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domingo, 17 de março de 2013

ASSENTADO DO MST E CADEIRANTE, JOSÉ LUIS COSTA VAI COLAR GRAU EM JORNALISMO

José Luís critica o monopólio da mídia e os blogues comprometidos com políticos 

Aprovado no projeto experimental de conclusão de curso, com o livro-reportagem “Terra de bravura e utopia”, José Luis Costa conta na entrevista exclusiva ao bolgue a sua trajetória de ex-seminarista, militante do MST e estudante de Jornalismo na UFMA-Imperatriz.

Morador do Assentamento Califórnia, em Açailândia, José Luís encarou durante cinco anos o trajeto de 50 km até a UFMA, em ônibus sem condições de acolher cadeirantes. A solidariedade dos amigos e de pessoas que não conhecia ajudaram a superar as dificuldades de mobilidade no dia-a-dia.

Dos cursos de formação do MST às salas de aula da UFMA, ele faz um balanço do conhecimento construído no curso de Jornalismo, fala também sobre o cenário midiático no Maranhão e as perspectivas profissionais.

A colação de grau é em abril. José Luís pensa em publicar o livro-reportagem da conclusão do curso de Jornalismo e tem novos planos. Veja:

Blogue – Como você chegou ao MST?

José Luís – Por meio das Comunidades Eclesiais de Bases (CEB’s) e da Pastoral da Juventude. Depois de participar da Igreja Católica muito assiduamente eu fui para o seminário. Nessas alturas eu já conhecia algumas lideranças do MST por meio dos encontros de formação política. E uma das minhas atividades foi, antes de ir para o seminário, convencer meu pai e minha mãe de que era importante eles participarem dessa luta pela terra e por reforma agrária que estava fortalecida no país.

Eles participaram da ocupação da fazenda Califórnia, em 1996, na cidade de Açailândia. Ficaram acampados e eu fui para o seminário estudar, já em 1997. Quando eu saio do seminário, em 2000, o acampamento Califórnia já era assentamento e fiquei morando, participando das reuniões e aos poucos me inserindo, até que a direção do MST me passou a responsabilidade de fazermos as discussões de instalação no assentamento uma rádio livre ou do MST e entrei para o setor de comunicação do MST.
Na conclusão do curso, o livro-reportagem sobre reforma agrária
Blogue – Qual a importância do MST na sua vida?

José Luís – Depois de ter saído ou me afastado da Igreja por não achar espaço dentro dela e concretizar meu sonho, no MST me senti importante. Eu tive minha auto-estima levantada. A direção estadual do MST sempre achou que eu tinha jeito e capacidade para fazer articulações com a base do MST, aqui no assentamento e na regional de Açailândia.

E fui estimulado a voltar a estudar, recebi a oportunidade de fazer um curso chamado “Realidade Brasileira”, voltado para o estudo do Brasil a partir dos grandes pensadores nacionais. Era um convênio da Universidade Federal do Maranhão com o MST e entidades ligadas à Via Campesina, em 2004.

Logo em seguida recebi outro convite para fazer o outro curso, “Produção da Teoria e o Pensamento Político Brasileiro”, este na Escola de Formação Florestan Fernandes, em Guararema, São Paulo. Ambos os cursos eram extensões e serviam de especializações para quem já tinha uma graduação e isso foi me fazendo ver que eu tinha que voltar a estudar, fazer uma graduação e tentei o segundo vestibular que ocorreu na UFMA para Comunicação Social-Jornalismo. Tive sorte e passei, pois eu estava há 11 anos longe dos números, fórmulas e regras de gramáticas. Eu tinha terminado o ensino médio em 1996 e só fiz dois períodos de Filosofia quando estava no seminário.

Blogue – Por quê você escolheu o curso de Comunicação Social / Jornalismo?

José Luís – Por dois fatores. O primeiro a proximidade de casa. Eu morava em Açailândia. Segundo, eu estava no setor de Comunicação do MST e mesmo sem muita informação eu gostava da área.

A formação política no MST construiu uma visão crítica da sociedade para  o  jornalista
Blogue – O que foi mais significativo na sua vivência no curso de Comunicação Social / Jornalismo?

José Luís – A solidariedade da família para eu estudar, dos professores que me compreendiam, a solidariedades de colegas e de pessoas que eu não conhecia, mas passei a conhecer, como um grupo de mototaxistas que tem o ponto no 50º Bis e eles se revezavam para me ajudarem a pegar ônibus naquele ponto.

Blogue – Quais os aspectos negativos na formação profissional em Jornalismo?

José Luís – Apesar de ter uma abrangência grande, o aspecto negativo na cidade de Imperatriz e em outros interiores é o mercado. Os jornais nessas regiões, aí vale também para os grandes centros, são sempre atrelados aos grupos políticos da região e se você tem uma opinião crítica vai ter que deixar ela de lado se quiser trabalhar ou concordar com falcatruas, fazer-se  de cego, surdo e mudo para garantir um emprego que pode com certeza ser passageiro.

Blogue – Na condição de cadeirante, o que você tem a dizer sobre mobilidade e acessibilidade em Imperatriz, no assentamento onde você mora e no campus da UFMA?

