Professora Lucelma Braga
Centro de Ciências Agrárias e Ambientais CCAA/UFMA
Tendo lido os textos dos professores Flávio Reis e Maria
Ozanira e participado, nos últimos quatro anos do movimento docente na UFMA,
senti-me estimulada a também manifestar minhas reflexões acerca dos recentes
acontecimentos políticos em nossa universidade.
Sou filiada a APRUMA há pouco tempo, considerando a história
e a relevância da atuação dos professores supracitados e de muitos outros que
têm, bravamente, construído esta entidade ao longo de sua existência que já
remonta 36 anos. Mas tenho acompanhado a atuação da APRUMA, desde a década de
1990, quando eu ainda era estudante de graduação. Por um lado, acompanhei a
construção histórica desta entidade através da atuação de professores
combativos, que foram e são referências ético-políticas para mim e para muitos
outros militantes.
Por outro lado, participei ativamente do movimento
estudantil, empreendendo em conjunto (DCE/APRUMA) importantes lutas em defesa
da educação pública, no contexto de implementação das políticas neoliberais,
que trouxeram graves impactos para a realidade social como um todo.
Lembro-me entre inúmeras batalhas, da participação ativa da APRUMA no Fórum
Estadual em Defesa da Educação Pública, que foi parte do movimento nacional
amplo, democrático e propositivo de elaboração do Plano Nacional de Educação –
PNE, que embora tenha sido rechaçado pelo governo à época, é sem sombra de
dúvidas, até hoje, uma importante referência para a educação
brasileira, construída a partir do esforço coletivo de inúmeros
educadores, estudantes e outros atores sociais, comprometidos com a defesa
intransigente do caráter público da educação.
Desde então, a APRUMA tem sido alvo de inúmeras críticas e
certamente parte delas resultam da clareza e firmeza com que vem defendendo o
seu projeto de universidade e de sociedade. A crítica mais recente foi
encampada pelo grupo de professores que organizam o SIND-UFMA. Tais críticas
precisam ser debatidas. Por um lado, para serem desmistificadas, por outro,
como elementos para nossa autocrítica, processo que deve ser realizado
permanentemente por qualquer militante sério. Uma crítica que considero
bastante relevante é a acusação de que a nossa entidade está descolada dos
reais problemas dos professores de nossa universidade e que a mesma
precisa “de um sindicato de verdade e não uma ‘seção sindical’ atrelada a
outros interesses”. Discordo da suposta veracidade com que é firmada esta
acusação. E vou explicar. Penso que num debate franco somos levados a
reconhecer que não há política, ou disputa política, sem projeto, ou seja, sem
interesses.
O que necessita ser dito com clareza é quais são os reais
interesses em disputa com a criação do SIND-UFMA. Sem dúvida, são interesses
não apenas distintos dos interesses histórica e publicamente defendidos pela
APRUMA, mas são principalmente interesses ANTAGÔNICOS. Em suma, estamos diante
de dois projetos de universidade, de sociedade. Quem participa minimamente da
vida política em nossa universidade e conhece a prática política dos
protagonistas deste que se apresenta “como um novo jeito de fazer
sindicalismo”, sabe do que eu estou falando. Um fato que por si só deixa claro
o lugar de onde fala este “novo sindicato” está registrado na
matéria do Jornal O Imparcial, publicada em 28 de maio de 2014, em que o
Reitor da UFMA, Natalino Salgado, fala do entusiasmo do Ministro da Educação,
Henrique Paim, quando recebeu a notícia de criação do SIND-UFMA. É
curioso que o grupo do SIND-UFMA, tendo desencadeado um processo nesses termos,
conforme fica explícito na matéria do jornal citada acima, reivindique
autonomia e independência da APRUMA!
Talvez fosse interessante que os professores tentados a
organizar um sindicalismo de novo tipo participassem antes das assembleias da
APRUMA, defendendo publicamente seu projeto de universidade (sem escamoteá-los!!),
e expondo suas ideias acerca da sociedade, poder, etc. Assim ficaria transparente,
algo que o SIND-UFMA também reivindica da APRUMA em seu panfleto de criação, a
quais partidos políticos pertencem os protagonistas do “novo sindicalismo”,
pois esse discurso de pretensa pureza política, nos coloca precipício abaixo na
despolitização da nossa categoria.
A participação nas assembleias da APRUMA seria muito
interessante inclusive porque lá disputaríamos ideias, projetos para além do
processo eleitoral (eleição - espaço de disputa privilegiado dos protagonistas
do SIND-UFMA, o que por si só, já é sintomático do projeto que defendem!!!).
Fica aqui o meu convite especialmente direcionado aos professores assediados
pelos protagonistas do SIND-UFMA, a participarem não apenas da
disputa eleitoral da entidade, ou da criação de um outro sindicato,
mas do debate sempre democrático, que define coletiva e legitimamente os rumos
que deve tomar o movimento docente na UFMA e fora dela.
Outro aspecto destacado no panfleto de criação do SIND-UFMA
é o fato de que estamos em um mundo, em um país e numa universidade,
diferentes. Dessa análise, eu concordo. E também vou dizer a razão. Não tenho a
pretensão de fazer análises acerca das transformações mais gerais ocorridas no
país e no mundo, afinal fomos convocados a tratar de questões locais, termo-fetiche
usado pelos protagonistas do SIND-UFMA, mas sabemos que o uso de um
referencial teórico-metodológico consequente nos coloca diante do desafio de
entender o local em articulação com os outros níveis da realidade objetiva, o
que nos revela que entender a nossa universidade é impossível, sem
situá-la no contexto mais geral em que a universidade brasileira
está inserida.
