Ed Wilson Araújo *
Quando botei os olhos nela, não vacilei: ia ser minha.
Estava de amarelo e branco, encantadora. Fui direto ao assunto e o nosso relacionamento iniciou com um namoro fortuito. Encontros rápidos sem muito compromisso.
Aos poucos fomos fazendo descobertas, andando mais juntos, tecendo laços. Quase sem perceber, estávamos apaixonados, entrelaçados por uma espécie de transcendência.
Ela, literalmente, cruzou o meu caminho. Quando isso acontece é sinal de compromisso forte, coisa de pele e alma. Ficamos amarrados como nó de marinheiro, presos pelas tranças dos cabelos, untados pelo mel dos nossos beijos.
Tínhamos tanta intimidade que, em algumas ocasiões, desprezávamos aquela proteção. Queria sentir-me totalmente à vontade com ela, somente com o vento entre nós dois.
Viajamos juntos. Vimos o mar no Ceará, cachoeiras no interior e o litoral da Bahia, as praças e avenidas verdejantes em Belém e o rio Guamá, os búfalos na Ilha de Marajó, as pedras de cantaria da Praia Grande, as praias de São Luís, as ruas de Imperatriz, as belezas do rio Tocantins e outras tantas plagas.
Adorava flanar com ela, nos dias de céu azul, sol forte e vento na cara. Muitas calçadas, ruas, avenidas e praças conhecemos juntos. Programa bom era percorrer serelepes os paralelepípedos da cidade velha, vendo a água escorrer depois da chuva forte.
Estou falando da minha bermuda amarela. Foi a peça de roupa mais importante da minha vida até aqui. Eu tinha outras bermudas, mas nenhuma delas tão perfeita quanto a amarela com uns vazados em branco, de dois bolsos laterais e um traseiro.
Cabíamo-nos. Simples assim. Eu sentia-me lindo naquela roupa, feliz, contagiante. Mangas-compridas, calças sob medida, ternos de aluguel... nada ficou tão ajustado a mim como aquela bermuda amarela.
Ela representou mais que uma roupa. Foi um sonho de liberdade. Bastava uma sandália e uma camisa de meia e eu estava pronto para os finais de semana e viagens de férias.
Foram sete anos juntos, vividos intensamente. Outro dia ela partiu, durante uma caminhada no Caúra, em São José de Ribamar. Fim de tarde, fui tirá-la para tomar um banho na maré cheia. Durante a manobra, engatei a ponta do dedão na parte de baixo. Forçou um pouco e rompeu no fundo.
Um rasgão horizontal discreto, embaixo do bolso traseiro, quase imperceptível, porque um amor desses não iria deixar-me em maus lençóis naquela tarde tão linda. Pus uma camisa por cima e não perdi a energia do crepúsculo.
Quando cheguei a casa ainda pensei em fazer um remendo para usá-la mais uns tempos. Depois desisti. Mesmo sem vesti-la, está eternizada em meus pensamentos.
Certas roupas e pessoas são tão ajustadas a nós que passam juntos uma temporada; outras, uma vida inteira. Aquela bermuda era uma segunda pele sobre meu quadril e coxas.
Estava impregnada em mim, como diz aquela música de Chico Buarque:
“Quero ficar no teu corpo
feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
pra seguir viagem
quando a noite vem”
* "Companheira" é um dos textos que estou recolhendo para criar coragem de publicar qualquer dia desses.
Quando botei os olhos nela, não vacilei: ia ser minha.
Estava de amarelo e branco, encantadora. Fui direto ao assunto e o nosso relacionamento iniciou com um namoro fortuito. Encontros rápidos sem muito compromisso.
Aos poucos fomos fazendo descobertas, andando mais juntos, tecendo laços. Quase sem perceber, estávamos apaixonados, entrelaçados por uma espécie de transcendência.
Ela, literalmente, cruzou o meu caminho. Quando isso acontece é sinal de compromisso forte, coisa de pele e alma. Ficamos amarrados como nó de marinheiro, presos pelas tranças dos cabelos, untados pelo mel dos nossos beijos.
Tínhamos tanta intimidade que, em algumas ocasiões, desprezávamos aquela proteção. Queria sentir-me totalmente à vontade com ela, somente com o vento entre nós dois.
Viajamos juntos. Vimos o mar no Ceará, cachoeiras no interior e o litoral da Bahia, as praças e avenidas verdejantes em Belém e o rio Guamá, os búfalos na Ilha de Marajó, as pedras de cantaria da Praia Grande, as praias de São Luís, as ruas de Imperatriz, as belezas do rio Tocantins e outras tantas plagas.