José Luís – Aqui no assentamento melhorou, porque o último prefeito da cidade colocou asfalto, de péssima qualidade, mas temos um e com isso por ser um local de pouca movimentação de veículos hoje consigo andar sozinho, quando não estou só, qualquer amigo ou minha esposa me conduzem com facilidade.

Na UFMA hoje está melhor do que antes, mas se eu fosse o reitor eu teria colocado rampas no lugar do elevador. A manutenção de elevadores é muito cara, precisa de energia e uma vez ou outra pode estar quebrado. Com a rampa é diferente, ela só precisaria da sua força ou da solidariedade de alguém.

Na cidade de Imperatriz o caso é sério! Alguém vai pagar esses cinco anos de constrangimento que passei pegando coletivos sem adaptações. Foram cinco anos de muito constrangimento e posso dizer que nesses anos eu fui o cadeirante que mais pegou ônibus na cidade de Imperatriz.

Eram todos os dias, com sol ou chuva e sendo obrigado a andar todo sujo! Os ônibus não têm adaptações e eu tinha que me sentar no chão do carro e quando este estava sujo de lama, já se imagina! Isso foi durante cinco anos! Quero ressaltar esse período pelo fato de que é muito ruim você ter que aceitar esses desrespeitos sabendo que você tem direitos de ir e vir.

Os donos dessas empresas não querem nem saber desses compromissos, querem somente lucrar e só vão passar a olhar essas questões depois que atingirem seus bolsos.
Em Imperatriz são 17 ônibus adaptados, 15 de uma empresa e dois de outra, mas o detalhe é que nenhum funciona. E quando estavam recém-chegados na cidade os motoristas estavam despreparados para manusear o aparelho. É inadmissível esta situação em uma cidade com 250 mil habitantes.
A condição de cadeirante não tirou o sonho de concluir a Universidade
Blogue – Qual o tema da sua monografia?

José Luís – Na verdade foi projeto experimental, um livro-reportagem com o título: “Terra de bravura e utopia: Vila Conceição I e II, o primeiro assentamento da região tocantina”. É um livro que fala da história, do cotidiano e das perspectivas de futuro na visão dos integrantes dessa história.

Blogue – Quais autores fundamentaram seu trabalho?

José Luís – Edvaldo Pereira Lima, Cremilda Medina, Heriberto Catalão, Nilson Lage e outros. Esses foram os principais em se tratando das teorias do Jornalismo e das técnicas de reportagens para o segmento da questão literária dentro Jornalismo.

Sobre os aspectos da luta pela terra e o história da luta camponesa, foram os pensadores que formam o pensamento do MST hoje, como João Pedro Stédile e Bernardo Mançano Fernandes; sobre a questão agrária no Maranhão e região de Imperatriz, eu li obras do Padre Victor Asselin e de Adalberto Franklin.

Blogue – Como você analisa o cenário da comunicação no Maranhão?

José Luís – É motivo de piada. Porque de um lado você tem a própria empresa de comunicação fazendo campanha por “liberdade de expressão”, sendo que os políticos que controlam esses meios de comunicação retiram o direito do povo ter acesso ao uma liberdade de expressão de fato.

E como se pode falar de “liberdade de expressão” se poucas famílias no Brasil controlam todos os canais de rádios, televisão, jornais, revistas que chegam ao povo?
Exemplos disso são as lutas populares e de sem-terra que acontecem no estado e não são noticiados por aqui.

Percebe-se ainda no Maranhão o fortalecimento da onda dos blogues, mas seus donos são sempre despreparados e pendentes a políticos A ou B. Como no caso da cidade de Açailândia, onde esses blogues fazem vergonha. É um grupo político que ataca outro, aí vem o grupo que devolve o ataque e assim por diante...

E neste meio ainda existe a tentativa de controlar o poder da Internet, com as desculpas de protegerem as pessoas contra ataques de hackers. E tem ainda o fato de que a Internet não está disponível para todas as pessoas.

Blogue – Depois de formado, você já tem algum projeto para o futuro? O que vai fazer com o diploma na mão?

José Luís – Sim. O primeiro é publicar o livro-reportagem que fiz para a conclusão do curso: “Terra de bravura e utopia”. E depois pesquisar e escrever duas biografias, uma mais localizada para a cidade de Imperatriz e outra mais em nível de Brasil. Ainda não posso falar sobre estas, pois está muito nas idéias e quero primeiro publicar esta, aí depois vou ver se é viável realizar esses planos.

Fora disso, não me vejo trabalhando em meios de comunicação que são controlados por políticos corruptos e responsáveis pela miséria da população de nosso estado. Quero ficar mais livre para que eu possa dizer ou escrever o que eu penso de acordo com os fatos. É até complicado eu me pronunciar sobre isso publicamente, mas sou convicto de minhas ideias.

Blogue – Tem alguma frase ou citação marcante na sua vida?

José Luís – Sim. A frase marca a luta dos povos no mundo. É uma frase de um pensador brasileiro que trago entre minhas convicções, ela é de Josué de Castro e ele diz assim: “Metade da população do mundo não dorme porque passa fome. A outra metade também não, com medo da que passa fome!”

Contatos: (99) 9136-9348 (Vivo)
Email: zeluisscosta@gmail.com

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