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domingo, 21 de julho de 2013

O ESTADO A SERVIÇO DO CAPITAL MONOPOLISTA E CONTRA OS TRABALHADORES

José Menezes Gomes
Professor da UFMA, Doutor pela USP e pós Doutor pela UFPE
O prefeito Fernando Haddad e o governador Geraldo Alckmin subiram as tarifas e foram para Paris. Este fato foi acompanhado por protestos duramente reprimidos pela policia impulsionando o movimento muito além dos 20 centavos. Os dois governantes afirmaram que não tinham como garantir o financiamento do passe livre nos ônibus e metro. Em primeiro lugar, esta prefeitura paga por ano R$ 1,25 bilhões de subsídio às empresas de ônibus. Em segundo lugar, o município de São Paulo paga por ano R$ 3 bilhões pelo serviço da dívida pública municipal, que tem por finalidade assegurar o lucro dos bancos e o rendimento dos fundos de pensão. O Estado de São Paulo paga por ano R$ 10 bilhões para esta mesma finalidade. Vale lembrar que “em 1997, o estado de São Paulo renegociou suas dívidas que estavam em R$ 41 bilhões. Já pagou R$ 68 bilhões e ainda deve R$ 177 bilhões a União”. No caso da Prefeitura de São Paulo, a dívida refinanciada pela União em 2000 era de R$ 11 bilhões, e mesmo tendo sido pagos à União R$ 19,5 bilhões, essa dívida atingiu absurdos R$ 53 bilhões em 20121.

Segundo o jornal O Estado de São Paulo de 16 de junho de 2013 nos últimos 8 anos, o número de passageiros transportados nos ônibus em São Paulo explodiu, enquanto a frota total diminuiu no mesmo período. Com isso, mesmo com um aumento real de 30% no valor arrecadado nas catracas desde 2004, cada ônibus passou a transportar cerca de 80% a mais passageiros em 2012. Em outras palavras, “é mais gente transportada pagando um valor mais caro, mas em menos ônibus e em menos viagens”
. Além disso estas empresas possuem grandes passivos trabalhistas. Segundo dados de uma lista oficial divulgada pelo TST – Tribunal Superior do Trabalho, as empresas e donos das empresas de transportes figuram entre os principais devedores trabalhistas de todo o País. Os dados se referem a processos ganhos, ou seja, dívidas que não foram quitadas de processos que não cabem mais recursos. Esta lista exclui as que ainda estão sendo analisadas.

Se as receitas estão crescendo e o reinvestimento da mais-valia diminui, já que foi reduzido o número de ônibus, para onde estaria indo estes recursos? Se aumentou a receita com a redução do número de ônibus significa que ocorreu redução de capital constante. Tal fato resultar na superlotação e precarização das condições de trabalhos de motoristas e cobradores. Em se tratando dos custos desta atividade é bom lembrar que os ônibus são comprados com empréstimos subsidiado do BNDES a 5% ao ano. Além disso, o combustível em São Paulo é mais barato que nos demais estados devido a proximidade com as refinarias. O custo dos salários dos trabalhadores no máximo é reajustado pelas perdas provocadas pela inflação.


Apesar da existência de várias empresas o que temos é um processo de fusão que abre caminho para a pratica de preço de monopólio ou preço político. Portanto, se trata de um setor marcado por uma grande concentração de capital, onde o empresário mineiro Joaquim Constantino é o maior do setor de transportes do mundo, com 6.000 ônibus e 24 empresas em cinco cidades, faturando R$ 800 milhões por ano. Este empresário conhecido por ser bastante agressivo no processo de aquisição de empresas concorrentes já domina 13% do mercado em São Paulo. Na região metropolitana de São Paulo, todas as linhas de ônibus são operadas por 16 consórcios privados. 

Se compararmos o valor das passagens com o salário minimo veremos que o preço da passagem em São Paulo é muito alto, pois um trabalhador recebe um salário mínimo de R$ 678 e paga RS 3,0 pela passagem. Em Paris a passagem é de R$ 3,55 e o salario mínimo de R$ 3.942 mensais por 44 horas semanais. Além disso, a tarifa nesta cidade é cobrada do usuário apenas uma vez ao dia. Em Nova Iorque custa R$ 2,25 e o trabalhador recebe, R$ 15,50 por hora, ou R$ 2.730 por mês. Já em Buenos Aires custa R$ 0,50 e o salário mínimo é de R$ 1.325,00 O paulistano tem que trabalhar 14 minutos para pagar uma passagem, bem superior aos quatro minutos dos chineses.

