sábado, 21 de junho de 2014

A APRUMA E A DEFESA HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO PÚBLICA, GRATUITA E DE QUALIDADE!

Professora Lucelma Braga
Centro de Ciências Agrárias e Ambientais CCAA/UFMA

Tendo lido os textos dos professores Flávio Reis e Maria Ozanira e participado, nos últimos quatro anos do movimento docente na UFMA, senti-me estimulada a também manifestar minhas reflexões acerca dos recentes acontecimentos políticos em nossa universidade.

Sou filiada a APRUMA há pouco tempo, considerando a história e a relevância da atuação dos professores supracitados e de muitos outros que têm, bravamente, construído esta entidade ao longo de sua existência que já remonta 36 anos. Mas tenho acompanhado a atuação da APRUMA, desde a década de 1990, quando eu ainda era estudante de graduação. Por um lado, acompanhei a construção histórica desta entidade através da atuação de professores combativos, que foram e são referências ético-políticas para mim e para muitos outros militantes. 

Por outro lado, participei ativamente do movimento estudantil, empreendendo em conjunto (DCE/APRUMA) importantes lutas em defesa da educação pública, no contexto de implementação das políticas neoliberais, que trouxeram graves impactos  para a realidade social como um todo. Lembro-me entre inúmeras batalhas, da participação ativa da APRUMA no Fórum Estadual em Defesa da Educação Pública, que foi parte do movimento nacional amplo, democrático e propositivo de elaboração do Plano Nacional de Educação – PNE, que embora tenha sido rechaçado pelo governo à época, é sem sombra de dúvidas, até hoje, uma importante referência para a educação brasileira,  construída a partir do esforço coletivo de inúmeros educadores, estudantes e outros atores sociais, comprometidos com a defesa intransigente do caráter público da educação.

Desde então, a APRUMA tem sido alvo de inúmeras críticas e certamente parte delas resultam da clareza e firmeza com que vem defendendo o seu projeto de universidade e de sociedade. A crítica mais recente foi encampada pelo grupo de professores que organizam o SIND-UFMA. Tais críticas precisam ser debatidas. Por um lado, para serem desmistificadas, por outro, como elementos para nossa autocrítica, processo que deve ser realizado permanentemente por qualquer militante sério. Uma crítica que considero bastante relevante é a acusação de que a nossa entidade está descolada dos reais problemas  dos professores de nossa universidade e que a mesma precisa “de um sindicato de verdade e não uma ‘seção sindical’ atrelada a outros interesses”. Discordo da suposta veracidade com que é firmada esta acusação. E vou explicar. Penso que num debate franco somos levados a reconhecer que não há política, ou disputa política, sem projeto, ou seja, sem interesses. 

O que necessita ser dito com clareza é quais são os reais interesses em disputa com a criação do SIND-UFMA. Sem dúvida, são interesses não apenas distintos dos interesses histórica e publicamente defendidos pela APRUMA, mas são principalmente interesses ANTAGÔNICOS. Em suma, estamos diante de dois projetos de universidade, de sociedade. Quem participa minimamente da vida política em nossa universidade e conhece a prática política dos protagonistas deste que se apresenta “como um novo jeito de fazer sindicalismo”, sabe do que eu estou falando. Um fato que por si só deixa claro o lugar de onde fala este “novo sindicato”  está registrado na matéria do Jornal O Imparcial, publicada em 28 de maio de 2014, em que o Reitor da UFMA, Natalino Salgado, fala do entusiasmo do Ministro da Educação, Henrique Paim,  quando recebeu a notícia de criação do SIND-UFMA. É curioso que o grupo do SIND-UFMA, tendo desencadeado um processo nesses termos, conforme fica explícito na matéria do jornal citada acima, reivindique autonomia e independência da APRUMA!

Talvez fosse interessante que os professores tentados a organizar um sindicalismo de novo tipo participassem antes das assembleias da APRUMA, defendendo publicamente seu projeto de universidade (sem escamoteá-los!!), e expondo suas ideias acerca da sociedade, poder, etc. Assim ficaria transparente, algo que o SIND-UFMA também reivindica da APRUMA em seu panfleto de criação, a quais partidos políticos pertencem os protagonistas do “novo sindicalismo”, pois esse discurso de pretensa pureza política, nos coloca precipício abaixo na despolitização da nossa categoria.

A participação nas assembleias da APRUMA seria muito interessante inclusive porque lá disputaríamos ideias, projetos para além do processo eleitoral (eleição - espaço de disputa privilegiado dos protagonistas do SIND-UFMA, o que por si só, já é sintomático do projeto que defendem!!!). Fica aqui o meu convite especialmente direcionado aos professores assediados pelos protagonistas do SIND-UFMA, a  participarem não apenas da disputa eleitoral  da entidade, ou da criação de um outro sindicato, mas do debate sempre democrático, que define coletiva e legitimamente os rumos que deve tomar o movimento docente na UFMA e fora dela.

