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quinta-feira, 18 de junho de 2015

MINHA PASSAGEM PELA GUERRA CIVIL ESPANHOLA

Por Eduardo Júlio – poeta e jornalista
 
Na Guerra Civil Espanhola, o palácio Alcázar foi palco do
confronto entre franquistas e a resistência
Em 1980, visitei a Espanha com os meus pais. Eu tinha nove anos. Daquela viagem, lembro-me bem do moderno hotel, em Madri, que tinha uma piscina, onde tomei um banho gelado. De todos os lugares da Europa pelos quais passamos, foi o que me deixou mais feliz, porque sempre nos hospedávamos em hotéis antigos e tradicionais, o que para uma criança era pouco atrativo. 

Também recordo de um passeio em que visitamos o Alcázar da cidade de Toledo. O palácio é famoso pela imponência e por ter sido palco de um dos mais famosos episódios da Guerra Civil Espanhola (1936-1939). No local, uma tropa franquista ficou sitiada por mais de dois meses, abrigada em porões, resistindo a um cerco dos republicanos, as forças democráticas e esquerdistas do conflito. 

O grupo franquista, de direita, era comandado pelo coronel José Moscardó.  Apesar de terem passado fome, entre outras privações, e de terem sofrido com os ataques ao palácio, eles terminaram vencendo a batalha, ajudados por outras tropas nacionalistas, que chegaram a tempo para socorrê-los.

No momento da visita ao palácio, era veiculada a gravação de um telefonema, em que o filho do coronel Moscardó se despedia do pai. O garoto tinha sido sequestrado pelos republicanos, que ofereceram a libertação dele em troca da rendição do grupo franquista. Moscardó não aceitou, e o menino foi executado.    

Na minha memória ainda ecoa a voz do garoto e lembro bem dos porões escuros e sujos, onde eram preservados os colchões imundos que teriam sido usados pelos soldados franquistas. Só não lembrava que o Alcázar de Toledo é tão bonito e suntuoso.
 
Capa do livro de Josep M. Buades, que narra o episódio
ocorrido nos porões do Alcázar de Toledo
Este episódio virou um marco da guerra civil e era explorado pelo turismo. O governo espanhol da época, mesmo estando em processo de redemocratização, ainda tentava colocar os visitantes a favor da ditadura fascista. Como se a Espanha, com a vitória de Franco, tivesse escapado da maldade dos republicanos, mesmo tendo passado 36 anos sob a opressão de uma ditadura implacável, que derrubou um governo popular democraticamente eleito, e que perseguiu grupos étnicos, entre os quais, ciganos, bascos e catalães. 

A visita ao palácio, o episódio militar e o telefonema foram resgatados em minha memória pelo livro "A Guerra Civil Espanhola", do historiador Josep M. Buades, uma narrativa clara, minuciosa e envolvente daquele conflito que serviu de ensaio para a II Guerra Mundial.

Segundo Buades, a gravação telefônica pode ser falsa, pois durante o período em que o menino foi sequestrado não havia mais linhas de comunicação com o palácio, depois dos intensos ataques dos republicanos, que chegaram a dinamitar o prédio.

Após a leitura, também recordei o breve convívio que tive com o seu Antônio, um senhor meigo, baixinho e franzino, nascido na Galícia, que fora casado com a minha tia-avó. Ele veio para o Brasil, ainda jovem, para escapar da guerra civil, radicando-se no Rio de Janeiro, onde conheceu a dona Neide. Para São Luís, o casal veio no começo dos anos 90, logo após o plano Collor.

Depois da fuga para o Brasil, o seu Antônio jamais retornou à Espanha e o único contato que teve com o seu país de origem, durante décadas, foram as correspondências que manteve com um irmão que era padre. 

Um dia perguntei a ele de que lado estava durante a guerra civil espanhola. Seu Antônio prontamente respondeu, voltando-se para o inconsciente coletivo da população civil de seu país naqueles três anos de terror: “Olha, nós não estávamos de lado nenhum. Nós queríamos somente que a guerra acabasse”.

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