Paulo
Melo Sousa, mestre em Ciências Sociais, escritor e jornalista.
O
Maranhão se avizinha de um momento histórico diferenciado, diante da disputa
eleitoral para o governo do Estado. Duas candidaturas se encontram, a priori,
polarizadas. Edinho Lobão e Flávio Dino prometem terçar armas com discursos que
são, pelo menos para o eleitor, antagônicos. Seria melhor dizer, diferenciados.
Todo mundo sabe que Edinho Lobão representa o continuísmo de uma política que
dominou os rumos do Maranhão ao longo de muitas décadas e a sua proposta é a do
imobilismo, e que Flávio Dino, ao confrontar Lobão, apresenta um discurso que
pretende ir de encontro a essa prática.
Com
o slogan “Juntos, a Gente faz a Mudança”, Dino conclama o povo maranhense a
mudar o jogo, e sua proposta de campanha mistura desenvolvimento e justiça
social. Os críticos de sua candidatura colocam o dedo na ferida dos acordos já
fechados e nas coligações com partidos ou nomes que já apoiaram alhures o grupo
Sarney. Trata-se de um abacaxi que Dino terá que descascar a partir de janeiro
do próximo ano, caso seja, de fato, eleito. Não é preciso dizer que esse filme
já foi visto há pouco tempo, quando o governador Jackson Lago teve que fatiar o
poder, e todo mundo sabe dos problemas daí advindos. São as regras de um jogo,
o da política, que Flávio Dino parece, apesar da sua juventude, já dominar com
grande habilidade.
Sabendo
que terá que engolir alguns sapos, alguns bem venenosos, Dino se apresenta
muito bem nas pesquisas, possui um apoio já consolidado, uma simpatia popular
inegável e, até o momento, uma conduta correta, firme. A proposta, a princípio,
é chegar ao poder e, chegando lá, fazer o possível diante de problemas
cabeludos apresentados pelo Maranhão, dentre os quais se destacam os cancros da
saúde, da educação e da segurança pública. Sobre esse tripé indigesto está
alicerçado o discurso político do grupo que peita, neste momento, a oligarquia
Sarney. Esperança, fé, mudança, sonhos, justiça social, honestidade são
palavras de ordem na proposta de governo de Flávio Dino, com a benção da
participação popular.
Indo
um pouco além do óbvio, já que todo político deve se preocupar, de forma
obrigatória, com saúde, educação e segurança pública, a proposta promete
“adotar projetos de desenvolvimento com sustentabilidade ambiental”. Proposta
genérica, fragmentada. A questão ambiental passa, necessariamente, pelo
critério da sustentabilidade. No entanto, é preciso inserir essa proposta num
contexto ampliado, sobretudo em políticas de governo. Quais as ações
pragmáticas para resolver essa questão de forma satisfatória? Não se pode tapar
o sol com a peneira.
O
mundo globalizado exige novos olhares. Vivemos num momento de caos. O
historiador norte-americano Immanuel Wallerstein diz que a crise do moderno
sistema mundial deverá prolongar-se até 2050, e sugere que a descentralização
do poder deve se operar sob a forma de uma multiplicidade de movimentos e
grupos sociais de todo tipo, avançando em todas as frentes simultaneamente e
lutando pela democratização radical das relações sociais e pela igualdade de
direitos entre todos os indivíduos e grupos.
Essa
reflexão implica em relações sustentáveis de poder, o que desemboca em um novo
olhar sobre a questão ambiental, não de forma fragmentada, e sim de maneira
integrada. Em suma, uma visão sistêmica. No caso do Maranhão, que inclua as
demandas históricas dos quilombolas rurais, comunidades indígenas, ribeirinhos,
pescadores, lavradores, coletores, marisqueiros, ambientalistas sistêmicos.
Vivemos numa sociedade esquizofrênica, e a violência absurda que se abate sobre
o Maranhão e que deve ser combatida espelha essa realidade. É um desafio
profundo que deve ser enfrentado e que desafia as meras ações paliativas do
Estado, tais como construir mais presídios ou aumentar os efetivos da polícia.
A
questão ambiental envolve o controle do desequilíbrio social que gera a
violência. Dessa forma, tudo se encontra encadeado. Como informa o filósofo
Gilles Lipovetsky, “o drama maior da sociedade é que para muitas pessoas não há
projetos, sobra a pobreza, a miséria, a exclusão; o desafio para o século 21 é
que essas pessoas tenham algum futuro”. No Maranhão, essa reflexão se amolda
com muita facilidade. É preciso enfrentar os problemas sociais, ambientais, de
forma diferenciada. E já que estamos falando de sustentabilidade, a proposição
já se encontra colocada, devidamente aprofundada por pessoas antenadas com a
modernidade, com a visão sistêmica, a compreensão da totalidade por meio de uma
análise global das partes e da intrínseca interação entre elas.
A Rede
Sustentabilidade, liderada por Marina Silva, uma referência global na área
ambiental, é partícipe, por exemplo, de “um diálogo com a cultura brasileira,
entendida como plural e dinâmica, valorizando os patrimônios material,
imaterial e natural locais, seus saberes e fazeres, com respeito aos sujeitos,
às diferentes temporalidades históricas, à diversidade e pluralidade cultural.
Uma sociedade plural como a nossa deve assumir de forma integral o direito à
diversidade”. Essa questão precisa ser ampliada no debate político maranhense,
vivenciada no cerne de uma campanha que promete mudanças.
É
hora de se discutir a questão da sustentabilidade de forma transversal,
ampliada, sistêmica, e não apenas de forma segmentada, como proposta jogada de
forma genérica, sem a reflexão profunda, estrutural, que o tema merece. Tema
esse que vem sendo discutido por alguns políticos, lideranças sociais,
artistas, produtores culturais e ambientalistas maranhenses já há algum tempo.
Flávio Dino, um político que sabe que escutar, às vezes, é mais sábio do que
falar, não se furtará, creio, a esse debate medular.
2 comentários:
É redundante colocar o termo desenvolvimento associado a palavra sustentabilidade, pois um conceito contém o outro. A polissemia da palavra sustentabilidade,muitas vezes inabilita que venha ser usada em um discurso progressista. Essas pequenas confusões impedem uma apropriação da teoria e consequentemente a sua utilização no contexto das políticas públicas, assim, ficando perdida no espaço da retórica.
Po mais que não exista um conceito definitivo para desenvolvimento é claro que os termos justiça social, equidade econômica e acesso aos meios de produção da terra (recursos naturais)devem estar contidos de forma uniforme no mesmo contexto.
Sim... DEpois do pontapé inicial pode ter jogo, ou não... Afinal são muitos jogadores, além do juiz, da torcida, do gandula, do cachorro que pode entrar no campo e etc... Bom ver citações de pensadores da atualidade (como Lipovetsky). Somente uma ressalva (minha): Marina Silva não é "sustentável", ela faz parte de um sistema com um vício incontornável, além de problemas ontológicos no discurso.
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