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domingo, 11 de abril de 2010
O CANTO FULÊRO DO MARANHÃO ESBANDALHADO
Samuel Marinho *
Estou com raiva.
De mal com a vida, com o mundo, com este lugar.
Hoje não tenho ironias pra vender.
O clima está pesado demais, dentro e fora da minha cabeça.
Ecoa em mim o estado febril que precede o suicídio dos malditos.
Meus caros amigos, a vida aqui está muito chata e eu quero pegar a estrada de volta para o meu autoexílio.
Momento em que não me sai da mente aquela propaganda nefasta do governo estadual sobre a pavimentação das estradas em todo o Maranhão.
“De Pinheiro a Santa Helena. Tá tudo esbandalhado. Tá tudo acabado.”
É a minha paródia pra essa gente estúpida, hipócrita, enquanto em Imperatriz se conta os mortos por falta de leitos como quem se confere os acessos de um inusitado vídeo no youtube.
Mas ao menos pelo teor deste post escrito aqui na “Ilha do Medo” tenho a convicção de respirar: Vivemos numa democracia de fato e em pleno Maranhão!
Eu realmente não sou obrigado a ouvir o canto fulêro de Alcione gravando seu DVD na Praça Maria Aragão. Dou graças a Deus por ele ter me proporcionado o luxo dessa liberdade mínima.
Ainda assim me atingiu de longe a podridão de todo o aparato montado naquele local projetado pelo mesmo infeliz que desenhou Brasília.
Ao contrário da grande maioria, nunca fui fã da prestigiada cantora maranhense, embora tenha que reconhecer sua trajetória de sucesso pessoal e só.
Minha tumultuada relação com a Marrom vem do fato de eu não saber dissociar a arte da vida e vice-versa.
Um fatalismo que aprendi com a popart de Andy Warhol ou com os discursos delirantes de Pedro Bial em dias de paredão no Big Brother Brasil.
Zeca Baleiro é um gênio não somente pela arte, mas pela metáfora poderosa que sua trajetória subversiva me põe a refletir, a despeito da mediocridade de tudo que até então era produzido por aqui.
Rita Ribeiro não é só uma afinada intérprete a quem a gente recorre quando quer se enxergar claramente no espelho, mas um canto tão digno da pessoa que me faz chorar de emoção todas as vezes que a ouço a tempo e ao vivo.
Ambos, Zeca e Rita, cruzaram o Estreito dos Mosquitos mandando às favas o patrocínio oficial que amarrou e amarra aqui a grande maioria dos artistas-minhoca.
A ambos é creditado o louvável resgate da obra de um sambista fenomenal que quase morreu no ostracismo. Uma “sensibilidade sambística” que contemporâneos da mesma “ala musical” como a própria Alcione não tiveram em relação ao mestre Vieira (o teu samba é eternamente Bom!).
A história de Zeca Baleiro e Rita Ribeiro um dia há se ser contada com ares merecidamente épicos, como a alegoria única e bem acabada de uma liberdade que nunca chegou de fato à eterna capitania hereditária.
Não tenho o mesmo sentimento em relação à Marrom. E não é nem de longe uma questão de cor da pele. Sua aura pra mim é Cinza.
Falo isso com o tom confessional que é devido aos blogues e com o compromisso sincero de reverenciar só aquilo o que realmente me toca, o que não é o caso de Alcione.
Detesto sua postura, detesto esse som maroto que serve de pano de fundo para toda a vanguarda do atraso que nos acompanhou e acompanha até os dias de hoje.
Detesto essas denominações esdrúxulas de bandas, de intenções pejorativas, de gente compromissada só consigo mesmo e que pela luz do inferno tem o dom de iludir, ludibriar.
Bandidas. Esbandalhadas. Fulêras.
São autodenominações que me acalantam e confirmam a beleza de um dos versos mais profundos do cancioneiro popular.
Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.
Não calo na boca notícia ruim.
* Samuel Marinho é colaborador deste blogue, contador e servidor público federal.