De acordo com levantamento feito pelo jornal Valor, com base em dados da SPTrans, a receita média por passageiro repassada às concessionárias de ônibus e vans da cidade de São Paulo cresceu 15% acima da variação da inflação entre 2006 e abril de 2013. É bom lembrar que o reajuste do transporte público tem uma grande repercussão no índice de inflação. Evidentemente se queremos explicar parte da elevação da inflação devemos remeter também ao processo de privatização dos serviços públicos, já que estes foram indexados pelo IGP – DI. Segundo estudo do Ipea, sobre a evolução dos preços das tarifas de ônibus no período de 2000 a 2012, que faz uma comparação com a inflação no período, concluiu que as tarifas do Transporte Público Urbano subiram acima da inflação. Se o IPCA teve elevação de 125% no período citado, o índice de aumento das tarifas dos ônibus teve alta de 192%, ou 67 pontos porcentuais acima da inflação oficial. De acordo com o IPEA, o Brasil investe 12 vezes mais em transporte privado do que em público. 

Para entendermos as raízes das grandes mobilizações contra o reajuste das passagens de ônibus temos que resgatar o conceito de capital monopolista e dentro dele a crescente interpenetração do interesse privado dentro do Estado para facilitar o atendimento dos interesses monopolistas e no ataque aos trabalhadores. Isto resulta do próprio desenvolvimento capitalista que na sua expansão acaba por liquidar a livre concorrência em pro da concorrência monopolista. Lênin, no livro Imperialismo, fase superior da capitalismo demonstrou como a livre concorrência é substituída pelos monopólios. Este processo já havia sido tratado por Marx quando investigou o processo de centralização e concentração dos capitais, onde os expropriadores agora expropriam os capitais menores. A expansão das Sociedades por Ações S. A e a expansão do crédito funcionam como facilitadores do processo de fusões e aquisições. Com isso, passamos a ter poucas empresas dominando a produção e circulação das mercadorias. Isto significa a liquidação de pequenas e medias empresas e a formação de gigantes que buscam lucros ainda maiores. O que temos no setor de transporte municipal e interestadual é a formação de cartel em que poucas empresas dominam grande parte do mercado no Estado de São Paulo e nos demais estados.

O fato do transporte ser um serviço público e por sua vez exigir autorização da prefeitura para o reajuste de tarifas facilitando a interpenetração entre o público e privado. Tal fato remete a prática do tráfico de influência com bastante desenvoltura em praticamente todos os municípios que possuem transporte coletivo. Este processo de interferência deste setor nas decisões das prefeituras não é algo que ocorre somente próximo das reuniões de definição de tarifas. Ao contrário, trata-se de algo mais duradouro, pois o lobby deste setor atua bem antes na eleição para vereadores, prefeitos e deputados. Além disso, buscam cooptar sindicato e movimentos sociais para legitimar seus interesses. Aqui não existe concorrência entre as empresas, mas acordos que garantem margens de lucros entre si.


O baixo reivestimento deste setor pode ser visto também pela idade dos ônibus que põe em risco também os passageiros, motoristas e cobradores. Agora se as receitas subiram e o número de ônibus diminuiu para onde foi a mais valia extraída no setor? Se estas empresas não são rentáveis como alegam seus proprietários, para justificar o reajuste de tarifas, como explicar tanto capital deste setor na compra de empresas aéreas? Parte pequena desta mais - valia ou trabalho não pago foi destinada para aquisição de bens de luxo destes capitalistas8. Além da aquisição de Ferraris, como divulgado pela Folha de São Paulo o casamento da filha da família barata custou R$ 3 milhões. Todavia, a parte principal que não é reinvestida no próprio setor é investida em outros, especialmente no setor aéreo, como é caso da GOL. Esta empresa resulta do deslocamento de capital da maior empresa de ônibus. Já tivemos em outros momentos, o Wagner Canhedo, dono da maior empresa de transporte coletivo de Brasília, a VIPLAN, que acabou participando da privatização da VASP, que culminou na sua falência. A tentativa mais recente foi das empresas da família Barata através da WEBJET, que acabou sendo comprada pela GOL.

Baixar as tarifas a partir da desoneração da CONFINS e CSLL é encobrir o fundamental: a caixa preta das tarifas que assegura o preço de monopólio ao cartel das empresas de ônibus em todo o território nacional. Esta iniciativa compromete os recursos da Seguridade Social (Saúde, assistência e previdência social) e por sua vez o interesse dos trabalhadores e auxilia a transferência de recursos públicos para o lucro privado. Quanto mais elevada a tarifa, maior é a fatia do seu salário que se converte em lucro deste grupo monopolista, deixando de ser destinado à moradia, alimentação, saúde, lazer, vestuário. O trabalhador que vivencia o terror fabril e a superexploração durante o processo de trabalho ao sair da fábrica tem inicio uma profunda humilhação nos ônibus superlotados e sucateados pelo qual paga caro. Garantir a qualidade sem elevar as tarifas só podem ocorrer com a estatização do sistema de transporte sob o controle dos trabalhadores e a introdução do passe livre. Além de abrir a caixa preta das tarifas de ônibus temos que revelar os gastos com o serviço da dívida com uma auditoria da dívida do Estado e do município de São Paulo, pois parte do que hoje é destinado para o serviço da dívida pública poderia ser dirigida ao transporte público, a saúde educação pública, etc. Pelo fortalecimento da aliança entre os estudantes e os trabalhadores.

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