EDUCAÇÃO COM ABSOLUTA PRIORIDADE
PARA AS CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO MARANHÃO
Lícia Cristina Araújo da Hora *, por ocasião dos 19 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
INFÂNCIA
Sou pequeno
e penso em coisas grandes:
pomares e mais pomares,
jardins de flores e flores
e pelas montanhas e vales
grama verdinha e bosques,
com milhões de árvores
e asas de passarinhos.
Rios e mares de peixes
aquários largos e livres
ar dos campos e praias,
a manhã trazendo o dia
com o sol da esperança
e a noite de sonhos lindos,
nuvens calmas, lua e astros,
minhas mãos pegando estrelas
neste céu de doce infância.
Cleonice Rainho
Nossas crianças são pequenas, mas merecem coisas grandes e nós que somos grandes não podemos permitir que seja pequeno o direito desta infância. Quando se trata de criança e adolescente no Maranhão sempre é pouco discutir, sempre é pequena a luta empreendida, o direito garantido, a saúde oferecida, a educação ministrada, a cultura criada.
É pouco porque ainda carregamos percentuais que nos deixam no ranking dos piores em políticas públicas. A questão educacional, por exemplo, apesar de ser um velho emblema nos nossos indicadores, ainda não se tornou prioridade nas políticas destinadas às crianças e adolescentes deste estado. Ainda lutamos pela garantia do acesso à escola para crianças de 0 a 5 anos. O Brasil ainda tem 11,5% das crianças entre oito e nove anos analfabetas. “A situação é mais grave no Nordeste, onde este dado é de 23 % de crianças analfabetas, especialmente no Maranhão com 38%” (Folha de São Paulo, 12 de julho de 2009).
Na faixa etária de 15 a 17 anos o percentual de adolescentes fora da escola corresponde a 18,1% (INEP, 2006). O trabalho infanto-juvenil ainda comprime para fora da escola um contingente significativo de adolescentes na faixa etária de 14 a 17 anos.
A situação crítica na área educacional não se refere apenas ao acesso a escola, que apesar de ter sido universalizado na década de 90 para o ensino fundamental através da política de financiamento do FUNDEF, quase dez anos depois ainda apresenta 3,3% de crianças entre 7 a 14 anos fora da escola (INEP, 2007).
A oferta de ensino e permanência na escola são dois outros fatores que colaboram para efetivação do direito à educação de qualidade. Alguns elementos que sugerem aferir um padrão mínimo de oferta e permanência do aluno na escola são: a existência de salas de aulas compatíveis as atividades dos alunos por faixa etária; ambiente escolar adequado à realização de atividades de ensino, lazer e recreação, práticas desportivas e culturais; reuniões com a comunidade escolar; equipamentos em quantidade, qualidade e condições de uso adequadas às atividades escolares; biblioteca com espaço físico adequado para leitura; consulta a acervo, laboratórios de ensino de informática; brinquedoteca; serviços de apoio e orientação aos estudantes; garantia de condições de acessibilidade e atendimento para portadores de necessidades especiais.
O tempo em que a criança permanece na escola revela também o tempo em que ela deixa de ter acesso aos bens culturais necessários a sua formação integral como ser humano. Considerando alguns destes aspectos intra-escolares para pensar a questão da qualidade e a permanência, podemos destacar que no Maranhão o tempo médio de crianças em creche é de 5.1 horas-aula diária, enquanto a média nacional é de 8.0 horas-aula diária. Os alunos do ensino fundamental com faixa etária entre 7 a 14 anos passam em média 4.1 horas-aula diária (MEC/INEP, 2006).
A ampliação do período de horas de um aluno na escola é importante para o desenvolvimento pleno das atividades da escola e na formação humana. Mas afinal, que tipo de escola está sendo oferecida às nossas crianças? As crianças permanecem nos lugares onde podem ser crianças, onde podem ser humanizadas, onde podem ser elas mesmas, felizes.
A gestão e organização do trabalho escolar também são elementos importantes para se pensar a escola, para pensar a qualidade da educação. Uma gestão democrático-participativa, que inclua: condições administrativas, financeiras e pedagógicas, mecanismos de integração e de participação dos diferentes grupos e pessoas nas atividades e espaços escolares; existência de projeto político pedagógico que contemple os fins sociais e pedagógicos da escola, a atuação e autonomia escolar; disponibilidade de docentes na escola para as atividades curriculares; definição de conteúdos relevantes nos diferentes níveis e etapas do processo de aprendizagem; a implementação de processo avaliativos voltados para identificação, monitoramento e solução de problemas de aprendizagem.
Sobre o perfil docente destaca-se a titulação e qualificação adequada ao exercício profissional; vínculo efetivo de trabalho; dedicação a uma só escola; formas de ingresso e condições de trabalho adequadas; valorização da experiência docente; progressão por meio da qualificação e outros requisitos; políticas de formação e valorização docente: plano de carreira, incentivos, benefícios. (DOURADO, OLIVEIRA, SANTOS, 2005).
A qualificação em nível superior dos professores do estado ainda está muito abaixo da média nacional. No ensino médio o percentual é de 53,6% de docentes com curso superior, a média nacional é de 85,4%. No ensino fundamental, na faixa etária correspondente entre 12 e 14 anos, a qualificação em nível superior é de 13,0%, enquanto a média do Nordeste é de 24,0% e a média nacional é de 46,0% (MEC/INEP, 2006). Estamos muito aquém da qualificação adequada para os nossos professores.
O respeito ao acesso a educação às populações indígenas ainda é um direito violado. O Maranhão apresenta grande variedade de povos indígenas, é necessário que se garanta a educação compatível com as necessidades do povo indígena, respeitando sua cultura, língua e diferenças, com material didático adequado, que os recursos de transporte e merenda escolar sejam aplicados devidamente, e que os professores recebam formação adequada à demanda exigida.
Os dados referentes à matrícula por nível de atendimento a alunos com necessidades especiais de acordo com dados do INEP do ano de 2004, destacam o Maranhão como o terceiro estado do Brasil que menos oferece atendimento em creches/estimulação precoce.
São dezenove anos do ECA, ele já está jovem, mas ainda com necessidades primordiais que foram abolidas de sua infância. Este jovem que timidamente aparece nas multidões continua gritando pelo acesso:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na
idade própria;
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador (ECA, Cap. IV, art. 53).
Este jovem deseja ser respeitado no tratamento pela igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; deseja ser respeitado por seus educadores; deseja ser ouvido. Este jovem de dezenove anos ainda sonha com uma Escola...
* Professora do Instituto Federal do Maranhão e pesquisadora do Observatório Criança