CAPOVILLA DESMONTA ROCHA
Cristiano Capovilla*
Quero aqui combater uma prática coronelista e anti-republicana que há muito graça pela política de São Luís: a de fazer afirmações peremptórias sem pensar nas condições que tornam possíveis as sentenças serem verdadeiras.
Sem isso, sem essa capacidade de julgar as condições de possibilidade das afirmações, é impossível expor um pensamento minimamente coerente, que conjugue objetividade e racionalidade.
Na medida em que desprezarmos a lógica dos juízos, qualquer afirmação vale por si mesma e nada mais precisa ser demonstrado. A política, o reino do discurso por excelência, passa a ser o vale tudo das palavras vazias, que ganha força à medida que são massivamente divulgadas.
É o que atualmente já estão chamando de “efeito Duda Mendonça” na política maranhense. É a essa prática política de desprezo ao debate racional que volto a minha atenção.
É o caso do deputado federal Roberto Rocha (PSDB). Empolgado pela vitória do arqui-reacionário João Castelo (PSDB) à prefeitura de São Luís, o tucano anda se queixando em notas e artigos que ‘não é direita’, que é de ‘centro-esquerda’, ‘social-democrata’ etc.
Nas suas exposições, confunde conceitos, falsifica a história e descontextualiza as noções de direita e esquerda, tentando escamotear sua verdadeira posição ideológica.
Tudo isso exposto em um rosário de argumentos falaciosos - sempre concluindo algo que não está contido nas premissas – para reescrever a toponímia das forças políticas que emergiram das últimas eleições.
Uma das premissas falaciosas do deputado é querer criar uma oposição entre ser social-democrata e de direita. A verdade é que a nível internacional a social-democracia, após a queda da URSS, abandonou o keynesianismo e em alguns casos a própria defesa do estado de bem estar social, adotando sem reservas as novas teses, reformas e políticas neoliberais.
Com isso, deslocou-se do centro político (que ocupava durante a guerra fria) para ser a renovação da ortodoxia econômica do capitalismo, efetivando suas políticas nos mercados financeiros liberalizados.
Temos vários casos paradigmáticos desta virada neoliberal da social-democracia, como os casos de Felipe González do Partido Socialista da Espanha; o de Gerhard Schröder do histórico SPD alemão e de Tony Blair do Partido Trabalhista inglês.
Já no Brasil, o PSDB foi quem capitaneou a modernização conservadora da política e da economia. Ao assumir a presidência da república, o PSDB de Fernando Henrique Cardoso em aliança com o PFL (atual DEM) de Antônio Carlos Magalhães, Jorge Bornhausen, Marco Maciel e outros ícones da ditadura militar, conduziu o país pelas diretrizes políticas e econômicas do ‘Consenso de Washington’, tendo como metas fundamentais de seu governo as reformas neoliberais de abertura comercial, privatizações, desregulamentação e liberalização financeira.
Tal receituário iniciou o maior ataque à nação brasileira desde as tentativas das cortes portuguesas de retornar o Brasil à condição de colônia.
O resultado dessa política desastrosa e antinacional nós já conhecemos. O país ancorou seu processo de desenvolvimento no déficit em conta corrente, aumentando o nosso endividamento externo financeiro e patrimonial, provocando um vertiginoso endividamento público, passando de 30% do PIB em 1992 para 56,5% em 2002.
Segundo dados do IPEA, só durante a vigência do câmbio fixo, paridade Real-Dólar, a dívida externa bruta saltou de US$ 148 bilhões em 1994 para US$ 241 bilhões em 1998.
A desnacionalização do parque industrial e de serviços através da transferência de propriedade de empresas nacionais, públicas e privadas, para o capital estrangeiro (leia-se desregulamentação e privatização), provocou a maior onda de desemprego da história recente brasileira.
