terça-feira, 2 de julho de 2013

PROTESTOS INDICAM DECLÍNIO DA ESQUERDA “TRADICIONAL”

Os partidos políticos do chamado campo democrático-popular e os movimentos sociais têm um legado no processo de redemocratização do Brasil e nas conquistas mais recentes da cidadania.

Não há como impedi-los de participar das manifestações de rua, se foram justamente os sindicalistas, militantes e dirigentes de esquerda que sempre levantaram as bandeiras da liberdade, contra a corrupção, pela igualdade e inclusão social.

Muitos deram até a vida na luta contra a ditadura militar. É um equívoco, portanto, rasgar as bandeiras dos partidos radicais, contrariando o princípio constitucional da livre manifestação do pensamento e da liberdade de expressão.

Ocorre, porém, que os partidos e os sindicatos “tradicionais”, dissidentes do PT e da CUT, perderam até agora uma batalha – a comunicação/mobilização.

Está em curso uma nova forma de aglomerar as pessoas. É a organização “desorganizada”, sem aquele sonhado comando tripartite (estudantes, operários e camponeses), como se pretendiam as alianças nos anos 1960 e 1970.

Nesse período havia foco na luta contra a ditadura militar e o horizonte do socialismo alimentava as mentes e os corações dos revolucionários. Em 2013 os protestos visam mudanças imediatas. Não há um objetivo estratégico e radical de transformação do modo de produção capitalista.

BRASIL PLURAL

Outra questão relevante é a complexificação da sociedade civil brasileira. Tributários das frentes de luta contra a ditadura, os movimentos sociais estratificaram-se em várias organizações específicas: mulheres, negros, índios, quilombolas, juventude, mídias livres/comunitárias/alternativas, canabianos, ambientalistas, Movimento GLBTTS, evangélicos etc.

Basta observar, por exemplo, que as grandes mobilizações sindicais perderam terreno para outras ações políticas, religiosas e culturais como a Parada Gay, a Marcha da Maconha, Marcha para Jesus e a Marcha das Vadias.

De alguma forma, esse processo de especificação da luta política desmontou o comando unificado das grandes mobilizações e greves sob a batuta dos partidos e centrais sindicais.

À proporção que a CUT se transformava em uma correia de transmissão dos governos Lula/Dilma, abriu-se um vazio na organização da sociedade civil, deixando o barco dos movimentos sociais à deriva.

Órfãos das plenárias e da organização de base, parte dos militantes vanguardistas e as novas gerações de insatisfeitos (esses em ampla maioria), passaram a se organizar nos coletivos e comunidades da Internet, inicialmente no falido Orkut.

DESCENTRALIZAÇÃO E PRAGMATISMO

Sem o horizonte do socialismo nem o comando unificado dos partidos ou das centrais sindicais, o povo está nas ruas reivindicando uma pauta difusa, mas cujos resultados já começam a aparecer.

A paciência histórica do proletariado que alimentava o sonho revolucionário dos socialistas foi ultrapassada pela nova organização veloz e pragmática da massa conectada nas redes sociais.

As gigantescas manifestações de rua em 2013 prescindem do comando unificado das centrais sindicais, outrora líderes das greves gerais.

A CUT, atrelada ao governo, há muito não serve para quase nada relacionado aos direitos dos trabalhadores. Dissidente do sindicalismo CUTista, a CSP Conlutas, vinculada ao PSOL e ao PSTU, tem o discurso ideologicamente acertado mas não consegue conectar as pessoas nas ruas.

Tanto o sindicalismo quanto os partidos da linha radical de esquerda perderam a capacidade de mobilizar e liderar a massa nesse fenômeno de 2013, mas podem retomar o comando depois.

As manifestações de rua são conduzidas pela massa impulsiva, refém dos seus próprios instintos, espontânea, conectada pela Internet, através dos flash mobs.

Repetindo um bordão já surrado, o sindicalismo e os partidos de esquerda estão ainda no mundo analógico; a massa, no digital.

CRISE DE REPRESENTATIVIDADE E COMUNICAÇÃO

Ainda não há pesquisas de opinião para mensurar a rejeição dos manifestantes às bandeiras dos partidos de esquerda, mas uma hipótese pode ser levantada: a decepção gerada por Lula/Dilma leva as pessoas a enxergarem no PSTU e no PSOL um fantasma: o PT de amanhã.

Do ponto de vista ideológico, PSTU e PSOL representam as causas erguidas nas ruas (combate à corrupção, mais verbas para educação e saúde etc), mas o povo não se sente representado por eles. De nada adianta dominar o discurso supostamente verdadeiro se a esquerda só fala para si mesma e não interage com a massa.

Um dos problemas está nas formas de organização e mobilização.

Se as manifestações de 2013 estivessem sob o comando das centrais sindicais e dos partidos progressistas ou de esquerda, haveria dezenas de plenárias para tomar decisões e outra imensa quantidade de reuniões para avaliar o texto do panfleto unificado, onde os sindicalistas, atropelando os jornalistas, escreveriam e desmanchariam infinitos parágrafos para chegar à versão final.

Sindicalistas de diversas profissões (bancários, professores, médicos, engenheiros etc) metem-se a escrever panfletos e jornais com uma linguagem burocrática que só consegue convencer seus próprios pares, em longas análises de conjuntura, muito fundamentadas e importantes, mas sem produzir comunicação com a maioria das pessoas.

A esquerda pode até estar com a razão, mas perdeu o comando das manifestações. Quando fala, não comunica. E comunicação, na contemporaneidade, é tudo. Vivemos a era da convergência e da ubiqüidade. Todas as pessoas estão conectadas simultaneamente e não há tempo a perder.

Na Internet, as pessoas vivenciam uma cultura participativa independente do comando das lideranças tradicionais. Cada qual tem sua causa, postada no Facebook, à revelia do presidente do sindicato ou do dirigente partidário.

Não dá para esperar a reunião do comando unificado e as longas (importantes, ressalto!) análises de conjuntura. O povo na rua tem pressa!

Como dizia o poeta Maiakóvski: “o mar da história é agitado.”

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