Paulo Melo Sousa *
O governador Flávio Dino irá
receber um estado emaranhado num vespeiro. Serão agudos os problemas a
enfrentar, com vários nós górdios à espera de quem os desatem. O mais
importante nó da antiguidade Alexandre Magno desatou com a argumentação do fio
da espada, há mais de dois mil anos. Nos primeiros suspiros do terceiro
milênio, contudo, as soluções para problemas crônicos em lugares como o velho
Maranhão precisam de outras ações, tanto enérgicas quanto criativas. É grave a
situação da educação, saúde pública, segurança. Há desemprego, pobreza,
miséria, ausência de garantia dos direitos humanos, enfim, grassa a falta da
qualidade de vida, dentre outras pragas apocalípticas.
No bojo dessa Caixa de Pandora
repousa o fantasma do desperdício. Um dos focos da questão se relaciona com a
corrupção (mas, não somente ela), que deve ser entendida como doença que atinge
não apenas a classe política ou a administração pública, mas que se instala no
cotidiano da sociedade, em pequenos atos como furar uma fila, lucrar com um
troco errado. Anualmente, nada menos que 1 trilhão de reais escorre pelo ralo
do desperdício, no Brasil. Isso equivale ao PIB anual da Argentina.
A cada mil
reais produzidos no país, 250 reais são jogados fora, por conta de
incompetência do Estado e do setor privado, falhas de logística e de
infraestrutura, burocracia excessiva, descaso, corrupção e falta de
planejamento.
Desse total, dentre outros, 70
bilhões de reais são devorados pela corrupção, 13 bilhões ficam por conta do
desperdício estimado de faturamento anual das distribuidoras de água, e nada
menos que 700 bilhões são deixados de se arrecadar com a presença do comércio
informal. Dados da Transparência Brasil para que se faça uma
competente lição de casa. Então, evitar o desperdício significa melhorar a
qualidade de vida da população, assim como assumir ações afirmativas.
Um dos caminhos que podem ser
trilhados pelo programa de governo do futuro mandatário do Maranhão, visando
tirar o estado da situação de detentor do segundo pior Índice de Desenvolvimento
Humano - IDH do país aponta, por exemplo, para a incorporação dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio – ODM, proposição global surgida num documento
seminal, a Declaração do Milênio, elaborada pela Organização das Nações Unidas
– ONU, e que foi adotada pelos 191 países membros da Organização, no dia 8 de
setembro de 2000. A ideia partiu da necessidade de se sintetizar a essência dos
mais diversos acordos globais firmados entre os países ao longo dos anos
noventa, nos quais foram propostas ações sobre a questão ambiental,
desenvolvimento social sustentável, racismo, direitos das mulheres, educação,
combate a doenças globais, dentre outras.
A partir daí os países se
comprometeram em cumprir, em prazos determinados, uma série de metas que, se
respeitadas, deverão melhorar a qualidade de vida da humanidade ao longo deste
século. A inclusão dessa importante agenda em programas de governo
internacionais, nacionais e locais tem marcado a gestão de governantes sérios,
comprometidos com a criatividade e a inovação. As propostas contidas nos oito
Objetivos do Milênio, com suas 24 metas, no caso do Brasil, se implantadas de
fato, podem ser mensuráveis, cabendo à população não apenas cobrar de seus
governantes a aplicação dos Objetivos, mas também colaborando de forma efetiva,
participativa, no intuito de se atingir os compromissos assumidos.
As ações pragmáticas de todos os
ODM, sem exceção, precisam ser urgentemente implantadas no Maranhão. O primeiro
objetivo (erradicar a pobreza e a fome) se aplica diretamente à realidade
timbira, já que o estado apresenta o segundo pior IDH do país. Nesse contexto,
entra a renda per capita da população, que é dramática. Temos o sério problema
de falta de emprego, o que é responsável por ausência de renda; além disso, ao
home do campo falta terra para plantio (num estado onde impera o latifúndio),
bem como o domínio de técnica para cultivo. Isso impede o consumo e gera a
fome.
O segundo objetivo do milênio (atingir
o ensino básico universal). É preciso matricular as crianças, garantindo
ensino de qualidade para que essas crianças concluam de fato o ciclo básico,
resultando em adultos alfabetizados e capacitados como profissionais, com
direito, assim, à cidadania. Numa projeção desse investimento, é preciso
garantir mais vagas em universidades a esses alunos, futuramente, entrando aí o
planejamento estratégico.
