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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

VIDA A CRÉDITO E AGIOTAGEM SOBRE O BOLSA FAMÍLIA NO MARANHÃO

O programa Bolsa Família é defensável, em primeiro lugar, por um motivo básico: proporcionou a milhões de brasileiros as condições para comer carne e beber leite.

Em outro texto neste blogue havia analisado o Bolsa Família como um agente indutor do consumo necessário à reprodução capitalista. De maneira simples: a geladeira comprada por uma família paupérrima no interior do Maranhão alimenta a indústria em São Paulo.

Onde antes quase não havia dinheiro circulando, começa a ter, fazendo girar a máquina do consumo necessária ao funcionamento do sistema.

O Bolsa Família provoca tanto impacto na economia que já é apropriado de maneira perversa por aproveitadores e criminosos.

Cartão de garantia

Reportagem publicada no Jornal Pequeno deste domingo (1), de Oswaldo Viviani, revela um esquema de agiotagem sobre os beneficiários do programa.

A matéria remete ao município de Monção, no norte maranhense, onde o agiota “Neco Muniz” é acusado de emprestar dinheiro mediante a garantia e retenção dos cartões com as senhas do Bolsa Família.

Segundo a reportagem, uma investigação da Polícia Federal já aponta indícios da mesma prática em pelo menos cinco municípios da região.

Pela leitura do texto tem-se um recorte de como a injeção de dinheiro nos grotões do país ativou um hábito antes exclusivo das pessoas incluídas formalmente no capitalismo – o consumo.

Milhões de brasileiros foram elevados à condição de pessoas com poder aquisitivo e transformaram-se em unidades consumidoras.

Programa liberal

Nesse sentido, os estudiosos mais argutos do Bolsa Família qualificam os programas de transferência de renda como uma plataforma liberal, preconizada pelo economista norte-americano Milton Friedman.

Os referidos programas seriam, inclusive, recomendações do Banco Mundial para os países pobres e em desenvolvimento.

Mas, o caso de Monção apresenta outra singularidade: o consumo compulsivo está levando parte da população a uma roda viva do endividamento, mediante a ação dos aproveitadores, como o agiota denunciado na reportagem.

A facilidade de contrair crédito induz as pessoas a dever não só os comerciantes e o sistema financeiro oficial, mas também os agiotas, gerando dívidas sobrepostas e, provavelmente, impagáveis.

Bauman e a vida a crédito

Monção é um caso para refletir lendo a obra “Vida a crédito”, do sociólogo Zygmunt Bauman, um dos intelectuais mais respeitados da contemporaneidade.

Bauman vai direto aos pontos essenciais do tempo presente, tais como a compra compulsiva, o endividamento generalizado, a busca do corpo ideal, o culto às celebridades e a obsessão por segurança.

A análise de Bauman não se restringe ao devedor individual. Ele conduz a uma reflexão sobre a crise econômica instalada em 2008 e seus desdobramentos, principalmente na Europa, onde a recapitalização dos bancos e outras instituições financeiras tem sido o remédio para “salvar” as elites do capitalismo internacional.

Sociedade de mercado

Já o filósofo Michael Sendel evidencia a transição de uma economia de mercado para uma sociedade de mercado, na qual tudo pode ser posto à venda e os valores de mercado dominam todos os aspectos da vida: relações pessoais, vida familiar, saúde, educação, política, leis, vida cívica etc.

Pensadores de rumos distintos, Sendel e Bauman não conhecem Monção, mas os escritos deles servem para interpretar o norte do Maranhão, onde o dinheiro do Bolsa Família está produzindo endividados em massa.

O sistema de endividamento pode ser observado, também, na proliferação dos pequenos bancos instalados em quase todos os municípios brasileiros, ofertando crédito fácil aos beneficiários do Bolsa Família, aos aposentados e assalariados em geral.

Esses bancos de esquina, verdadeiras quitandas do sistema financeiro, são agentes terceirizados das grandes corporações creditícias que operam a máquina dos empréstimos.

Depois de produzir a massa de endividados, as quitandas remetem os devedores para os grandes bancos fazerem o refinanciamento das dívidas, operação ainda mais cruel, porque os juros literalmente degolam o devedor.

Assim gira a roda viva das unidades consumidoras – os assalariados com poder aquisitivo.

A longa crise e o refugo humano

Para Bauman, a crise de 2008 está longe de ser debelada. Os bancos, protegidos pelo sistema, são sempre privilegiados com a recapitalização. Mas, nem sempre funciona. A crise na Grécia, que arruinou o sistema financeiro, escapou para outros países e vez por outra explode em algum lugar do planeta.

A crise é longa e veio para ficar. Nesse contexto, o sistema financeiro precisa lá na ponta de um consumidor-devedor com capacidade de endividamento e pagamento das dívidas.

Ao sistema de endividamento generalizado só interessa o cidadão-trabalhador-assalariado-contribuinte.

Se esta unidade consumidora não puder pagar e recontratar os financiamentos, é defeituosa e não serve ao sistema. Trata-se de um “refugo humano”, segundo Bauman.


Muito longe de Wall Street, em Monção, os beneficiários maranhenses do vivem o drama da agiotagem. É o sistema financeiro ilegal e paralelo refugando o mundo.

4 comentários:

Marcia Oliveira disse...

Quase todo MA ocorre esse fato. Na Baixada, os agiotas tomam conta dos cartões e senhas dos beneficiários.

FRANCISCO ARAUJO disse...

Muito boas as referências interpretativas ... Lembrei também do Boaventura..em um texto 2003 intitulado Poderá o direito ser emancipatório? Onde ele faz uma baita contextualização e dissecando cada legado das promessas modernas. Até chegar na constatação na falência do velho pacto social...e no avanço do conservadorismo na forma de um fascismo social. Dentre as caras do fascismo está o fascismo financeiro...
Penso não é só mais o agiota.. isolado. Todo o campo regulado intensificou sua fraude... os contratos formais estão no mesmo patamar do "acerto" com o agiota.. basta ver as operadoras de telefonia móvel, planos de saúde etc... nada vale e tudo não é a quantidade vendida... Vide a internet banda larga... Tudo um esquema criminoso e fraudulento. Não tarda e esses agiotazinhos vão ter mais legitimidade... do que a vergonhosa Caixa Econômica Federal... que banca sem maiores exigências o maior estelionato do nosso país e tudo com X. Adorei a sacada.

MEU PAPO e RETO disse...

essa tal de bolsa familia e uma maquina de fazer filhos. e de deixar o povo. com mais tempo. pra vagabunda e fora os pilantras qjue se aproveitam. MENTE DESOUCUPADA E. ESCOLA DO DIA.BO.

MEU PAPO e RETO disse...

o pior vai ser o dia que essa bolsa de fazer sexo acabar o que vai ter de. criança nos abrigos e de. gente despreparado para o. mercado de trabalho. os