
Texto publicado originalmente em O Imparcial

Embora não faça referências a nomes ou símbolos oficiais do Líbano, o filme "Incêndios", do diretor canadense Denis Villeneuve, é baseado em fatos da guerra civil que devastou o país de 1975 a 1990. O longa está em cartaz na mostra de filmes de arte do Box Cinemas e será exibido no dia 21 (sábado), às 18h30, e 25 (quarta-feira), às 21h. Com roteiro minuciosamente elaborado, sempre confrontando presente e passado, o filme é uma das obras cinematográficas mais densas dos últimos anos. Uma história bastante emotiva. Porém, sem piedade, como um soco no estômago.

Baseado numa peça do libanês Wajdi Mouawad, que fugiu com sua família para o Canadá, aos 8 anos de idade, por conta da guerra, o enredo de "Incêndios" é quase uma equação matemática e permite entender um pouco o que foi aquele trágico conflito e suas possíveis consequências ou de qualquer guerra do tipo. 

No longa, as datas, o país e os acontecimentos específicos não são intitulados. Os vilarejos e cidades recebem nomes fictícios. Os palestinos, por exemplo, são chamados apenas de "refugiados". O nome Líbano também não é citado. Mas estão lá o cenário (montanhas e vales), as diferenças geopolíticas entre o Norte e o Sul e o motivo maior daquela guerra: o conflito entre árabes cristãos, que lutaram contra a presença palestina no Líbano, e árabes muçulmanos, que apoiaram a causa palestina.

"Incêndios" conta a história dos gêmeos canadenses Jeanne (Mélissa Désormeaux-Poulin) e Simon (Marwan Maxim) que acabaram de perder a mãe, Nawal Marwan (Lubna Azabal). Ela deixa uma incumbência aos filhos: entregar dois envelopes, um ao pai deles e outro para o irmão. Apenas após a entrega de ambos é que será possível colocar uma lápide na sepultura da mãe. Só que Jeanne e Simon não sabiam da existência do irmão e acreditavam que seu pai estava morto. E assim começa uma jornada investigativa em busca do passado da mãe, que os leva até o Líbano.

Jeanne vai primeiro e à medida que sai procurando pistas do passado da mãe, vai descobrindo a história trágica da sua origem, ou seja, quanto mais o filme avança, mais dramático se torna. É uma caixa de Pandora. É impossível para o espectador sair ileso após cada descoberta. O diretor Denis Villeneuve narra a história de forma rápida e concisa, sem tempo para estados contemplativos.

A atriz belga, de origem marroquina e espanhola, Lubna Azabal interpreta com precisão a mãe, Nawal, uma árabe cristã. Na juventude, ela namorou um palestino muçulmano, que é assassinado pelos irmãos dela. Grávida, fica sob os cuidados da avó. Quando o bebê nasce, a avó envia o menino a um orfanato. Depois de presenciar o fuzilamento por uma milícia cristã de um grupo de civis muçulmanos, que viajavam num ônibus, Nawal passa a apoiar, como guerrilheira, a causa palestina, assassinando um famoso líder cristão libanês. Como consequência, passa 15 anos numa prisão sofrendo torturas e abusos sexuais. E aí reside o segredo maior da trama.

Só para lembrar: o Líbano é o mais liberal dos países árabes. É o único em que a população cristã é equivalente, em número, à muçulmana. E como diz um personagem do filme: a guerra civil foi uma sucessão de retaliações.

Eduardo Júlio é poeta e jornalista.

Um comentário:

  1. Muito bom filme. 0 jornalista descreve de forma precisa e esclarecedora. Que haja continuidade ao programa cine alternativo. sds.

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