O TEXTO A SEGUIR É DE AUTORIA DO ESCRITOR ALUISIO AZEVEDO, PUBLICADO EM 24 DE FEVEREIRO DE 1883, NO RIO DE JANEIRO, ONDE ELE MORAVA NA ÉPOCA.
TRATA-SE DA APRESENTAÇÃO DO PRIMEIRO LIVRO DE POEMAS DE RAIMUNDO CORRÊA.
PUBLICADO NO SÉCULO FINAL DO SÉCULO XIX, O TEXTO TEM ALGUMA ATUALIDADE NO MARANHÃO DO SÉCULO XXI.
Raimundo Correa é filho do
Maranhão, dessa paupérrima província que, por um abuso de retórica de 1840,
ficou classificada de Atenas Brasileira. Gonçalves Dias, João Francisco Lisboa,
Gomes de Sousa, Odorico Mendes, Sotero, Galvão e outros vultos que pereceram
com a metade do nosso século e que arrolados se acham hoje pelo ilustre Doutor
Antônio Henriques Leal no seu Panteon Maranhense, foram pretextos para tão
pretensiosa classificação; todavia ninguém mereceu menos do Maranhão que esses
homens ilustres. O mesmo acaba de suceder com os modernos maranhenses, que o
folhetinista citou ao lado daqueles, para endeusar a famigerada província.
Todos ou quase todos esses
vultos maranhenses cujos nomes são aqui repetidos com o amor e respeito, e cujo
talento flameja, ora na imprensa, ora na ciência, ora na literatura, nunca
receberam da sua província a menor prova de simpatia. O Maranhão só festeja um
filho, isso mesmo às vezes, depois de que fora o aclamaram. Antes, não se
contenta em desprezá-lo, escarnece-o, precisamos restabelecer a verdade. A
César o que é de César.
Maranhão não é Atenas
Brasileira, Maranhão não é mais que uma triste província de terceira ordem, sem
originalidade, sem caráter nacional, sem literatura, sem ciência de espécie
alguma, sem a menor noção de Belas Artes, e sem comércio ao menos. A opinião
pública é lá formada e dirigida por uma meia dúzia de portugueses ignorantes e
retirados dos negócios; a sociedade diverte-se a falar mal da vida alheia; o
trabalho mais rendoso é o tráfico de escravos, e os tais atenienses de maior
monta na província, os únicos que ela respeita, não passam de alguns tipos
pretensiosos, cheios de regras gramaticais e tolice.
O único grêmio literário que
lá existe é um desconjuntado Ateneu Maranhense, onde há trinta anos vão aos
domingos alguns empregados públicos espectorar as suas asneiras. De todos esses
maranhenses que o generoso folhetinista citou, não há um só que deva à sua
província o menor serviço, a menor prova de gratidão. Ela é principalmente
ingrata com os filhos que mais a tornam conhecida.
O autor destas linhas, a quem
o folhetinista tão injustamente colocou ao lado dos maranhenses de verdadeiro
mérito, se bem que seja menos autorizado a voltar-se contra a sua província,
não hesita a declarar que, por ocasião de publicar aí o romance O Mulato,
enquanto no Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco erguiam-se Joaquim Serra,
Valentim Magalhães, Tobias Barreto, Urbano Duarte, Clovis Bevilacquia, Araripe
Júnior, Sá Viana, Capistrano de Abreu, Alcides Lima, e muitas outras penas de
igual valor, procurando animá-lo a prosseguir, ela, a tal Atenas de
contrabando, só encontrava descomposturas para atirar sobre seu filho
romancista.
(...) Aos maranhenses
distintos, que tiveram a feliz idéia de deixar a província, onde nunca seriam
apreciados, para erguerem fora um nome ilustre, todos os nossos afetos e todas
as nossas ovações. Mas para esse agregado de nulidades pretensiosas, que
constitui a ilha miserável em que nascemos, todo o nosso desprezo e todo o
nosso esquecimento.
3 comentários:
Transposto para os dias de hoje, o texto permanece atual. Incrível, não?
Ed,
Eu sabia das críticas contundentes do Aluísio contra a província, mas esse texto, especificamente, desconhecia. Quanta atualidade! Ele, mais do que ninguém, sentiu na pele e na alma a podridão da província. E cuspiu nela. Grande abraço. Celso Borges
Ed,
Eu sabia das críticas contundentes do Aluísio contra a província, mas esse texto, especificamente, desconhecia. Quanta atualidade! Ele, mais do que ninguém, sentiu na pele e na alma a podridão da província. E cuspiu nela. Grande abraço. Celso Borges
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