Outro aspecto destacado no panfleto de criação do SIND-UFMA é o fato de que estamos em um mundo, em um país e numa universidade, diferentes. Dessa análise, eu concordo. E também vou dizer a razão. Não tenho a pretensão de fazer análises acerca das transformações mais gerais ocorridas no país e no mundo, afinal fomos convocados a tratar de questões locais, termo-fetiche usado pelos protagonistas do SIND-UFMA, mas sabemos  que o uso de um referencial teórico-metodológico consequente nos coloca diante do desafio de entender o local em articulação com os outros níveis da realidade objetiva, o que nos revela que entender a nossa universidade é impossível, sem situá-la  no contexto mais geral em que a universidade brasileira está inserida. 

Primeiro, é necessário reconhecer que nós crescemos, embora com preocupante inovação e relativa (apenas relativa) inclusão social! Vejamos os dados da expansão da NOSSA universidade. O número de campi da UFMA cresceu 125% nos últimos anos, pós-REUNI. Analisados os referidos dados, sem a análise do funcionamento real dos nossos 9 campi, poderíamos  dizer que estamos diante de um incomensurável avanço. Mas vamos com a acuidade necessária, para que não fique turvo o nosso olhar com a “cortina de fumaça” que produz este programa de expansão. Crescemos, em termos de matrículas, 145% na pós-graduação stricto sensu e 63,8% na graduação presencial. Se considerarmos que são basicamente os mesmos professores que atuam da graduação e na pós, e que esse segmento experimentou aumento de apenas 43,3%, temos um problema.  Alias, um problema grave! 

Não podemos simplesmente nos entusiasmar com o crescimento quantitativo da UFMA, sem considerar as contradições acarretadas com esse processo de expansão. Se adicionarmos à desproporcionalidade com que cresceu o número de matrículas e o número de professores, o fato de que o aumento de técnico-administrativos foi de apenas 6,9%, compreenderemos que estamos diante de uma tendência nacional, que expande as oportunidades de acesso à universidade às custas da intensificação e  da precarização do trabalho docente.

A partir de uma breve análise histórica, temos uma melhor compreensão do que está acontecendo na universidade. Em 1980, a proporção professor-aluno era de 7:1, passou a 8:1 no ano de 1998 e chegou a 11:1 em 2004, de acordo com Bosi (2007).  Atualmente, na UFMA, alcançamos a proporção 20:1, superando a própria meta do REUNI, cuja proporção professor-aluno, é de 18:1.  Isto tudo demonstra que, de fato, estamos em outra universidade. O que importa é compreender o rumo da mudança a que fomos arrastados, bem como os efeitos sobre o nosso trabalho e a formação acadêmico-científica das novas gerações.

É notável o compromisso com que a APRUMA e o Sindicato Nacional-ANDES vêm denunciando os impactos dessas mudanças sobre a perda da potencialidade do trabalho educativo que realizamos e sobre nossa saúde física e psíquica, entre outros. Nesse sentido, como acusar a nossa entidade de estar descolada dos reais problemas que afetam os professores de nossa universidade? Mais uma vez estamos diante da necessidade que nos desafia a responder a questão: qual universidade defendemos  e que tipo de atuação sindical consideramos adequada para enfrentar tais políticas...

De fato, temos que encontrar coletivamente medidas cada vez mais eficazes no enfrentamento dessas políticas e seus implementadores, mas buscar tais alternativas passa pelo entendimento de que não se trata de arrefecer nossa capacidade de luta, adotando o apregoado diálogo, proclamado pelos protagonistas do SIND-UFMA, com quem tem historicamente contribuído com o enfraquecimento do nosso movimento de resistência, fragmentando nossa categoria, a partir da criação de uma entidade atrelada à reitoria.

Com isso quero comentar mais um aspecto do já referido panfleto. Ele convoca a se filiarem, os professores que desejam ter um sindicato onde “o professor e sua família possam usufruir de momentos de lazer” ou que desejam “ter vantagem em vários tipos de serviços por meio de convênios com empresas”. Será que são esses os problemas que a nossa categoria quer ver resolvidos, enfrentados? Penso que necessitamos debater de forma mais consequente o que isto significa para o cotidiano de nossa atuação como docente.

Por último, penso que todo esse debate, desde os últimos processos eleitorais, tem sido muito importante para o movimento como um todo, considerando que a universidade é um espaço de disputa de ideias, e que o pensamento divergente como tal precisa ser respeitado.  Mas, para ser salutar o debate, necessitamos analisar o que está em disputa e não aderir a este ou a aquele projeto por constrangimento, pressão ou relações pessoais etc. Urge superarmos a análise idealizada do movimento docente como um todo e da  nossa entidade em particular, como se a APRUMA não fosse expressão da atuação de homens e mulheres em luta, enfrentando todas as  contradições que comporta esse processo.

Eu posso afirmar, como alguém que já participou de uma gestão da APRUMA (2010-2011) que, antes de tudo, a construção cotidiana desta entidade é realizada por docentes que além de realizarem as atividades de ensino, pesquisa e extensão na universidade, ainda se dedicam a contribuir com a luta, num ato que a um só tempo expressa a coragem e o compromisso com a universidade pública, gratuita e de qualidade social.


A APRUMA, assim como todas as entidades classistas, entendidas desse modo, necessitam atualizar o debate, revigorar sua atuação, fazer autocrítica permanente de suas práticas e fortalecer a organização para os combates necessários, aglutinando cada vez mais forças efetivamente capazes de expressarem um projeto autônomo de universidade e de sociedade.

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