sábado, 27 de junho de 2009

SENADO EM XEQUE

Bira do Pindaré*

A maior parte dos países do mundo contemporâneo segue o modelo legislativo bicameral, ou seja, o poder de criar leis é repartido entre duas casas. Assim também é no Brasil. Temos a Câmara dos Deputados e o Senado da República. São 513 deputados e 81 senadores, sendo três por Estado.

Proporcionalmente, são mais de seis parlamentares federais para cada senador. Mas é no Senado que se revela uma das maiores crises já vivida pelo parlamento nacional.

O que acontece ali na câmara alta tem a ver com a moralidade pública, um dos princípios basilares da Constituição brasileira. Logo estamos diante de uma questão nacional de extrema relevância e que as tentativas de minimização são e serão inócuas.

São muitas as acusações. Já se falou em nepotismo, peculato, tráfico de influência e outras improbidades como atos secretos e até contas secretas. De todas as denúncias a que parece mais grave e irrefutável, que deveria, portanto, ter mais destaque, é a do auxílio moradia.

Dinheiro público em conta particular, sem respaldo legal, seria motivo mais do que suficiente para punir com demissão a bem do serviço público qualquer barnabé que incorresse na mesma conduta, sobretudo quando se trata do gestor do órgão.

Nem mesmo a confissão ou mesmo a devolução voluntária pode ensejar a exclusão da punibilidade. São coisas elementares do direito vigente.

No olho do furacão, o presidente José Sarney, pessoa no mínimo “incomum”, se esforça, faz pronunciamentos, exonera servidores que chefiavam o órgão, extingue diretorias, cria portal da transparência, se mexe para todo lado, mas não consegue convencer a sociedade brasileira.

A cada dia surgem novas denúncias e sua situação é cada vez mais insustentável. Por muito menos, Antônio Carlos Magalhães, Jader Barbalho e Renan Calheiros perderam a presidência do Senado. Talvez seja a maldição ou bendição da cadeira.

O senador Cristovam Buarque chegou a dizer que o conceito de “fundo do poço” está sendo desmoralizado, pois sempre se encontra um fundo mais abaixo. Na Roma antiga, foi preciso o imperador Calígula nomear um cavalo como senador para que se desmoralizasse a instituição.

Crer-se que não iremos tão longe assim. Contudo, o que ocorre no Senado não é de se estranhar, pois o mesmo já nasceu deformado e mantém este perfil até hoje, insistindo em fazer valer a máxima popular do “pau que nasce torto”.

Inspirado no modelo britânico, foi criado ainda no período do Império, para ser a nossa “câmara dos lordes”. Uma espécie de representação tupiniquim da “nobreza” brasileira. Por essa razão, somente poderiam se candidatar a senador os homens ricos, com renda anual mínima de 800 mil réis.

A escolha cabia ao imperador e os mandatos eram vitalícios. Negros, pobres e mulheres não tinham vez. Na república velha, no embalo das ideias de Rui Barbosa, tentou-se uma aproximação com o modelo americano, no qual os senadores representam, de fato e de direito, as unidades da federação.

Mas, diferentemente dos Estados Unidos, o Brasil nunca fez sua revolução e os Estados não se firmaram com independência, como poderia ser. Resultado, o Senado se tornou o lugar das elites regionais, de coronéis e de oligarcas.

Daí a razão do seu distanciamento dos anseios populares. A maioria dos senadores ainda representa as antigas práticas cultivadas pela elite atrasada e conservadora que sempre dominaram a política brasileira.

O Senado está em xeque. Há quem defenda sua extinção alegando absoluta inutilidade. Não chegaremos a tanto. Mas é cada vez mais intensa a necessidade de uma profunda reforma política e de renovação naquela Casa.

Essa tarefa de grande envergadura está incumbida ao povo brasileiro, que, certamente, saberá dar sua resposta nas urnas. Essa é nossa esperança. Amém.

*Bira do Pindaré é advogado, bancário, professor e mestre em políticas públicas

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