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José Luís critica o monopólio da mídia e os blogues comprometidos com políticos |
Aprovado no projeto experimental de conclusão de curso, com
o livro-reportagem “Terra de bravura e utopia”, José Luis Costa conta na
entrevista exclusiva ao bolgue a sua trajetória de ex-seminarista, militante do
MST e estudante de Jornalismo na UFMA-Imperatriz.
Morador do Assentamento Califórnia, em Açailândia, José Luís
encarou durante cinco anos o trajeto de 50 km até a UFMA, em ônibus sem condições de
acolher cadeirantes. A solidariedade dos amigos e de pessoas que não conhecia
ajudaram a superar as dificuldades de mobilidade no dia-a-dia.
Dos cursos de formação do MST às salas de aula da UFMA, ele
faz um balanço do conhecimento construído no curso de Jornalismo, fala também
sobre o cenário midiático no Maranhão e as perspectivas profissionais.
A colação de grau é em abril. José Luís pensa em publicar o
livro-reportagem da conclusão do curso de Jornalismo e tem novos planos. Veja:
Blogue – Como você chegou ao MST?
José Luís – Por meio das Comunidades Eclesiais de Bases (CEB’s)
e da Pastoral da Juventude. Depois de participar da Igreja Católica muito
assiduamente eu fui para o seminário. Nessas alturas eu já conhecia algumas
lideranças do MST por meio dos encontros de formação política. E uma das minhas
atividades foi, antes de ir para o seminário, convencer meu pai e minha mãe de
que era importante eles participarem dessa luta pela terra e por reforma
agrária que estava fortalecida no país.
Eles participaram da ocupação da fazenda Califórnia, em
1996, na cidade de Açailândia. Ficaram acampados e eu fui para o seminário
estudar, já em 1997. Quando eu saio do seminário, em 2000, o acampamento
Califórnia já era assentamento e fiquei morando, participando das reuniões e
aos poucos me inserindo, até que a direção do MST me passou a responsabilidade
de fazermos as discussões de instalação no assentamento uma rádio livre ou do
MST e entrei para o setor de comunicação do MST.
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Na conclusão do curso, o livro-reportagem sobre reforma agrária |
Blogue – Qual a importância do MST na sua vida?
José Luís – Depois de ter saído ou me afastado da Igreja por
não achar espaço dentro dela e concretizar meu sonho, no MST me senti
importante. Eu tive minha auto-estima levantada. A direção estadual do MST
sempre achou que eu tinha jeito e capacidade para fazer articulações com a base
do MST, aqui no assentamento e na regional de Açailândia.
E fui estimulado a voltar a estudar, recebi a oportunidade
de fazer um curso chamado “Realidade Brasileira”, voltado para o estudo do
Brasil a partir dos grandes pensadores nacionais. Era um convênio da Universidade
Federal do Maranhão com o MST e entidades ligadas à Via Campesina, em 2004.
Logo em seguida recebi outro convite para fazer o outro
curso, “Produção da Teoria e o Pensamento Político Brasileiro”, este na Escola
de Formação Florestan Fernandes, em Guararema, São Paulo. Ambos os cursos eram
extensões e serviam de especializações para quem já tinha uma graduação e isso
foi me fazendo ver que eu tinha que voltar a estudar, fazer uma graduação e
tentei o segundo vestibular que ocorreu na UFMA para Comunicação
Social-Jornalismo. Tive sorte e passei, pois eu estava há 11 anos longe dos
números, fórmulas e regras de gramáticas. Eu tinha terminado o ensino médio em
1996 e só fiz dois períodos de Filosofia quando estava no seminário.
Blogue – Por quê você escolheu o curso de Comunicação Social / Jornalismo?
José Luís – Por dois fatores. O primeiro a proximidade de
casa. Eu morava em Açailândia. Segundo, eu estava no setor de Comunicação do
MST e mesmo sem muita informação eu gostava da área.
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A formação política no MST construiu uma visão crítica da sociedade para o jornalista |
Blogue – O que foi mais significativo na sua vivência
no curso de Comunicação Social / Jornalismo?
José Luís – A solidariedade da família para eu estudar, dos
professores que me compreendiam, a solidariedades de colegas e de pessoas que
eu não conhecia, mas passei a conhecer, como um grupo de mototaxistas que tem o
ponto no 50º Bis e eles se revezavam para me ajudarem a pegar ônibus naquele
ponto.
Blogue – Quais os aspectos negativos na formação
profissional em Jornalismo?
José Luís – Apesar de ter uma abrangência grande, o aspecto
negativo na cidade de Imperatriz e em outros interiores é o mercado. Os jornais
nessas regiões, aí vale também para os grandes centros, são sempre atrelados
aos grupos políticos da região e se você tem uma opinião crítica vai ter que
deixar ela de lado se quiser trabalhar ou concordar com falcatruas,
fazer-se de cego, surdo e mudo para
garantir um emprego que pode com certeza ser passageiro.
Blogue – Na condição de cadeirante, o que você tem a
dizer sobre mobilidade e acessibilidade em Imperatriz, no assentamento onde
você mora e no campus da UFMA?
