Prof. Joedson Marcos Silva
Sempre que digo acreditar na verdade, algumas pessoas me tratam
com estranhamento, céticas em relação a minha convicção. Parece que demonstrei
a crença em algo muito bizarro, há muito sepultado, e que tenho uma visão antiquada
sobre as coisas. É como se eu tivesse manifestado crer ainda em bruxas, gnomos
e outras lendas. E pior: muitas dessas pessoas que me censuram por acreditar
ainda na verdade creem em bruxas, gnomos e em outros absurdos não tão
inofensivos.
A alegação principal, a mais comum, consiste em apontar para
a diversidade de crenças, convicções, posicionamentos políticos, visões de
mundo e pontos de vista alternativos sobre os mais diferentes assuntos. Com
tantas perspectivas, declaram, como pode alguém ainda levar a sério a verdade?
Só alguém muito dogmático ou intolerante poderia pensar assim, crer que há
verdade e falsidade, que uma interpretação sobre o que está acontecendo é
correta e outra é equivocada, protestam.
Quero, aqui, discordar de quem concebe que a existência da
verdade é incompatível com a diversidade de opiniões e dar algumas razões para
se pensar que, pelo contrário, a intolerância pode muito bem estar do lado dos
que a negam.
Primeiro, se concebo que a verdade existe, o que está por
trás dessa minha convicção é a suposição de que o mundo tem certas
características e que estas, na maior parte dos casos, são independentes das
crenças que possuo. Assim, se penso ser Fortaleza a capital do Maranhão, há
algo no mundo que endossa ou não esse meu juízo. E por mais forte que seja o meu
apego a essa ideia, não é isso, nem é a intensidade dessa convicção o que a torna
verdadeira; quem faz isso, ou não, é o mundo. É ele que, infeliz ou felizmente,
não poupa minhas crenças, mesmo as mais estimadas. Digo infelizmente, pois
gostaria muito que meu apego à ideia de que sou um milionário tornasse isso uma
verdade, mas, por mais que eu acreditasse firmemente nessa ficção, toda certeza
seria inócua na solução de meus problemas financeiros, bem concretos. E felizmente, pois quem afirma que o Brasil é
um país justo, com políticos honestos e que trabalham unicamente pelo bem dos
seus eleitores pode, para a sorte da população, ser desmentido com vastos fatos
e argumentos simples, a despeito da difusão dessa ideia e da insistência dos
interessados em que ela se propague e se mantenha com vigor na mente dos
incautos.
Contudo, acreditar na verdade é diferente de crer que eu
seja a autoridade absoluta acerca do que é verdadeiro ou falso. E é nesse
sentido que essa posição não me compromete com o dogmatismo e a intolerância. Pelo
contrário, é por existir um modo como as coisas são, à revelia de minhas
convicções, que posso estar errado. Se assim não fosse, se só houvesse no mundo
as minhas crenças e nada pudesse ser contrastado com elas, não haveria como eu
atentar para meu erro e procurar me corrigir. Nem eu nem quem crê em teorias da
conspiração bizarras, calúnias difundidas por má fé e mentiras alastradas em
época de campanha eleitoral. Portanto, afirmar que nossas crenças são ou
verdadeiras ou falsas não é insinuar que tenho posse infalível dessa verdade ou
que estou em posição de dizer o que é o caso acerca de um assunto qualquer.
Conceber que a verdade e a falsidade existem é tão somente admitir a ocorrência
de um mundo fora de minha mente, que faz com que minhas asserções possam ser
verdadeiras ou não.
Por outro lado, se a verdade não existir, não haverá como eu
asseverar que é falso e que está errado quem afirma, por exemplo, que não
ocorre ato violento contra a mulher e por isso não há necessidade de lei
específica que a proteja contra essa catástrofe. Também será apenas um modo
alternativo de ver as coisas, uma perspectiva entre tantas – nem verdadeira nem
falsa – a posição de quem diz que vivemos num país justo, em que criminosos
poderosos têm tratamento idêntico ao do cidadão comum. Desigualdade, racismo,
poderiam alegar, só existe na opinião de alguns, e não há o que possa refutar quem
os negue. É por isso que alguém que não acredita na verdade pode muito bem defender
ideologias autoritárias e se manter intolerante com a opinião alheia, não querendo
ver coisa alguma que refute seu pensamento, nem apreciar boas razoes que os
desminta.
Meu amigo Joedson! Leio Danto em você. "Uma falsa proposição será sempre uma proposição". E se fosse possível fazer leituras unicamente silogísticas do mundo... Escreva mais!
ResponderExcluirValeu, meu caro! Tentei deixar meu ponto de vista mais claro em um novo texto aqui no blog de Ed. Abs!
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