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8 comentários:
Ok Sam.. Vamos quebrar o pacto de silencio...Naum teve Lenine tudo bem.. Mas o que eh esse post irado contra a marrom rapazz? Vamos por partes: 1) Talento Alcione tem de sobra devemos reconhecer 2) O que vc quis dizer com essa de "artistas-minhoca", desculpa não entendi 3) Acima de tudo parabens pela coragem, sei que naum eh facil se expor assim 4) Naum me leve a mal mas acho que o post ficou meio provinciano para o estilo que vc estava mantendo... Quero o universalismo de Lenine URGENTE JAH..kkkk mas valeu ficou muito bom... Vc eh um ator..rsrs
Ola aNDREA
o POST EH uma latencia sobre todos os meus sentimentos em relação ao Maranhao num momento de IRA... Lah no Maranhao (lugar onde eu nasci, mas agora naum estou lah...) os artistas que fazem o lugar sao denominados de "artistas da terra", o que me deu uma liberdade poetica para o termo "artistas-minhoca". O post tinha a intenção de captar meu sentimento mais provinciano....Mas prometo escrever algo mais leve daqui pra frente... Obrigado pelo Oscar valeu rrsrsr
Samuel Marinho, faço das suas minhas palavras. É pedi muito um pouco de cultura à massa? infelizmente, acho que sim. esse desabafo raivoso faz bem à alma, a vida não é feita somente de rosas...
Um abraço,
Odair Monteiro
O texto de Samuel criticou justamente a postura provinciana de Alcione. Mas temos que refletir sobre alguns pontos:
Antes de tudo, não conheço a obra da artista (nunca ouvi um disco dela), mas suponho que Alcione no começo de carreira gravava compositores de samba do Rio de Janeiro, onde morava.
No final dos anos 90, com a carreira beirando o ostracismo, Alcione teria sido convidada (é o que dizem por aí) por Roseana para se aproximar do Maranhão, o que coincidiu com um novo período de ascenção da carreira da artista.
Embora não nos agrade, Alcione tem todo direito de ter escolhido este caminho. Ela também não tem o dever, por ser maranhense, de gravar a obra do saudoso mestre Antônio Vieira. E é melhor que não faça isso (rs, rs, rs).
Um grande abraço,
Odair
Grato pelas observações.
Nem tudo são palmeiras e sabiás para se cantar o nosso lugar.
Volte sempre
Abços
Samuel
Prezado Eduardo
O post lança um olhar irado, e um tanto ingênuo, sobre a postura de Alcione.
É algo confessional, muito pessoal. Algo que falo com muita sinceridade, pois as vezes sou ingênuo e outras vezes irado.
As vezes me preservo. Noutras suicido.
Quanto a trajetória de Alcione, usei o viés de Antonio Vieira para demonstrá-la como pano musical de fundo perfeito para "essa gente compromissada só consigo mesmo".
Alcione nunca deu a voz que Caetano e Gil deram a outros tantos artistas bainos. Nunca fez questão de divulgar o que o Maranhão, que tanto ela usou como forma de expressão e tanto se valeu do próprio esquema institucional do Estado, tinha de melhor.
Talvez eu estivesse esperando demais de uma sambista mais afeita ao seu brilho único e pessoal.
Certa vez homenageada pela Escola de Samba Unidos da Ponte em 1994, com patrocínio do então governo de Roseana Sarney, Brilhou Alcione, aplaudida na Avenida. Primeira página da Revista Manchete. "Brilha a Marrom na Sapucaí". Ela só. Roseana Sarney e José Sarney estavam lá. Eu assisti tudo pela TV. A Unidos da Ponte, por coincidência, ficou em último lugar no Carnaval de 1994 e desde essa época nunca mais voltou ao desfile das Escolas de Samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro.
Ainda me lembro bem do samba-enredo da escola rebaixada naquele ano: "E brilha meu São Luís, Bumba-meu-boi vai dançar, No seu balanço minha escola vai passar. Canta Marrommm..."
Nós o Maranhão, temos a Alcione e somos a Unidos da Ponte da Federação Brasileira. Ela, a Marrom, foi feita pra brilhar só.
Tomara que a Unidos da Ponte volte um dia para o Grupo Especial, sempre tive simpatia por aquela escola. Sobre o Maranhão eu não sei mais o que dizer.
Um grande abraço. Volte sempre.
Samuel
Olá Samuel,
Essa história da "tragédia" da Unidos da Ponte é muito interessante. Precisamos divulgar mais este fato.
Concordo com tudo que você afirmou a respeito de Alcione. O seu artigo foi providencial diante da reverência cega, provinciana e desproporcional da mídia e da população de São Luís no período da gravação do tal DVD.
Só acho que ela não merece gravar Antônio Vieira.
Um grande abraço,
Meu caro Eduardo
Foi a "maldição Marrom" que pegou a Unidos da Ponte em 1994.
Muito Grato pela observação
e apareça... E realmente, vendo agora, concordo que Alcione não tem nem sensibilidade para gravar qualquer canção do Mestre Vieira
Eduardo, quando vai sair o seu proximo livro, poeta?
Grande abço
Samuel
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