José Luís – Aqui no assentamento melhorou, porque o último
prefeito da cidade colocou asfalto, de péssima qualidade, mas temos um e com
isso por ser um local de pouca movimentação de veículos hoje consigo andar
sozinho, quando não estou só, qualquer amigo ou minha esposa me conduzem com
facilidade.
Na UFMA hoje está melhor do que antes, mas se eu fosse o
reitor eu teria colocado rampas no lugar do elevador. A manutenção de
elevadores é muito cara, precisa de energia e uma vez ou outra pode estar
quebrado. Com a rampa é diferente, ela só precisaria da sua força ou da
solidariedade de alguém.
Na cidade de Imperatriz o caso é sério! Alguém vai pagar
esses cinco anos de constrangimento que passei pegando coletivos sem
adaptações. Foram cinco anos de muito constrangimento e posso dizer que nesses
anos eu fui o cadeirante que mais pegou ônibus na cidade de Imperatriz.
Eram todos os dias, com sol ou chuva e sendo obrigado a
andar todo sujo! Os ônibus não têm adaptações e eu tinha que me sentar no chão
do carro e quando este estava sujo de lama, já se imagina! Isso foi durante
cinco anos! Quero ressaltar esse período pelo fato de que é muito ruim você ter
que aceitar esses desrespeitos sabendo que você tem direitos de ir e vir.
Os donos dessas empresas não querem nem saber desses
compromissos, querem somente lucrar e só vão passar a olhar essas questões
depois que atingirem seus bolsos.
Em Imperatriz são 17 ônibus adaptados, 15 de uma empresa e
dois de outra, mas o detalhe é que nenhum funciona. E quando estavam
recém-chegados na cidade os motoristas estavam despreparados para manusear o
aparelho. É inadmissível esta situação em uma cidade com 250 mil habitantes.
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A condição de cadeirante não tirou o sonho de concluir a Universidade |
Blogue – Qual o tema da sua monografia?
José Luís – Na verdade foi projeto experimental, um
livro-reportagem com o título: “Terra de bravura e utopia: Vila Conceição I e
II, o primeiro assentamento da região tocantina”. É um livro que fala da
história, do cotidiano e das perspectivas de futuro na visão dos integrantes
dessa história.
Blogue – Quais autores fundamentaram seu trabalho?
José Luís – Edvaldo Pereira Lima, Cremilda Medina, Heriberto
Catalão, Nilson Lage e outros. Esses foram os principais em se tratando das
teorias do Jornalismo e das técnicas de reportagens para o segmento da questão
literária dentro Jornalismo.
Sobre os aspectos da luta pela terra e o história da luta
camponesa, foram os pensadores que formam o pensamento do MST hoje, como João
Pedro Stédile e Bernardo Mançano Fernandes; sobre a questão agrária no Maranhão
e região de Imperatriz, eu li obras do Padre Victor Asselin e de Adalberto
Franklin.
Blogue – Como você analisa o cenário da comunicação no
Maranhão?
José Luís – É motivo de piada. Porque de um lado você tem a
própria empresa de comunicação fazendo campanha por “liberdade de expressão”,
sendo que os políticos que controlam esses meios de comunicação retiram o
direito do povo ter acesso ao uma liberdade de expressão de fato.
E como se pode falar de “liberdade de expressão” se poucas
famílias no Brasil controlam todos os canais de rádios, televisão, jornais,
revistas que chegam ao povo?
Exemplos disso são as lutas populares e de sem-terra que
acontecem no estado e não são noticiados por aqui.
Percebe-se ainda no Maranhão o fortalecimento da onda dos
blogues, mas seus donos são sempre despreparados e pendentes a políticos A ou
B. Como no caso da cidade de Açailândia, onde esses blogues fazem vergonha. É
um grupo político que ataca outro, aí vem o grupo que devolve o ataque e assim
por diante...
E neste meio ainda existe a tentativa de controlar o poder
da Internet, com as desculpas de protegerem as pessoas contra ataques de hackers.
E tem ainda o fato de que a Internet não está disponível para todas as pessoas.
Blogue – Depois de formado, você já tem algum projeto
para o futuro? O que vai fazer com o diploma na mão?
José Luís – Sim. O primeiro é publicar o livro-reportagem
que fiz para a conclusão do curso: “Terra de bravura e utopia”. E depois
pesquisar e escrever duas biografias, uma mais localizada para a cidade de
Imperatriz e outra mais em nível de Brasil. Ainda não posso falar sobre estas,
pois está muito nas idéias e quero primeiro publicar esta, aí depois vou ver se
é viável realizar esses planos.
Fora disso, não me vejo trabalhando em meios de comunicação
que são controlados por políticos corruptos e responsáveis pela miséria da
população de nosso estado. Quero ficar mais livre para que eu possa dizer ou
escrever o que eu penso de acordo com os fatos. É até complicado eu me
pronunciar sobre isso publicamente, mas sou convicto de minhas ideias.
Blogue – Tem alguma frase ou citação marcante na sua vida?
José Luís – Sim. A frase marca a luta dos povos no mundo. É
uma frase de um pensador brasileiro que trago entre minhas convicções, ela é de
Josué de Castro e ele diz assim: “Metade da população do mundo não dorme porque
passa fome. A outra metade também não, com medo da que passa fome!”
Contatos: (99) 9136-9348 (Vivo)
Email: zeluisscosta@gmail.com