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sexta-feira, 11 de maio de 2012

ENCONTRO COM CINEMA EXIBE "O BATEDOR DE CARTEIRAS"


Dia 12 de maio, às 19h
Chico Discos 
Rua de São João, esquina 
 com Afogados
ENTRADA FRANCA


por Conde Fouá Anderaos.

Segundo Marcel, o personagem principal do filme, alguns seres teriam o direito de estarem acima das leis. Você já leu ou ouviu isso. Tal pensamento não é ideia de Bresson. 

É a mesma idéia de Rodion Românovitch Raskólnikov, protagonista de “Crime e Castigo, romance de Fiódor Dostoiévski . Não é somente as idéias que assemelham Marcel a Raskólnikov . 

Ambos vivem em um apertado e sujo local em uma metrópole. Se a premissa é a mesma, o resultado difere. Raskólnikov não consegue viver após o delito cometido (que se restringiu a apenas uma vez numa noite). Já Marcel se aprimora no caminho trilhado.

O que seria essa obra de Bresson? O que nos fascina tanto na forma narrativa desse simples (e ao mesmo tempo hermético) filme? O que me surpreende é justamente que para fazer cinema ele trilhe um caminho ousado demais: nada de impurezas, ausência do artificial, inexistências de atores, desejo de apreender o real ao invés da simples e enganosa imitação da existência. 

O que assusta em Bresson (justamente por que funciona maravilhosamente) é a presença de cabides (ou modelos), do não interpretar (atores não profissionais) e obter dessa forma a captação do real, do verdadeiro, do humano e do inusitado (imprevisto).

Marcel denuncia pelo seu olhar o caminho trilhado e a satisfação que isso lhe dá: seus olhos brilham de satisfação a cada furto bem sucedido, bem como vemos o rictus prazeroso que inunda sua face. 

O que seria simples e destituído de sentido, ganha novos ares. Estamos diante de um ser completo, não apenas o traçado de um.

Outro recurso interessante é que a câmera passa a ser a extensão do olhar desse punguista em várias cenas. A alma do personagem é que dita o ritmo e movimento do homem. Os planos são curtos, os diálogos diretos, sem divagações. 

Tudo que nos foi colcoado na tela está carregado de sentido: cada gesto, cada palavra, foi elaboradamente deixada ali por fazer parte de um vitral quase que inteiramente previsto anteriormente (exceto o inusitado, incorporado na edição).

No entanto o filme de Bresson exige um expectador atento. Se desviarmos o olhar por míseros segundos corremos o risco de a obra se empobrecer diante de nossos olhos. A cena da estação de Lion é veloz e ágil; digna de figurar como uma das sequências mais bem compostas de todo o cinema francês.

O que me encanta deveras na obra no entanto é que ao buscar se afastar de uma fácil sentimentalidade e emotividade o filme não nega tais sentimentos. Só que eles surgem na tela de uma forma inesperada, misteriosa e difícil de se definir por palavras. 

A cena que fecha o filme cala-nos fundo na alma. Fomos levada a ela pela magia de sua direção. E se não calasse fundo, ficariamos com aquela sensação de algo inacabado. Uma obra chave da cinematografia mundial.


O Batedor de Carteiras (Pickpocket)
1959
75 minutos
Dirigido por: Robert Bresson
Escrito por: Robert Bresson , baseado no romance de Fyodor Dostoyevsky
Estrelado por: Martin LaSalle (, Marika Green, Jean Pelégrin e Pierre Étaix (Chantrapas)

Sinopse: Marcel é um homem amargurado e depressivo que tenta sua sorte nas ruas de Paris, roubando bolsas e carteiras. Filmada de uma forma inteiramente impessoal e controlada, como um teatro de marionetes, toda a tensão do filme não está no que ocorre durante as cenas, mas no que não ocorre.

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Um comentário:

Anônimo disse...

Texto lindo. Belo comentário, dá vontade de conhecer o filme sim. Pena que já perdi a oportunidade