Primeiro, é necessário reconhecer que nós crescemos, embora com
preocupante inovação e relativa (apenas relativa) inclusão social! Vejamos os
dados da expansão da NOSSA universidade. O número de campi da UFMA cresceu 125%
nos últimos anos, pós-REUNI. Analisados os referidos dados, sem a análise do
funcionamento real dos nossos 9 campi, poderíamos dizer que estamos
diante de um incomensurável avanço. Mas vamos com a acuidade necessária, para
que não fique turvo o nosso olhar com a “cortina de fumaça” que produz este
programa de expansão. Crescemos, em termos de matrículas, 145% na
pós-graduação stricto sensu e 63,8% na graduação presencial. Se
considerarmos que são basicamente os mesmos professores que atuam da graduação
e na pós, e que esse segmento experimentou aumento de apenas 43,3%, temos
um problema. Alias, um problema grave!
Não podemos simplesmente nos
entusiasmar com o crescimento quantitativo da UFMA, sem considerar as
contradições acarretadas com esse processo de expansão. Se adicionarmos à
desproporcionalidade com que cresceu o número de matrículas e o número de
professores, o fato de que o aumento de técnico-administrativos foi de
apenas 6,9%, compreenderemos que estamos diante de uma tendência nacional, que
expande as oportunidades de acesso à universidade às custas da intensificação e da
precarização do trabalho docente.
A partir de uma breve análise histórica, temos uma melhor
compreensão do que está acontecendo na universidade. Em 1980, a proporção
professor-aluno era de 7:1, passou a 8:1 no ano de 1998 e chegou a 11:1 em
2004, de acordo com Bosi (2007). Atualmente, na UFMA, alcançamos a
proporção 20:1, superando a própria meta do REUNI, cuja proporção
professor-aluno, é de 18:1. Isto tudo demonstra que, de fato,
estamos em outra universidade. O que importa é compreender o rumo da
mudança a que fomos arrastados, bem como os efeitos sobre o nosso trabalho e a
formação acadêmico-científica das novas gerações.
É notável o compromisso com que a APRUMA e o Sindicato
Nacional-ANDES vêm denunciando os impactos dessas mudanças sobre a perda da
potencialidade do trabalho educativo que realizamos e sobre nossa saúde física
e psíquica, entre outros. Nesse sentido, como acusar a nossa entidade de
estar descolada dos reais problemas que afetam os professores de nossa
universidade? Mais uma vez estamos diante da necessidade que nos desafia a
responder a questão: qual universidade defendemos e que tipo de
atuação sindical consideramos adequada para enfrentar tais políticas...
De fato, temos que encontrar coletivamente medidas cada vez
mais eficazes no enfrentamento dessas políticas e seus implementadores, mas
buscar tais alternativas passa pelo entendimento de que não se trata de
arrefecer nossa capacidade de luta, adotando o apregoado diálogo,
proclamado pelos protagonistas do SIND-UFMA, com quem tem historicamente
contribuído com o enfraquecimento do nosso movimento de resistência,
fragmentando nossa categoria, a partir da criação de uma entidade atrelada à
reitoria.
Com isso quero comentar mais um aspecto do já referido
panfleto. Ele convoca a se filiarem, os professores que desejam ter um
sindicato onde “o professor e sua família possam usufruir de momentos de lazer”
ou que desejam “ter vantagem em vários tipos de serviços por meio de convênios
com empresas”. Será que são esses os problemas que a nossa categoria quer ver
resolvidos, enfrentados? Penso que necessitamos debater de forma mais
consequente o que isto significa para o cotidiano de nossa atuação como
docente.
Por último, penso que todo esse debate, desde os últimos
processos eleitorais, tem sido muito importante para o movimento como um todo,
considerando que a universidade é um espaço de disputa de ideias, e que o
pensamento divergente como tal precisa ser respeitado. Mas, para ser
salutar o debate, necessitamos analisar o que está em disputa e não aderir a
este ou a aquele projeto por constrangimento, pressão ou relações pessoais etc.
Urge superarmos a análise idealizada do movimento docente como um todo e
da nossa entidade em particular, como se a APRUMA não fosse
expressão da atuação de homens e mulheres em luta, enfrentando todas
as contradições que comporta esse processo.
Eu posso afirmar, como alguém que já participou de uma
gestão da APRUMA (2010-2011) que, antes de tudo, a construção cotidiana desta
entidade é realizada por docentes que além de realizarem as atividades de
ensino, pesquisa e extensão na universidade, ainda se dedicam a contribuir com
a luta, num ato que a um só tempo expressa a coragem e o compromisso com a
universidade pública, gratuita e de qualidade social.
A APRUMA, assim como todas as entidades classistas,
entendidas desse modo, necessitam atualizar o debate, revigorar sua atuação,
fazer autocrítica permanente de suas práticas e fortalecer a organização para
os combates necessários, aglutinando cada vez mais forças efetivamente capazes
de expressarem um projeto autônomo de universidade e de sociedade.