Segundo o IBGE, em fins de 1994 o desemprego vitimava 4,5 milhões de trabalhadores, ou 6,1% da força de trabalho no país. Ao término do primeiro mandato de FHC em 1998 o desemprego avançara para 7 milhões de brasileiros ou, 9,2% da PEA (População Economicamente Ativa): leia-se, em seu primeiro mandato o PSDB foi responsável por mais 2,5 milhões de desempregados.
Ao final do seu segundo mandato, com o país esfacelado e sofrendo com o apagão de energia, o desemprego emerge para 15% da PEA. Todos nos lembramos da degradação social, do arrocho nos salários e do aumento das desigualdades.
Por isso, Sr. Roberto Rocha, o PSDB e seus líderes são o que há de mais direitista na política nacional e não há nada que você possa fazer a respeito, a não ser mudar de partido!
Outra premissa falaciosa que o deputado tucano utiliza em um de seus textos é o de que existem apenas dois campos políticos no maranhão: o do Sarney e do anti-Sarney.
Com esse maniqueísmo provinciano, Roberto Rocha espera afastar a política nacional do seu terreiro e, de quebra, colocar-se à esquerda de Sarney. Ora, nada mais primário que uma dicotomia entre bem e mal para reduzir a vida política a apenas duas cores. Entretanto, o mundo é mais complexo que supõe os neurônios de um tucano.
Na verdade, desde a redemocratização existem três pólos de poder político em São Luís e no Maranhão. O antigo grupo oligárquico hegemônico, capitaneado por Sarney, forma um desses pólos.
O outro é formado pela oposição intra-oligárquica, de direita, que está tentando ser a oligarquia hegemônica, da qual sempre fez parte o Sr. João Castelo, desde os tempos do PDS, e o próprio Roberto Rocha.
O terceiro pólo é o da esquerda, sempre muito fragmentado entre os dois maiores blocos, mas que tem por centro o PT e o PC do B.
Com o advento das novas forças políticas no comando da nação através da eleição do Lula, o pólo de esquerda fortaleceu-se e, pela primeira vez na história do Maranhão, criou as condições que levaram a disputa de um segundo turno na capital.
Um feito inédito, dada as condições desiguais do embate. Portanto, parece óbvio que o pólo das forças democráticas, progressistas e de esquerda, a partir dessa eleição, entrou definitivamente para a disputa do poder político contra as velhas contendas intra-oligárquicas que tanto alegram o Sr. Roberto Rocha. Aqui, mais uma vez, em nosso estado, o PSDB também encampa as posições de direita.
Não passa despercebido o enorme esforço para ligar a figura de Sarney ao novo pólo de esquerda que se fortalece. Nesse ponto, o deputado tucano recicla os surrados motes mentirosos da campanha eleitoral e os utiliza como mais um argumento falacioso.
Ora, sobre esse assunto será que é preciso trazer a tona à lembrança do papel político de fâmulo que o então governador Luiz Rocha tinha com Sarney? Ou será que devemos lembrar que João Castelo foi outorgado governador pela ditadura militar com o consentimento e apoio do Sarney?
Ou mesmo agora quando Cutrim (DEM ex-PFL), eterno secretário de segurança de Roseana Sarney, oposição a Jackson na assembléia legislativa, votou, pediu votos e liberou lideranças para fazê-lo em prol do candidato do PSDB, não seria suficiente para demonstrar quem é que se beneficia nas relações com o grupo Sarney?
Bastam esses exemplos para provar que quem deve favores e a própria presença na política maranhense ao Sarney são os senhores do PSDB. Essa é a verdade que se tenta esconder com as falácias.
Não podemos deixar que a inverdade e o irracionalismo cubram com o manto da ignorância o desejo de mudança e de transformações sociais que nosso povo tanto precisa.
Temos que desmascarar a miséria política que a nova oligarquia direitista do PSDB quer instalar na nossa cidade e em nosso estado. Isso nós não vamos permitir.
* Cristiano Capovilla é professor de Filosofia COLUN-UFMA