Os partidos políticos do chamado
campo democrático-popular e os movimentos sociais têm um legado no processo de
redemocratização do Brasil e nas conquistas mais recentes da cidadania.
Não há como impedi-los de
participar das manifestações de rua, se foram justamente os sindicalistas,
militantes e dirigentes de esquerda que sempre levantaram as bandeiras da
liberdade, contra a corrupção, pela igualdade e inclusão social.
Muitos deram até a vida na luta
contra a ditadura militar. É um equívoco, portanto, rasgar as bandeiras dos
partidos radicais, contrariando o princípio constitucional da livre
manifestação do pensamento e da liberdade de expressão.
Ocorre, porém, que os partidos e
os sindicatos “tradicionais”, dissidentes do PT e da CUT, perderam até agora
uma batalha – a comunicação/mobilização.
Está em curso uma nova forma de aglomerar
as pessoas. É a organização “desorganizada”, sem aquele sonhado comando
tripartite (estudantes, operários e camponeses), como se pretendiam as alianças
nos anos 1960 e 1970.
Nesse período havia foco na luta
contra a ditadura militar e o horizonte do socialismo alimentava as mentes e os
corações dos revolucionários. Em 2013 os protestos visam mudanças imediatas.
Não há um objetivo estratégico e radical de transformação do modo de produção
capitalista.
BRASIL PLURAL
Outra questão relevante é a
complexificação da sociedade civil brasileira. Tributários das frentes de luta
contra a ditadura, os movimentos sociais estratificaram-se em várias
organizações específicas: mulheres, negros, índios, quilombolas, juventude, mídias
livres/comunitárias/alternativas, canabianos, ambientalistas, Movimento GLBTTS,
evangélicos etc.
Basta observar, por exemplo, que
as grandes mobilizações sindicais perderam terreno para outras ações políticas, religiosas e culturais como a Parada Gay, a Marcha da Maconha, Marcha para Jesus e a Marcha das Vadias.
De alguma forma, esse processo
de especificação da luta política desmontou o comando unificado das grandes
mobilizações e greves sob a batuta dos partidos e centrais sindicais.
À proporção que a CUT se
transformava em uma correia de transmissão dos governos Lula/Dilma, abriu-se um
vazio na organização da sociedade civil, deixando o barco dos movimentos
sociais à deriva.
Órfãos das plenárias e da
organização de base, parte dos militantes vanguardistas e as novas gerações de
insatisfeitos (esses em ampla maioria), passaram a se organizar nos coletivos e
comunidades da Internet, inicialmente no falido Orkut.
DESCENTRALIZAÇÃO E PRAGMATISMO
Sem o horizonte do socialismo nem o
comando unificado dos partidos ou das centrais sindicais, o povo está nas ruas
reivindicando uma pauta difusa, mas cujos resultados já começam a aparecer.
A paciência histórica do
proletariado que alimentava o sonho revolucionário dos socialistas foi
ultrapassada pela nova organização veloz e pragmática da massa conectada nas
redes sociais.
As gigantescas manifestações de
rua em 2013 prescindem do comando unificado das centrais sindicais, outrora
líderes das greves gerais.
A CUT, atrelada ao governo, há
muito não serve para quase nada relacionado aos direitos dos trabalhadores. Dissidente
do sindicalismo CUTista, a CSP Conlutas, vinculada ao PSOL e ao PSTU, tem o
discurso ideologicamente acertado mas não consegue conectar as pessoas nas ruas.
Tanto o sindicalismo quanto os
partidos da linha radical de esquerda perderam a capacidade de mobilizar e
liderar a massa nesse fenômeno de 2013, mas podem retomar o comando depois.
As manifestações de rua são
conduzidas pela massa impulsiva, refém dos seus próprios instintos, espontânea,
conectada pela Internet, através dos flash
mobs.
Repetindo um bordão já surrado,
o sindicalismo e os partidos de esquerda estão ainda no mundo analógico; a
massa, no digital.
CRISE DE REPRESENTATIVIDADE E
COMUNICAÇÃO
Ainda não há pesquisas de
opinião para mensurar a rejeição dos manifestantes às bandeiras dos partidos de
esquerda, mas uma hipótese pode ser levantada: a decepção gerada por Lula/Dilma
leva as pessoas a enxergarem no PSTU e no PSOL um fantasma: o PT de amanhã.
Do ponto de vista ideológico,
PSTU e PSOL representam as causas erguidas nas ruas (combate à corrupção, mais
verbas para educação e saúde etc), mas o povo não se sente representado por
eles. De nada adianta dominar o discurso supostamente verdadeiro se a esquerda
só fala para si mesma e não interage com a massa.
Um dos problemas está nas formas
de organização e mobilização.
Se as manifestações de 2013
estivessem sob o comando das centrais sindicais e dos partidos progressistas ou
de esquerda, haveria dezenas de plenárias para tomar decisões e outra imensa
quantidade de reuniões para avaliar o texto do panfleto unificado, onde os
sindicalistas, atropelando os jornalistas, escreveriam e desmanchariam
infinitos parágrafos para chegar à versão final.
Sindicalistas de diversas profissões
(bancários, professores, médicos, engenheiros etc) metem-se a escrever
panfletos e jornais com uma linguagem burocrática que só consegue convencer
seus próprios pares, em longas análises de conjuntura, muito fundamentadas e
importantes, mas sem produzir comunicação com a maioria das pessoas.
A esquerda pode até estar com a
razão, mas perdeu o comando das manifestações. Quando fala, não comunica. E
comunicação, na contemporaneidade, é tudo. Vivemos a era da convergência e da
ubiqüidade. Todas as pessoas estão conectadas simultaneamente e não há tempo a
perder.
Na Internet, as pessoas
vivenciam uma cultura participativa independente do comando das lideranças
tradicionais. Cada qual tem sua causa, postada no Facebook, à revelia do
presidente do sindicato ou do dirigente partidário.
Não dá para esperar a reunião do
comando unificado e as longas (importantes, ressalto!) análises de conjuntura.
O povo na rua tem pressa!
Como dizia o poeta Maiakóvski: “o mar da
história é agitado.”
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