Adorava flanar com ela, nos dias de céu azul, sol forte e vento na cara. Muitas calçadas, ruas, avenidas e praças conhecemos juntos. Programa bom era percorrer serelepes os paralelepípedos da cidade velha, vendo a água escorrer depois da chuva forte.
Estou falando da minha bermuda amarela. Foi a peça de roupa mais importante da minha vida até aqui. Eu tinha outras bermudas, mas nenhuma delas tão perfeita quanto a amarela com uns vazados em branco, de dois bolsos laterais e um traseiro.
Cabíamo-nos. Simples assim. Eu sentia-me lindo naquela roupa, feliz, contagiante. Mangas-compridas, calças sob medida, ternos de aluguel... nada ficou tão ajustado a mim como aquela bermuda amarela.
Ela representou mais que uma roupa. Foi um sonho de liberdade. Bastava uma sandália e uma camisa de meia e eu estava pronto para os finais de semana e viagens de férias.
Foram sete anos juntos, vividos intensamente. Outro dia ela partiu, durante uma caminhada no Caúra, em São José de Ribamar. Fim de tarde, fui tirá-la para tomar um banho na maré cheia. Durante a manobra, engatei a ponta do dedão na parte de baixo. Forçou um pouco e rompeu no fundo.
Um rasgão horizontal discreto, embaixo do bolso traseiro, quase imperceptível, porque um amor desses não iria deixar-me em maus lençóis naquela tarde tão linda. Pus uma camisa por cima e não perdi a energia do crepúsculo.
Quando cheguei a casa ainda pensei em fazer um remendo para usá-la mais uns tempos. Depois desisti. Mesmo sem vesti-la, está eternizada em meus pensamentos.
Certas roupas e pessoas são tão ajustadas a nós que passam juntos uma temporada; outras, uma vida inteira. Aquela bermuda era uma segunda pele sobre meu quadril e coxas.
Estava impregnada em mim, como diz aquela música de Chico Buarque:
“Quero ficar no teu corpo
feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
pra seguir viagem
quando a noite vem”
* "Companheira" é um dos textos que estou recolhendo para criar coragem de publicar qualquer dia desses.
17 comentários:
Valeu Ed!
Já estava a imaginar outras coisas com outras pessoas...
Mas a bermuda foi demais !
Avise quando lançares o livro!
Saudações.
belo texto, gostei muito!!que tal uma coletanea de texto chamados a2!!!rsrs abraços axelbritto@hotmail.com
Cristiano,
Um dia crio coragem para lançar o livro. Você será convidado.
Grande abraço,
Ed Wilson
Axel,
Vamos pensar sim. Quem sabe lançamos juntos.
Ed Wilson
Prezado
Ed Wilson
Por trás do jornalista, mais que um datena da raça, um verdadeiro antena da raça...
Grata surpresa
Espero ver mais textos seus por aqui.
E que venha logo o livro
Um grande abço
Samuel
Samuka,
Você é que dá o tom poético no blogue.
Estou só seguindo os seus passos.
Grande abraço,
Ed Wilson
Ed Wilson, acabo de passar lá no blog do Kenard e vi um texto forte e bem escrito a respeito da decisão do PT no dia 27. Acho que valeria a pena reproduzir aqui no seu espaço, abraços, Sérgio.
É interessante como o texto te faz pensar uma coisa e de repente bum! muda tudo...Eu amei o texto.Eu tambem tinha um short azul que era minha paixao.Ele tambem rasgou e agora parece que falta alguma coisa.Mas, a vida continua e outros shorts azuis ou de outras cores mesmo virão rsrrs
abraços!!!
Ah, eu me lembro desta companheira em várias andanças da nossa tropa de elite pela Majestosa Imperatriz. De fato lhe caia muito bem...rs.
Bjs,
Lícia.
E eu de longe achando que era a (sua) companheira Dilma! hahahhahaha.
Mas, a bermuda era amarela!
Sergio,
Vou lá no Kenard.
Grato pela dica,
Ed
Licia,
Você tem uma memória boa.
Valeu,
Ed
Luiz,
Quem sabe faço uma crônica para Dilma...
Ed
O humor pereniza o trabalho do autor. Em qualquer tempo é atual. parabéns.
Já estava imaginando um daqueles amores avassaladores professor entre duas pessoas.
Mas a bermuda, e amarela (que insistem em dizer que não combinam com muitas outras cores de roupa) foi MUITO boa.
Abraços.
Querido Ed. Wilson, sou sua sempre fã e você sabe disso. Adoro seus textos, um mas belo que o outro. Adorei este texto da bermuda, nossa sem comentários. um grande abraço
Jane
Prof° Ed como sempre faz parcerias excelentes com as palavras.Belissímo texto.
Saudades
Abraço Allana Cristina(Ufma Itz)
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