A promoção da igualdade
entre os sexos e a autonomia das mulheres constitui o terceiro ODM,
lembrando que dois terços dos analfabetos do mundo são mulheres, bem como 80%
dos refugiados. É preciso superar desigualdades entre meninos e meninas no
acesso à escola, combater a violência contra a mulher, sensibilizar os homens
com relação a uma paternidade responsável, criar um novo padrão familiar. No
Maranhão, a situação da mulher, apesar dos avanços, ainda é deplorável,
sobretudo no meio quilombola rural, de maioria negra, entre os indígenas e as
lavradoras, marisqueiras, coletoras, como é o caso das quebradeiras de coco
babaçu, apesar de algumas conquistas feitas nos últimos anos.
O quarto objetivo do milênio (reduzir
a mortalidade infantil) é tarefa árdua. No Maranhão, essa meta está
umbilicalmente ligada à saúde. Falta de saneamento básico mata. Há dois anos
uma criança morreu a bordo de uma embarcação, numa travessia de Alcântara para
São Luís, vitimada por infestação por vermes. Um simples comprimido evitaria
essa morte. Faltam postos de saúde, água filtrada, o mínimo de educação, que
forneceria, pelo menos, algumas noções básicas de higiene, evitando esse tipo
de tragédia.Melhorar a saúde materna, o quinto objetivo do milênio, está
relacionado com os dois objetivos anteriores. Em países como o Brasil, a cada
48 partos ocorre óbito da mãe, culpa da falha dos sistemas de saúde pública,
que ainda são sofríveis. A questão da saúde está ligada ao sexto objetivo do
milênio, que é combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças, como é o
caso recente do Ebola e, um pouco antes, a gripe aviária, a febre da vaca
louca, dentre outras.
Na pauta do dia, garantir a
sustentabilidade ambiental é o sexto objetivo do milênio. Um bilhão de
pessoas, em todo o mundo, ainda não possui acesso à água potável, bem como ao
saneamento básico. Basta citar o caso recente da falta de água em São Paulo,
que está afligindo a população da maior cidade do Brasil, que enfrenta
racionamento há meses. Aqui se indica a adoção de políticas e programas
ambientais na esfera pública, com sustentabilidade.
No mundo contemporâneo, a palavra
de ordem é a preservação ambiental, diante dos índices alarmantes que, ao longo
dos últimos anos, vem sendo divulgados sobre a sistemática agressão ao meio
ambiente, fruto de uma ideia equivocada de produção em massa, herança da revolução
industrial, que imaginava infinitos os recursos naturais. A preocupação está no
cardápio da sociedade moderna, e cada país tem assumido compromissos que visam
minorar tais danos. Nesse contexto, surgiu a necessidade de se trabalhar com a
proposição do desenvolvimento sustentável, agregando os componentes de um
crescimento econômico racional, inclusão social justa e conservação ambiental
responsável.
O antigo método científico,
cartesiano, herança do século XVIII, falhou, e atualmente a visão sistêmica é
acionada na análise da física, biologia, medicina e ciências humanas,
constituindo assim um novo paradigma, que inclui a interdisciplinaridade, e que
representa um alicerce sobre o qual cientistas, pesquisadores, filósofos e
intelectuais contemporâneos dos mais diversos segmentos sustentam suas análises
e práticas.
Cabe apenas aplicar o novo
paradigma, buscar ideias criativas (em texto futuro acenaremos com algumas
propostas), pois foi em épocas de crise que surgiram as descobertas mais
importantes para o progresso humano. E uma das maneiras de se trabalhar essa
questão de forma diferenciada é estabelecer uma parceria mundial para o
desenvolvimento, o oitavo objetivo do milênio, o que inclui redução da dívida
externa dos países pobres endividados. No varejo, capacitação de profissionais,
acesso a mercado e tecnologia (lutar pela autonomia tecnológica do Centro de
Lançamento de Alcântara, por exemplo), favorecendo o crescimento dos pequenos e
médios produtores, com concorrência cooperativa entre eles, para promover
mutirões de recursos e para que atinjam economia de escala.
Enfim, agindo de forma integrada,
com a consciência de que é preciso trabalhar de forma emergencial, mas também
com o olhar no futuro, combatendo o desperdício, a corrupção, acionando práticas
eficientes, de mãos dadas com a contemporaneidade e trabalhando de forma
coerente, transparente e sistemática o Maranhão voltará a ocupar lugar de
destaque na estrutura da nação.
* Paulo Melo Sousa é jornalista,
escritor, pesquisador de cultura popular, Mestre em Ciências Sociais.
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