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quinta-feira, 26 de julho de 2012

O VINHAIS VELHO NO MEIO DO CAMINHO DA VIA EXPRESSA

Nos 400 anos de São Luís, governo Roseana Sarney quer
destruir um patrimônio cultural da cidade

O quintal da casa de Olegário Batista Ribeiro é o primeiro passo para entender a importância cultural da Vila do Vinhais Velho na cidade de São Luís. No terreno de 35m x 106m estão fruteiras diversas, juçarais e fontes de água cristalina. 
Olegário e sua riqueza: fruteiras, água e tranquilidade.

Os outros quintais também marcam a paisagem bucólica predominante nas cenas do bairro inteiro.

Aos 78 anos, Olegário nasceu e criou os seis filhos no Vinhais Velho, um aprazível território encravado entre o Sítio Santa Eulália e o Maranhão Novo, onde já moravam outras gerações da família Ribeiro.

Os sete quintais e as respectivas casas de Olegário, dos seus filhos e netos estão no meio do caminho da Via Expressa – a avenida de luxo que pretende interligar os shoppings de São Luís.

Além da família Olegário, a vila inteira unificou-se para reivindicar um desvio no traçado da avenida, com o objetivo de impedir a demolição das casas e da granja Piu Piu.

O desvio no traçado original deslocaria a avenida para a margem do igarapé Vinhais Velho, tributário do rio Anil, com um custo adicional de R$ 7 milhões.

O valor é um trocado perto das montanhas de dinheiro já desviadas no Maranhão.

Após diversas negociações entre os representantes dos moradores e o governo estadual, ainda não houve acordo. Intransigente, o secretário de Infra-Estrutura Max Barros não admite o desvio.

O deputado federal Domingos Dutra (PT) propôs até incluir emenda parlamentar para viabilizar o desvio, mas o governo colocou novos obstáculos.

BARRICADA E POLÍCIA

Os moradores ergueram uma barricada dia 21 de julho para impedir o trânsito das máquinas que trabalham na área. A Polícia Militar foi chamada e a tensão no bairro aumentou.
A barricada foi destruída pela Polícia Militar, em ação violenta, na tarde de ontem


Ontem (25) à tarde, a tropa de choque da Polícia Militar destruiu a barricada e atacou os moradores com spray de pimenta, gás lacrimogêneo e balas de borracha.

Mais uma vez, as forças repressivas do governo Roseana Sarney (PMDB) agem contra pais e mães de família no Maranhão, tratando como caso de polícia uma situação que deveria ser dialogada.

VALOR CULTURAL

O conflito no Vinhais Velho não está reduzido a sete casas, 45 pessoas, uma granja e ao valor das indenizações propostas pela Caixa.

No ano em que São Luís completa seu quarto centenário, a Via Expressa ameaça um dos principais marcos de fundação da cidade.

Antigo território dos índios tupinambás, no Vinhais Velho foi edificada, desde 1612, a igreja de São João Batista. Na vila foi instalada a primeira missão jesuítica do Maranhão. O local é também um sítio arqueológico e Patrimônio Cultural Brasileiro.
A igreja de São João Batista, marco dos jesuítas nos 400 anos de São Luís
A ameaça de perder as casas angustia de imediato as pessoas que estão no meio do caminho da obra, mas o valor cultural e arqueológico do Vinhais Velho é de toda a cidade de São Luís, especialmente na véspera dos 400 anos.

POTENCIAL TURÍSTICO

Para o sociólogo Ricarte Almeida Santos, secretário executivo da Caritas Brasileira no Maranhão, o desvio na rota da avenida permite preservar o tradicional e agregar o moderno à paisagem do Vinhais Velho, sem prejudicar os moradores.

No entendimento de Ricarte, a vila tem potencial histórico fantástico, podendo acionar uma cadeia produtiva no turismo, na gastronomia e na museologia.

A Cáritas e diversas entidades dos movimentos sociais apoiam a luta dos moradores do Vinhais Velho desde o início das obras da Via Expressa. 

Café da manhã, manifestações, missas, barricada, atos públicos e uma série de outras atividades mantêm viva a reivindicação pelo desvio no traçado da avenida.

INDENIZAÇÕES

O Iphan foi acionado e constatou o potencial arqueológico da área. Ações na Justiça tentam impedir a demolição das casas ou obter uma indenização justa.
Além das 7 casas da família Ribeiro, a granja Piu Piu também está ameaçada de demolição pela Via Expressa

Os prejudicados com a obra reclamam também dos critérios de avaliação dos imóveis para efeito de indenização, feito pela Caixa, que rebaixam o real valor das casas, dos terrenos e do patrimônio cultural agregado às vidas das pessoas que nasceram, cresceram, constituíram família e pretendem ficar para sempre no bairro.

Segundo Olegário Ribeiro, pela avaliação da Caixa os imóveis variam de R$ 29.600,00 até R$ 60.000,00. Ribeiro conta que a comunidade solicitou outra avaliação, feira pelo CREA, chegado a valores na faixa de R$ 275.000,00 a R$ 284.000,00.

AS PRIORIDADES DE ROSEANA SARNEY
A Via Expressa avança sobre os manguezais
Se quisesse fazer obras estruturantes para atenuar o problemático trânsito de São Luís, a governadora Roseana Sarney (PMDB) deveria priorizar os locais de fluxo intenso, como os retornos do aeroporto, São Cristóvão e Forquilha, onde é urgente a construção dos elevados.

Mas, em vez disso, o governo toca uma obra de luxo – a Via Expressa – cujo principal objetivo é interligar os shoppings da cidade e estimular a especulação imobiliária no entorno da avenida.

O(a) leitor(a) sabe quem serão os principais beneficiários desses empreendimentos.

As elites retrógradas que dominam o Maranhão anularam os espaços públicos de convivência para obrigar a população a freqüentar os shoppings e enriquecer ainda mais seus donos – sócios dos grandes negócios políticos no estado.

Destruíram as praças e seus sentidos como centros informais de convenções, lugares de encontro das pessoas, das trocas simbólicas, do trânsito humano, da vivência comunitária; enfim, da política.

Os territórios da urbanidade, as áreas verdes, os ambientes da humanização, dos encontros interpessoais e das formas de vida que produzem a política cotidiana foram dizimados em São Luís.

E uma etapa mais agressiva está em curso – a inviabilidade das praias da ilha toda – por uma ação agressiva da Caema, na gestão de Ricardo Murad, cunhado de Roseana Sarney.

Sem áreas de convivência nos bairros e no centro, com as praças destruídas, os terrenos baldios transformados em lixões e as praias poluídas, o morador de São Luís é coagido a freqüentar os shoppings e deglutir fast food nas praças de alimentação.

E qual a principal utilidade da Via Expressa? Ligar os shoppings Tropical, Jaracaty e da Ilha.

É por isso que o governo Roseana Sarney mandou a tropa de choque da Polícia Militar destruir a barricada dos moradores do Vinhais Velho.

No velho Maranhão, o poder público garante os interesses privados da oligarquia.
Fotos: Joedson Marcos Silva, exceto a imagem da tropa de choque da PM, que foi capturada no facebook

5 comentários:

FRANCISCO ARAUJO disse...

Caro Ed,
parabéns... belíssimo texto..mas também destaco a qualidade do seu jornalismo, coisa que não muito frequente entre os jornalistas que passaram a ser blogueiros. Parabéns!!!

Guto disse...

Ed,

Estivemos juntos na visita à vila. Tenho certeza que outro jornalista não faria texto melhor. Parabéns!

Lena Machado disse...

Ed Wilson, um texto e uma reflexão excelentes! Mas, queria destacar sobretudo o que você disse ao final sobre a inviabilidade de espaços de convivência em São Luis. Sempre me perguntava porque um lugar com tanta vocação prá espaços públicos de convivência não evoluía nessa direção. Neste sentido, tua reflexão foi certeira. Com praças, parques e praias inviabilizadas, só resta mesmo o fastfood.
abs
Lena Machado

Poeta Revolucionário disse...

Caro amigo Ed
Como pode um espaço de tanto valor histórico,- justamente, no momento de especulção pela importância da fundação da cidade de São Luis - vir a ser, em vez de presenteado, ser desprestigiado pelo governo de memória oca. SAIRIA MAIS BARATO E SAUDÁVEL, SE EM VEZ DE DESTRUIR O VINHAIS VELHO, O GOVERNO PRESERVAÇE-O HOMENAGEANDO-O PELA PASSAGEM DOS SEUS 400 ANOS.

Anônimo disse...

Oi Ed, achei teu texto muito bom. Mais que uma denúncia ele me reportou aos tempos em que meu pai me levava junto com meus irmãos ao Vinhais visitar a família. Já estávamos morando no Apicum, porém era dever sagrado, tal visita aos domingos. Nos acostumamos a ela. Hoje visitamos com menos frequência, mas o local nunca deixou de ter sua importância afetiva para nós. Ainda temos parentes e amigos por lá e entendemos a revolta dos seus moradores. Parabéns pela belíssima forma com que abordastes o problema. Margô